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Alckmin na chapa é um símbolo da intenção de acomodação com os retrocessos, por Luis Felipe Miguel

Uma derrota em São Paulo, depois do fiasco na eleição presidencial de 2018, seria a pá de cal na carreira política de Alckmin

Foto: Agência Brasil/reprodução Jornal GGN

por Luis Felipe Miguel/reprodução Jornal GGN

Alckmin, diz a imprensa, estava “preocupado” com os acenos de Lula em favor da revogação das reformas da legislação trabalhista ocorridas a partir do golpe de 2016.

Manifestou sua preocupação em encontro com o Solidariedade, partido do notório Paulinho da Força – representante máximo de um tipo de sindicalismo cuja única pauta é o retorno do imposto sindical.

“Revogar a reforma não nos agrada, achamos que não é necessário”, disse Paulinho, explicando que quer apenas “a regulamentação da possibilidade de fixação, em assembleia, do valor de contribuição sindical por categoria”.

Nenhuma surpresa, uma vez que a figura é bem conhecida.

Mas retornemos a Alckmin. Agora, volta a dizer a imprensa, ele está mais calmo. Teria entendido que, “na verdade, o que Lula propõe é um diálogo entre sindicatos, empresários e governo para discutir a legislação trabalhista e buscar entendimentos, não imposições”.

Curiosamente, quando se tratou de imposições da burguesia, contra os trabalhadores, Alckmin não viu nenhum problema. Pelo contrário, apoiou entusiasticamente.

Até aí, podemos ver apenas o esforço dele para acomodar a situação e não perder a cobiçada vaga de vice-presidente.

Pior é a informação de que “petistas fizeram chegar ao ex-governador explicações para desfazer eventual mal-estar”.

Aloizio Mercadante teria esclarecido que “não se trata de uma contrarreforma, mas de uma pós-reforma fruto de negociação entre trabalhadores e representantes patronais”.

Isto é grave.

Recompor garantias mínimas para a classe trabalhadora, recuperando direitos perdidos e também atualizando-os para as novas condições da exploração do trabalho – isto tem que estar no centro de qualquer programa da esquerda.

E passa, sim, por um enfrentamento com o capital. Até porque a democracia não será retomada se não ficar claro que há limites para o império dele sobre a sociedade.

O debate sobre o assunto é bom para a esquerda. Ocorre num terreno favorável, já que o saldo das reformas é inequivocamente desastroso, e permite pôr em discussão questões centrais sobre o funcionamento do Estado e o sentido das lutas políticas.

É claro que o movimento para acalmar Alckmin não tem o ex-governador como alvo prioritário.

A possível participação na chapa de Lula é muito mais vantajosa para ele do que para o PT. Ele ganha uma inesperada visibilidade nacional e abandona uma eleição complicadíssima em São Paulo.

Sim, os números iniciais das pesquisas lhe favorecem. Mas é a primeira vez em que concorreria contra a máquina do PSDB paulista. E ainda encontraria um Haddad turbinado pelo favoritismo  de Lula.

Uma derrota em São Paulo, depois do fiasco na eleição presidencial de 2018, seria a pá de cal na carreira política de Alckmin.

Alckmin na chapa é simplesmente um símbolo da intenção de acomodação com os retrocessos dos últimos anos, da pusilanimidade no compromisso com a reconstitucionalização do país. O que os setores do PT que correm para Alckmin estão fazendo é reforçando o recado que está sendo dado para o capital.

Para cumprir seu papel como candidatura da centro-esquerda, porém, Lula tem que ser cristalino no compromisso com alguns pontos básicos, como a revogação do teto de gastos, com a consequente recomposição da capacidade de investimento social do Estado; a revisão da política de privatizações e o uso das empresas públicas em favor do interesse nacional; e, claro, a proteção dos direitos da classe trabalhadora.

Alckmin na chapa, por si só, é um obstáculo à afirmação destes compromissos. Pior ainda se o eventual “desconforto” que ele expressa leva parte da direção petista a se apressar em desmentidos.

Luis Felipe Miguel é professor do Instituto de Ciência Política da UnB. Autor, entre outros livros, de O colapso da democracia no Brasil (Expressão Popular).