As políticas públicas assertivas, construídas após a redemocratização do país, e a Constituição de 1988 são sucessivamente destruídas.
Um movimento em defesa da educação e da ciência
por Reinaldo Centoducatte – Do Portal GGN
Está exposto o estado de degeneração e mesmo de falência das políticas públicas no Brasil nesses tempos de bolsonarismo. Não há como deixar de recorrer ao termo terra arrasada. A ação deliberada de grupos ideológicos de direita, que se instalaram no poder nas eleições de 2018, empurrou o país para um atoleiro de dimensões gigantescas.
É possível mencionar, de pronto, o desastre em áreas fundamentais, como a economia, a saúde, o meio ambiente, a cultura, a proteção social, os direitos humanos e por aí vai, com a falência real das estruturas que impulsionam o desenvolvimento do país. A educação, a ciência, a tecnologia e a inovação, notadamente, não escapam à fúria bolsonarista. O desmantelamento e a fragmentação da educação pública, da pré-escola à universidade, é um ataque evidente, grotesco e caótico das concepções ultrapassadas que se expressam no governo.
As políticas públicas assertivas, construídas após a redemocratização do país, e a Constituição de 1988 são sucessivamente destruídas. Esse projeto objetiva fragilizar as instituições democráticas, desarticular as entidades representativas da sociedade e contaminar os processos de aperfeiçoamento da democracia brasileira.
Está evidenciada a necessidade imediata de reação da sociedade em contraposição ao cenário caótico desencadeado pelo bolsonarismo e ao retrocesso explícito imposto nas mais diferentes áreas da vida brasileira. É inadiável a retomada da capacidade de organização social e de enfrentamento ao modelo retrógrado ensejado pelo bolsonarismo, em aliança com os ultraliberais e “liberais” adeptos do darwinismo social.
No campo da educação, particularmente, essa reação se materializa num movimento que agrega ex-dirigentes de universidades e institutos federais, ex-ministros da educação e de ciência e tecnologia, representantes da ciência brasileira, pesquisadores, sindicalistas, estudantes, técnicos em educação e atores de outros segmentos sociais. Um movimento de composição heterogênea, que traz como dinâmica central a defesa da educação, da ciência, da tecnologia e da inovação como atribuição do Estado brasileiro. Os primeiros debates de âmbito nacional estão se desenvolvendo com a utilização de ferramentas digitais, com significativa e qualificada participação de público.
A pauta dos debates traz conteúdos pertinentes ao desenvolvimento da educação e da ciência, com apontamentos sobre as fragilidades que atingem a escola pública, sobre as ações erráticas do governo bolsonarista nesse campo, sobre as perspectivas para o setor em um novo e democrático cenário político e sobre as articulações políticas estratégicas necessárias à consolidação dos objetivos do movimento em defesa da educação. Perpassa o debate lançado pelo movimento a realização das eleições de 2022. Esse pano de fundo é necessário a partir do entendimento de que não é possível vislumbrar, sob o atual governo, qualquer cenário minimamente otimista para a educação e a ciência brasileiras.
Está clara a inviabilidade total de qualquer diálogo que possa prosperar na direção de uma educação inclusiva e qualitativa e de um ambiente científico que não tenha que sobreviver em meio a absurdas adversidades. A compreensão do movimento, a partir de diferentes análises, é a de que a recuperação do desenvolvimento educacional e científico no Brasil passa, necessariamente, pelo êxito do campo progressista, democrático e popular nas eleições brasileiras, em todos os níveis. Assim, trata-se de um movimento que se propõe a estar ativo no decorrer deste ano com vistas ao processo eleitoral, adensando a pauta da educação e da ciência, com o diálogo permanente com a sociedade brasileira.
A participação ativa nesse processo pressupõe a construção de uma agenda política a ser apresentada para a sociedade e executada nas assembleias legislativas, no Congresso Nacional, nos governos estaduais e na Presidência da República. O movimento em defesa da educação propõe a recuperação do quadro de destruição da estrutura educacional brasileira, que resultou no desmonte do sistema nacional de ciência e tecnologia. O entendimento consolidado é o de que a educação e a ciência são instrumentos indispensáveis para que o país rompa a gigantesca bolha da desigualdade social. A educação traz visibilidade, dignidade e cidadania, e constitui-se em vetor imprescindível ao desenvolvimento socioeconômico e à soberania nacional.
O movimento em defesa da educação propõe a retomada dos investimentos públicos no setor e, para tanto, é necessário que os futuros governantes contemplem essa agenda e que os novos legisladores mantenham publicamente esse compromisso. É um grande desafio. A valorização da educação pública e da ciência deve levar em conta a necessidade urgente de recuperação econômica do país e o célere atendimento das demandas sociais de uma nação que está devastada pela fome e pelo desemprego. Para isso, um país democrático e de perfil progressista deve revigorar os projetos de futuro da juventude brasileira, que busca aprender, criar, produzir, empreender e alcançar a cidadania.
O sistemático esvaziamento orçamentário na educação e na ciência compromete, gravemente, o fomento a projetos de pesquisa, a formação de recursos humanos em todas as áreas do conhecimento, a inovação na educação profissional e a modernização das universidades federais, por exemplo. O movimento reafirma que o investimento na educação e na ciência é estratégico para o desenvolvimento nacional, desde que seja concebido no arejado e saudável ambiente de um novo projeto político. Assim, as eleições de 2022 são balizadoras e estratégicas neste momento e para o futuro do Brasil. O movimento em defesa da educação e da ciência propõe uma ampla mobilização em busca do desenvolvimento sustentável, em sintonia com as expectativas e necessidades da sociedade brasileira.
Reinaldo Centoducatte é professor, ex-reitor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e ex-presidente da Andifes