Pesquisadores, defensores de direitos e representantes de organizações da sociedade civil brasileira, que participaram da recente 24º Conferência Internacional de Aids – AIDS2022, em Montreal Canada, publicaram uma carta conjunta direcionada aos futuros governantes do Brasil. No documento solicitam mudanças na atual política de Aids. “O Brasil pode voltar a ter relevância internacional que sempre teve na resposta ao HIV e Aids!”, diz o documento assinado por pesquisadores, defensores de direitos e representantes de organizações da sociedade civil. A carta foi assinada ainda em Montreal.
O coletivo destacou que “os dados indicam uma preocupante deterioração das políticas de prevenção, assistência e tratamento para HIV e aids, em especial pela situação precária dos serviços públicos que estão sobrecarregados em decorrência da pandemia de Covid-19.”
Eles consideram que é urgente recompor “um modelo efetivo na resposta à aids, composto por prevenção combinada baseada em direitos e sem discriminação de nenhum tipo; o acesso universal e gratuito a todos os insumos e medicamentos e a participação efetiva da sociedade civil, especialmente as mais afetadas pela epidemia em instâncias formais de deliberação das políticas públicas sobre HIV e Aids.”
Pedem revisão do orçamento da saúde
O grupo pediu ainda a revisão e redefinição do orçamento em saúde, federal e estaduais, para que esteja adequado, inclusive a responder ao aumento nas demandas por causa das novas infecções pelo HIV e IST, que inclua novos tratamentos e novas tecnologias de prevenção (como a profilaxia pré-exposição- PrEP); Implementação da política de Saúde Integral para população LGBTI+, com foco na população trans e com variabilidade de gênero.”
Para eles, é fundamental a “implementação de educação em saúde sexual e reprodutiva nas escolas, para que crianças e adolescentes tenham seu direito ao conhecimento baseado em evidência científica garantido, aumentando a autonomia sobre seus corpos e suas vidas. Além disso, eles destacam a importância da reparação do Departamento de HIV/Aids no Ministério da Saúde, com autonomia para propor a formulação e a implementação de políticas, diretrizes e projetos estratégicos para uma resposta adequada ao HIV, aids e agravos correlatos.
Os brasileiros finalizaram a carta com um pedido de “incorporação ágil e efetiva de novas tecnologias de tratamento e prevenção, incluindo medicamentos de longa duração, anticorpos monoclonais, anéis vaginais, entre outros, aliado ao compromisso de garantir preços sustentáveis, por meio do uso do licenciamento compulsório e outras medidas de defesa da saúde pública nacional, de forma a assegurar acesso universal. Apoio e financiamento de iniciativas de pesquisa que fortaleçam ações do SUS.”
Leia a íntegra da carta
CARTA DOS (AS) BRASILEIROS E BRASILEIRAS, NA 24ª CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DE AIDS- AIDS2022, MONTREAL, CANADA
Reengajamento: Garantia e fortalecimento de políticas públicas que sigam a ciência e cuidem das pessoas.
Aos/às futuros/as governantes do Brasil, a partir de 2023
Ao/a Presidente e aos/às 27 governadores/as das Unidades Federativas do Brasil
Nós, pesquisadores/as, defensores/as de direitos e representantes de organizações da sociedade civil brasileira, participantes da 24º Conferência Internacional de Aids – AIDS2022, em Montreal Canada, considerando:
– Os dados que indicam uma preocupante deterioração das políticas de prevenção, assistência e tratamento para HIV e AIDS, em especial pela situação precária dos serviços públicos que estão sobrecarregados em decorrência da pandemia de COVID-19;
– O aumento de novas infecções pelo HIV, quando deveriam estar diminuindo, conforme as metas estabelecidas pelo estado brasileiro em cumprimento da Agenda 2030 das Nações Unidas;
– A grave situação de investimentos insuficientes em saúde, e em especial em programas de controle do HIV e outras infecções correlatas, inclusive em decorrência da Emenda Constitucional 95.
– Os atos de negacionismo científico, desconsiderando os anos acumulados de experiências bem sucedidas em pesquisas e programas de saúde pública e ignorando as contribuições das organizações da sociedade civil;
– A urgência para recompor um modelo efetivo na resposta à AIDS, composto por prevenção combinada baseada em direitos e sem discriminação de nenhum tipo; o acesso universal e gratuito a todos os insumos e medicamentos e a participação efetiva da sociedade civil, especialmente as mais afetadas pela epidemia em instâncias formais de deliberação das políticas públicas sobre HIV e AIDS;
– Que o Sistema Único de Saúde, em 2020, distribuiu 15 milhões de preservativos a menos na comparação com 2019 e que em 2021, o governo investiu apenas R$ 100.098,00 (cem mil e noventa e oito reais) em campanhas de prevenção, o equivalente a 0,6% dos R$ 16,5 milhões anualmente usados até 2018;
– O aparecimento de novas epidemias, como a varíola dos macacos, que exigem respostas urgentes e estruturadas;
– A negligência do Estado ao não garantir o direito de crianças e jovens ao conhecimento sobre saúde sexual e reprodutiva baseado em evidência científica nas escolas.
Solicitamos:
– A implementação de políticas públicas efetivas para o enfrentamento a discriminação e ao estigma em relação às pessoas vivendo com HIV e AIDS – PVHA e às pessoas mais vulneráveis a epidemia;
– Ampla divulgação do consenso científico internacional sobre I=I (Indetectável igual a intransmissível), que significa que em pessoas vivendo com HIV com a carga viral indetectável o vírus não é mais transmissível o que permite aumento na qualidade de vida e na diminuição da discriminação em relação às PVHA;
– Revisão e redefinição do orçamento em saúde, federal e estaduais, para que esteja adequado, inclusive a responder ao aumento nas demandas por causa das novas infecções pelo HIV e IST, que inclua novos tratamentos e novas tecnologias de prevenção (como a profilaxia pré-exposição- PrEP);
– Implementação da política de Saúde Integral para população LGBTI+, com foco na população trans e com variabilidade de gênero;
– Recomposição dos espaços de diálogo e participação social institucionalizados, com representação democrática, conforme as diretrizes da Constituição Cidadã de 1988;
– Aumento das estratégias de prevenção combinada do HIV e IST, com ações de comunicação permanentes, incluindo o investimento apropriado em campanhas de prevenção, baseadas em direitos, desprovidas de preconceitos e baseadas em evidências;
– Implementação de educação em saúde sexual e reprodutiva nas escolas, para que crianças e adolescentes tenham seu direito ao conhecimento baseado em evidência científica garantido, aumentando a autonomia sobre seus corpos e suas vidas;
– A reparação do Departamento de HIV/AIDS no Ministério da Saúde, com autonomia para propor a formulação e a implementação de políticas, diretrizes e projetos estratégicos para uma resposta adequada ao HIV, Aids e agravos correlatos e
– Incorporação ágil e efetiva de novas tecnologias de tratamento e prevenção, incluindo medicamentos de longa duração, anticorpos monoclonais, anéis vaginais, entre outros, aliado ao compromisso de garantir preços sustentáveis, por meio do uso do licenciamento compulsório e outras medidas de defesa da saúde pública nacional, de forma a assegurar acesso universal. Apoio e financiamento de iniciativas de pesquisa que fortaleçam ações do SUS.
O Brasil pode voltar a ter relevância internacional que sempre teve na resposta ao HIV e Aids !
Montreal, 03 de agosto de 2022
Quem assina:
Adele Schwartz Benzaken – Diretora médica global da AIDS HEALTHCARE FOUNDATION (AHF)
Adriana Bertini – Instituto Cultural Barong
Arthur Chaves – Ativista
Daniel Canavese de Oliveira – Grupo Temático de Saúde LGBTI+ da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e UFRGS
Felipe Carvalho – Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia)
Fernanda Fernandes Fonseca – Diretora medica global associada da AHF
Gabriel Mota – Casa Miga-Associação Manifesta LGBT / Aliança Nacional LGBTI+ / Fórum OSC/AIDS do Amazonas
Jair Brandão – Gestos Soropositividade, Comunicação e Gênero, RNP+ Brasil – Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV e Aids
Javier Angonoa – Coordenador Geral Associação MOTIRÔ BA
João Geraldo Netto – INSTITUTO MULTIVERSO
Josias Freitas – Ativista
Julia Alencar – Estudante de Medicina UAM-SP / Coordenadora de Cultura e Meio Ambiente da Direcao Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina
Júlio Moreira – Grupo Arco-íris / Aliança Nacional LGBTI+ / Red Gay Latino / INI-Fiocruz
Laylla Monteiro – Ativista
Leonardo Moura da Silva – Rede Nacional de Adolescentes e Jovens Vivendo com HIV/AIDS
Marcelo Jardim dos Santos – Programa se pós-graduação em Saúde Coletiva USP/ Coletiva Loka de Efavirenz
Marta Mc Britton – Instituto Cultural Barong
Toni Reis – Grupo Dignidade/ Aliança Nacional LGBTI+, Associação Brasileira de Família Homotrans Afetiva – Red GAYLATINA
Vencelau Pantoja – Enfermeiro
Vidda Guzzo – GATE