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A miséria se eleva no governo Bolsonaro e atinge o recorde histórico de pobreza no Brasil

O estudo aponta que na Região Metropolitana de Vitória (RMV), o rendimento mensal dos 40% mais pobres é de R$ 390,00, sendo R$ 123,00 menor do que em 2014. E 24,8% da população da RMV estão em situação de pobreza e 6,8% em extrema pobreza


Diante da miséria se ampliando no governo Bolsonaro e com o aumento da pobreza e da extrema pobreza, muiutas famílias tendo morar nas ruas das cidades brasileiras | Foto: Sindicato dos Escrivães, Inspetores e Investigadores da Polícia Civil do RS

O atual governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) conquistou o recorde histórico de levar 19,8 milhões de brasileiros para a completa pobreza e transformar boa parte dessas famílias em moradores de rua. Os números fazem parte da 9ª edição do Boletim Desigualdade nas Metrópoles, que foi feito pelo Observatório das Metrópoles, em parceria com a Pontífice Universidade Católica (PUC) do Rio Grande do Sul e a Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina (RedODSAL).  Leia ou faça o download da íntegra da 9ª Edição do  Boletim, em arquivo PDF, clicando neste link.

O levantamento usou os dados apurados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nos dois últimos anos do governo Bolsonaro (2020 e 2021) a pobreza extrema no Brasil foi elevada de 19,3% para 23,7%. São vários fatores analisados e entre esses está a paralisação do pagamento do Auxílio Emergencial de R$ 600,00 nos três primeiros meses de 2021. Assim, foram constatados que um contingente de mais 3,8 milhões de brasileiros foi para a condição de pobreza.

Segundo o estudo, nas regiões metropolitanas brasileiras, mais de 19 milhões de pessoas estão em condição de pobreza, e mais de 5 milhões estão abaixo da linha de extrema pobreza. O coordenador do boletim, pesquisador do Observatório e professor do IPPUR/UFRJ, Marcelo Ribeiro, disse que em termos de renda real, houve uma perda. “A população passou a ganhar 300 reais, em termos de valor nominal, mas com uma renda real bem inferior ao que era no auge do recebimento dos 600 reais”, exemplifica.

O estudo assegura que, apesar de as pessoas de menor renda passarem a voltar para o mercado de trabalho no final de 2020, e isso continuar em 2021, estimulado pelo avanço do processo de vacinação, essa retomada ainda não foi suficiente para recuperar o nível de renda que as pessoas haviam tido no período anterior à pandemia. E a situação piora muito rapidamente do final de 2020 para 2021. “Dada essa decisão do governo, bastante equivocada, de interromper o auxílio, percebemos esse salto muito grande na taxa de pobreza e extrema pobreza. Claramente, está muito relacionado com a decisão do governo de interromper e reduzir o Auxílio Emergencial”, resume Salata.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva comentou nas redes sociais sobre o resultado da pesquisa que apontou o aumento da miséria no Brasil, durante o atual governo Bolsonaro | Imagem: Twitter/Lula

Renda dos mais pobres caiu entre 2014 e 2021

No ano de 2014, os 40% mais pobres que viviam nas regiões metropolitanas tinham renda média de R$ 515. Cinco anos depois, em 2019, essa cifra havia caído para R$ 470. E, dois anos depois, já no contexto da pandemia, em 2021, aquela média havia chegado a R$ 396. E um padrão semelhante se revela quando são analisadas cada região metropolitana separadamente. Entre 2014 e 2021 a renda dos mais pobres cai de R$ 535 para R$ 404 no Rio de Janeiro, de R$ 354 para R$ 246 no Recife, e de R$ 714 para R$ 581 em Curitiba.

A partir da crise de 2015, passou-se a ter uma trajetória até 2019 em que o nível de renda média voltou a aumentar, mas quem se apropria desse nível de rendimento são os 10% de maior renda. “Os 50% intermediários praticamente mantém o mesmo nível de renda e os 40% mais pobres são os que mais perdem, em torno de 10% ao longo desse período”, afirma Ribeiro. Em termos de renda média, o recorde negativo foi batido mais uma vez. “É a junção de uma renda média caindo e uma desigualdade aumentando, esse é o pior cenário que se pode ter. Então, quando se colocam esses dois indicadores, um batendo recorde positivo e o outro negativo, isso traduz bem o momento que a gente está passando”, complementa Salata.

Metrópole de São Paulo aumentou drasticamente a extrema pobreza

Entre 2014 e 2021 a taxa de pobreza subiu de 16% para 23,7%, o que em termos absolutos se traduziu em uma elevação de 12.5 milhões para 19.8 milhões de pessoas. Ou seja, em apenas sete anos 7.2 milhões de pessoas entraram em situação de pobreza nas metrópoles brasileiras. Em relação à extrema pobreza, no mesmo período a taxa mais do que dobrou, variando de 2.7% para 6.3%. Em termos absolutos, foi um aumento de 2.1 para 5.2 milhões de pessoas em situação de extrema pobreza nas grandes cidades.

“Em termos de recorte, chama muito a atenção quando olhamos para algumas metrópoles individualmente, e não só no conjunto. Se olharmos São Paulo, por exemplo, o dado é chocante. Como aumentou drasticamente a extrema pobreza”, afirma Salata. De acordo com ele, quando verificados os dados em números absolutos das pessoas em extrema pobreza, a metrópole de São Paulo apresenta algo assustador: existem mais de um milhão de pessoas em extrema pobreza, dentro desta metrópole, em 2021.

“A população está aumento, mas ainda assim é um salto muito grande. Imaginemos que tem mais de um milhão de pessoas em situação de extrema pobreza dentro da metrópole de São Paulo, isso exemplifica muito bem a crise social que estamos enfrentando”, salienta.

A medida de extrema pobreza utilizada no estudo, do Banco Mundial, utiliza a linha de pobreza dos países mais pobres do mundo e faz uma média, ou seja, as pessoas seriam consideradas pobres em qualquer lugar do planeta. “Essa quantidade de pessoas nessa situação representa, na verdade, uma metrópole de extrema pobreza dentro da metrópole de São Paulo ou do Rio de Janeiro”, confirma Ribeiro.

Coeficiente de Gini

Em 2014, o coeficiente de Gini – quanto maior o seu valor, maiores são as desigualdades de rendimentos – para o conjunto das regiões metropolitanas era de 0,538. Em 2019, ele havia subido para 0,562. E em 2021, já no período de pandemia, chegava em 0,565. Se considerar somente a região metropolitana do Rio de Janeiro, o coeficiente de Gini saltou de 0,518 para 0,581 entre 2014 e 2021. Em Natal, o Gini variou de 0,529 para 0,588. E em Florianópolis foi de 0,453 para 0,484 no mesmo período.

“Estas são as desigualdades que vemos no dia a dia, em nosso cotidiano. São verdadeiros abismos sociais que podem se revelar num trajeto de menos de 15 minutos em muitas de nossas cidades, e que se tornaram ainda mais graves ao longo dos últimos anos, como mostram os dados”, discorre Salata.

Como efeito da pandemia, não somente as desigualdades aumentaram como a média de rendimentos caiu e atingiu os menores valores da série histórica. Se em 2019 o rendimento médio era de R$1.935, em 2020 ele havia caído para R$1.830, e em 2021 chegava a R$1.698. No Distrito Federal, a renda média caiu de R$2.784 para R$2.476 naquele período. Na região metropolitana de Recife a queda foi de R$1.593 para R$1.079.

E em Porto Alegre foi de R$2.218 para R$1.947. De acordo com Marcelo Ribeiro, a pandemia gerou o pior cenário possível, com queda brutal da média de renda e aumento significativo das desigualdades. Isso significa que a população das nossas metrópoles está, em geral, mais empobrecida, e os recursos mais concentrados entre os estratos mais altos. A consequência esperada e mais palpável disso é o aumento da pobreza e da extrema pobreza.

Projeções para 2022

Segundo Marcelo Ribeiro, pelos resultados do estudo, é possível ver uma queda da taxa de desemprego e, como essa taxa atingiu principalmente as pessoas de mais baixa renda, a redução significa uma retomada ainda maior desse grupo social ao mercado de trabalho, o que faz com que aumente a composição da renda domiciliar para esse indivíduo. Por outro lado, apesar de se perceber em alguns meses uma redução da taxa de inflação, ela ainda se mantém em um patamar elevado, bastante persistente, que faz corroer o poder de compra da população em geral e atinge os mais pobres.

“Diante desse cenário, acho que o que a gente poderia ver é uma situação de uma certa retomada, mas que ainda é insuficiente para atingir os patamares que se apresentavam no período anterior à pandemia. De um modo geral, penso que a população mais pobre ainda vai passar por uma conjuntura bastante complicada em termos de renda média e poder aquisitivo até o final do ano”, prevê o pesquisador.

Para Andre Salata, existe um outro fator importante de se destacar, que é o papel da política de transferência de renda. “Isso é difícil a gente prever porque tem tido muitas mudanças, mas esse auxílio que vai voltar de R$ 600 para todas as famílias que estão cadastradas no Auxílio Brasil, sem dúvida nenhuma vai ter efeito na renda dos mais pobres”, justifica.

Segundo ele, isso vai fazer a renda dos mais pobres subir e terá um efeito sobre desigualdade também, no sentido de ser um fator redutor, mas é sempre muito importante lembrar que política de transferência de renda, para ser bem-feita, precisa ter rentabilidade e ser robusta. “Tem que ser bem focalizada, então, acho que há muitas críticas a serem feitas em relação à focalização e sustentabilidade dessa política no momento, mas que vai ter efeito até o final do ano o valor de R$ 600, isso é certo”, conclui o professor.

Sobre os dados

Os dados são provenientes da PNAD Contínua anual (acumulados na 5ª visita), do IBGE, e dizem respeito à renda domiciliar per capita total. O recorte utilizado é o das 22 principais áreas metropolitanas do país, de acordo com as definições do IBGE. Todos os dados estão deflacionados para o ano de 2021, de acordo com o IPCA. O estudo trabalha com as linhas de US$5,50 PPC para pobreza e US$1,90 PPC para a extrema pobreza, assim como definidas pelo Banco Mundial. Em valores mensais de 2021, a linha de pobreza é de aproximadamente R$465 per capita e a linha de extrema pobreza é de aproximadamente R$160 per capita.