Enfermeiros decidiram realizar uma ampla mobilização nacional nesta próxima sexta-feira (9) em todo o Brasil, para protestar contra a decisão monocrática do STF que favorece a elevada lucratividade dos empresários da “indústria” de hospitais particulares. Até esta manhã de segunda-feira (5) estava mantido um protesto com paralisação das 3ª Ponte, às 16 horas
Neste último domingo (4) uma polêmica decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), que atendeu à pressões dos empresários que são proprietários de hospitais particulares e com receio de ter reduzida a elevada lucratividade do setor, pediram judicialmente a suspensão da Lei 14.434/2022. Essa é a lei idealizada pelo senador capixaba Fabiano Contarato (PT), que trouxe a justiça aos enfermeiros e demais profissionais da enfermagem com um piso salarial. A decisão de Barroso trouxe revolta nos profissionais de enfermagem em todo o Brasil
A lei aprovada no Senado e sancionada pelo atual presidente da República estabeleceu um piso salarial de piso de R$ 4.750,00 para os enfermeiros; 70% desse valor aos técnicos de enfermagem; e 50% aos auxiliares de enfermagem e parteiras. O texto da lei garante esse piso nacional para profissionais contratados sob o regime da CLT e para servidores das três esferas – União, Estados e Municípios -, inclusive autarquias e fundações. A vitória momentânea dos barões dos hospitais particulares levou a categoria decidir neste mesmo domingo protestos e uma assembleia para avaliar uma greve nacional da categoria.
Até esta manhã de segunda-feira (5) estava mantido um protesto na Terceira Ponte, programado para paralisar por completo o trânsito a partir das 16 horas e o local de concentração é a Praça do Papa, na Enseada do Suá, em Vitória. Os componentes da categoria de enfermagem estão pedindo para divulgar os grupos que organiza os protestos em Vitória (ES), nos seguintes links do Telegram e no WhatsApp.
Quem integra a Confederação: Nacional de Saúde (CNSaúde), a entidade empresarial que obteve decisão favorável no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a lei qaue reduz a sua lucratividade: 1) FENAESS – Federação Nacional dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde; 2) FEHOSUL – Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do Rio Grande do Sul; 3) FEHOESC – Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado de Santa Catarina; 4) FEHOSPAR – Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado do Paraná; 5) FEHOESP – Federação dos Hospitais, Clínicas, Casas de Saúde, Laboratórios de Pesquisas e de Análises Clínicas e demais Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado de São Paulo; 6) FEBASE – Federação Baiana de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços; 7) FEHERJ – Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado do Rio de Janeiro; 8) FEHOESG – Federação dos Hospitais, Laboratórios, Clínicas de Imagem e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado de Goiás.
No Espírito Santo
E não foi diferente no Espírito Santo. Tão logo o STF tornou pública a decisão de Barroso, foi iniciado um amplo debate nas redes sociais do Espírito Santo, inclusive com a formação de grupos específicos no WhatsApp e no Telegram (até as 8 horas desta manhã de segunda-feira, 5, já são 1.214 profissionais de enfermagem capixaba debatendo detalhes de como serão os protestos e a greve em preparação. O intuito é obter aprovação da sociedade contra a decisão do STF que favorece a continuidade da elevada lucratividade do promissor negócio de hospitais particulares.
As 20 horas deste último domingo o Sindicato dos Enfermeiros do Espírito Santo (Sindienfermeiros) emitiu no Facebook a seguinte nota à categoria e à sociedade capixaba: “O Sindicato dos Enfermeiros do Espírito Santo- Sindienfermeiros-ES, como toda a enfermagem brasileira vê na liminar do ministro Barroso, de suspender o piso salarial da enfermagem, um ato monocrático e de total desrespeito aos trabalhadores da enfermagem. A presidente Valeska Fernandes Morais de Souza, manifesta indignação com essa decisão e até pelo dia em que foi publicada.
“A falta de respeito é tanto, que em pleno dia de domingo, dia sagrado de descanso do trabalhador, ele publica uma decisão dessa. Ele não tinha nada para fazer no domingo, para infernizar a cabeça do trabalhador. O requinte de maldade foi tão grande que não bastou suspender, ainda teve que ser com requinte de crueldade”. O Sindienfermeiros-ES não se curvará a nenhuma liminar, ou pressão dos empresários da saúde e se manterá firme na luta pelo piso salarial da enfermagem. A entidade se unirá às organizações e mobilizações nacionais da enfermagem em defesa da legalidade do piso salarial”, Vitória, 04/09/2022, Sindienfermeiros-ES.
Decisão de Barroso deixou bolsonaristas eufóricos
A decisão do ministro Barroso em ceder as pressões dos barões da indústria de hospitais privados levou os bolsonaristas, através de suas redes sociais, à euforia para atacar o STF. Viram na decisão polêmica a oportunidade de conquistar o apoio da população ao seu intento de atacar o Supremo, para mostrar que seus argumentos de questionar o que a alta Corte faz não atende aos interesses da sociedade. A decisão favorável à Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade 7.222 – Distrito Federal, ocorrido em um domingo e faltando apenas três dias para as manifestações antidemocráticas contra o STF, que estão sendo preparadas pelos bolsonaristas para este 7 de setembro, foi considerada por especialistas em direito como um erro estratégico. “Barroso jogou mais lenha na fogueira contra o STF”, avaliou um advogado capixaba.
O senador Contarato emitiu uma nota nas suas redes sociais para tranquilizar a categoria da enfermagem, que foi prejudicada pela decisão do ministro do STF favorável a continuidade dos elevados lucros dos empresários que exploram os hospitais públicos. “Amigas e amigos da enfermagem, já iniciamos um trabalho conjunto aqui no Senado para reverter a suspensão do pagamento do piso salarial. Esse direito é legítimo, resulta de uma luta histórica e foi aprovado com ampla segurança jurídica, endossada, na ação em curso no STF, pela Advocacia-Geral da União, pela Câmara dos Deputados e pelo Senado. Contem comigo porque está vitória é de vocês”, disse Contarato.
Repúdio da FNE a vídeo Fake News de prefeitos
Além dos empresários que exploram ganhos financeiros com hospitais particulares e viram no piso uma ameaça a elevada lucratividade, a A Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE) emitiu recentemente nota de repúdio a uma desinformação que vem sendo promovida, através de vídeo nas redes sociais pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM). “No vídeo é possível ver um discurso que tenta tirar a conquista da enfermagem quando afirma que a criação do piso nacional dos enfermeiros, auxiliares, parteiras e técnicos de enfermagem sem a definição da fonte de custeio pode trazer impacto de R$ 9,4 bilhões anuais aos cofres municipais e inviabilizar de vez a prestação de serviços à população”, diz a nota do FNE.
Segundo a FNE, todas essas informações são fake news. E, lamenta, a criação do movimento municipalista encabeçado pela CNM que tem concentrado esforços junto aos parlamentares para evitar que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 11/2022 seja aprovada. “Essa é uma afronta não só a enfermagem, mas, ao povo brasileiro. Houve estudos feitos pelas entidades nacionais da enfermagem e um trabalho intenso de deputados federais para essa aprovação. A exemplo, temos que o impacto no setor municipal, apurado no relatório do GT da Câmara de Deputados, é pouco mais que 4 bilhões.É um marco na história e a categoria se manterá mobilizada”, diz a entidade nacional dos trabalhadores da enfermagem.
“O piso não tem nenhuma ilegalidade e para ser aplicado não precisa de nenhuma legislação complementar. Entretanto, a enfermagem brasileira está lutando por mais recursos para a saúde, não por conta das afirmações inverídicas dos gestores, mas, pelo povo brasileiro e pelo SUS. Quando os municípios precisaram da enfermagem e não deixaram os trabalhadores tirarem férias, licença e não concederam reajuste, nenhum deles perguntou qual seria a fonte de recurso para essas pessoas sustentarem suas famílias e pagar seu tratamento médico por desgaste físico e mental. Então, não é justo que essas lideranças ataquem o direito da enfermagem. Os parlamentares que apoiarem esse movimento estarão se colocando contra o povo brasileiro”, rebateu a presidenta da FNE, Shirley Morales.
O que diz o STF
Ainda neste último domingo, o STF emitiu nota a imprensa. Nesse documento é dito que o ministro Luís Roberto Barroso suspendeu o piso salarial nacional da enfermagem e deu prazo de 60 dias para entes públicos e privados da área da saúde esclarecerem o impacto financeiro, os riscos para empregabilidade no setor e eventual redução na qualidade dos serviços.
“Barroso considerou mais adequado, diante dos dados apresentados até o momento, que o piso não entre em vigor até esses esclarecimentos. Isso porque o ministro viu risco concreto de piora na prestação do serviço de saúde principalmente nos hospitais públicos, Santas Casas e hospitais ligados ao Sistema Único de Saúde (SUS), já que os envolvidos apontaram possibilidade de demissão em massa e de redução da oferta de leitos”, alegou o STF.
O ministro frisou a importância da valorização dos profissionais de enfermagem, mas destacou que “é preciso atentar, neste momento, aos eventuais impactos negativos da adoção dos pisos salariais impugnados”. “Trata-se de ponto que merece esclarecimento antes que se possa cogitar da aplicação da lei”, completou. Além disso, alertou que Legislativo e Executivo não cuidaram das providências para viabilizar a absorção dos custos pela rede de saúde.
“No fundo, afigura-se plausível o argumento de que o Legislativo aprovou o projeto e o Executivo o sancionou sem cuidarem das providências que viabilizariam a sua execução, como, por exemplo, o aumento da tabela de reembolso do SUS à rede conveniada. Nessa hipótese, teriam querido ter o bônus da benesse sem o ônus do aumento das próprias despesas, terceirizando a conta”, diz o ministro Barroso.
A decisão cautelar do ministro na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7222 será levada a referendo no Plenário Virtual nos próximos dias. Ao final do prazo e mediante as informações, o caso será reavaliado por Barroso. A ação foi apresentada pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde), que questionou a constitucionalidade da lei 14.434/2022.
Serão intimados a prestar informações no prazo de 60 dias sobre o impacto financeiro da norma os 26 estados e o Distrito Federal, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e o Ministério da Economia. Já o Ministério do Trabalho e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) terão que informar detalhadamente sobre os riscos de demissões. Por fim, o Ministério da Saúde, conselhos da área da saúde e a Federação Brasileira de Hospitais (FBH) precisarão esclarecer sobre o alegado risco de fechamento de leitos e redução nos quadros de enfermeiros e técnicos, diz a nota do STF.
O que os empresários alegaram ao STF
Entre outros pontos, a CNSaúde alegou que a lei seria inconstitucional porque regra que define remuneração de servidores é de iniciativa privativa do chefe do Executivo, o que não ocorreu, e que a norma desrespeitou a auto-organização financeira, administrativa e orçamentária dos entes subnacionais, “tanto por repercutir sobre o regime jurídico de seus servidores, como por impactar os hospitais privados contratados por estados e municípios para realizar procedimentos pelo SUS”.
A CNSaúde também afirmou que o texto foi aprovado de forma rápida e sem amadurecimento legislativo na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, onde não passou por nenhuma comissão, mesmo diante da relevância da medida e de seus impactos significativos. Conforme a confederação, a aplicação da lei pode aumentar o desemprego, gerar a falência de unidades de saúde ou aumento de repasse de custos no serviço privado, entre outros problemas.
A decisão de Barroso traz dados de impacto financeiro da medida referentes à tramitação no Congresso. Conforme o Dieese, o incremento financeiro necessário ao cumprimento dos pisos será de R$ 4,4 bilhões ao ano para os Municípios, de R$ 1,3 bilhões ao ano para os Estados e de R$ 53 milhões ao ano para a União. Já a Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB) indicou incremento de R$ 6,3 bilhões ao ano.
“Tais valores têm potencial para impactar as finanças públicas, já que, diante de eventual desequilíbrio econômico-financeiro que sobrevenha aos convênios e contratos formalizados para a prestação de serviços ao SUS, é esperado que os particulares busquem a revisão de suas cláusulas em face dos Estados e Municípios celebrantes”, afirmou o ministro.