fbpx
Início > Apib e Apoinme acionam instituições para exigir segurança aos Pataxó diante de ataques de milícias bolsonaristas

Apib e Apoinme acionam instituições para exigir segurança aos Pataxó diante de ataques de milícias bolsonaristas

Indígenas responderam aos ataques acionando as instituições democráticas e organizando atos políticos na região | Foto: Apib

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil e a Articulação dos Povos (Apib) e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo; o Conselho Indigenista Missionário; o Coletivo Semear; a Frente Ampla Democrática pelos Direitos Humanos; e o Instituto Hori Educação e Cultura fizeram uma denúncia ao Ministério Público Federal (MPF) sobre os ataques de milícias bolsonaristas ao Território Indígena (TI) Barra Velha, ocorridos nos últimos três meses, que deixou um menino de quatorze anos assassinado.

“Em junho deste ano, os conflitos entre indígenas e não indígenas sobre o território em questão acirraram-se. Buscando pressionar os órgãos públicos competentes para dar seguimento ao processo de demarcação, os indígenas ocuparam a Fazenda Brasília, sobreposta à terra indígena. Como resposta, fazendeiros da região associaram-se e dirigiram-se em grupo ao local para expulsar os indígenas de modo ameaçador”, explica o documento. Os ataques deram origem à requisição de inquérito policial e a instauração do inquérito civil, investigações que já estão tramitando.

Em resposta, o MPF fez uma recomendação à Secretaria de Segurança Pública da Bahia exigindo que envie uma “força tarefa com policiais de fora do extremo sul da Bahia para atuar emergencialmente nas terras indígenas Comexatibá e Barra Velha”; adote medidas para “inibir vínculos contratuais formais ou informais entre policiais militares e fazendeiros”; e garanta uma tramitação “célere e efetiva de procedimentos administrativos para a apurar a participação indevida de policiais militares, ainda que fora de serviço, junto a fazendeiros nos ataques a comunidades indígenas das terras indígenas Comexatibá e Barra Velha.”

Caciques

Os caciques de Barra Velha, Boca da Mata, e Aldeia Nova estiveram em Brasília para uma audiência, na qual foi apresentada a situação. Nas audiências de interdito/reintegração de posse que seguiram, o juiz determinou a suspensão do processo e a posse dos Pataxó nas áreas retomadas, reafirmando que eles não podem ser prejudicados pela demora do processo de demarcação. O juiz revogou quaisquer liminares que se possam ter dado em todos os processos da TI Barra Velha.

O Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (MUPOIBA) e a Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia (FINPAT) se reuniram com a secretaria de Segurança Pública, o Comando Geral da PM, a Delegada Geral da Polícia Civil, a Secretaria de Justiça e a Secretária de Promoção da Igualdade Racial, da qual se deliberou o envio imediato de uma equipe especializada da Polícia Militar e da Polícia Civil para atuar na região até que a situação volte à normalidade, com acompanhamento direto da Secretaria de Justiça. Por fim, a delegacia geral da Polícia civil está investigando a atuação de agentes da segurança pública na atuação de pistolagem no extremo sul baiano, assim como o assassinato do adolescente Gustavo Pataxó, que foi alvejado durante um dos inúmeros cercos e tiroteios contra as aldeias.

Mesmo com a intervenção institucional, os Pataxó continuam em alerta, reforçando a segurança das áreas para prevenir eventuais reações dos invasores. Na quarta-feira, 07/09, os Pataxó realizaram um manifesto em repudio aos ataques sofridos na Terra Indígena Barra Velha. E na manhã deste sábado, 10/09, as comunidades indígenas do TI Comexatibá realizaram um ato político em Cumuruxatiba, com apoio dos moradores da Vila, em defesa da vida do Povo Pataxó e pela imediata demarcação dos Territórios Indígenas atacados.

Anteriormente os Pataxós divulgaram a seguinte carta:

Nós, lideranças Pataxó das comunidades das Tis Comexatibá e Barra Velha, profundamente abalado(a)s, tristes e indignado(a)s com mais uma vítima assassinada pelas forças do latifúndio que imperam na nossa região, vimos a público denunciar e informar das violências, ataques e tocaias que temos sofrido nestas duas terras indígenas, sobretudo, nos três últimos meses. Cientes de que embora, venham sendo praticadas por meio de diferentes estratégias que vão, desde as balas dos trabucos e fuzis, até as setas envenenadas das fakenews, mentiras calúnias e difamações, direcionadas para nossas lideranças. No intuito de espalhar desconfiança, deslegitimar o movimento indígena por auto demarcação da nossa terra. Por isso, com o objetivo de informar e melhor esclarecer o que está se passando, vimos expor o seguinte.

No dia 23 de junho 2022 a Secretaria de Assuntos Indígenas do município de Prado-BA, em nota encaminhada ao MPF, informou a decisão consensuada entre as lideranças da aldeia Alegria Nova e o Senhor Rodrigo Carvalho. Detentor da posse subtraída de forma violenta da família da Senhora Julice e Elviro no ano de 2002. O acordo previa a desocupação da fazenda e sua restituição à Terra Indígena Comexatibá. Com base nesse acordo que seria selado com a FUNAI e MPF, 160 parentes Pataxó resolveram auto demarcar pacificamente a área com a construção de suas moradias. Este acordo só durou três dias, o suposto proprietário (invasor) do antigo Pequi Velho, atual “Fazendo Santa Bárbara/ Santa Rita” desistiu do acordo. Após ter sido contatado pela organização dos fazendeiros armados que vinham divulgando nos seus grupos de whatsapp a promessa de transformar a região no mesmo campo de guerra instalado no Mato Grosso do Sul. Ostentando uma carreata com 60 carros de carroceiras com homens exibindo suas potentes armas. Desde então, os parentes da área retomada passaram a ser vigiados por drones, dia e noite direcionados à área em questão.

Descobriram neste movimento que na fazenda São Jorge vizinha e limitante com o Pequi Velho (Fazenda Santa Barbara /Santa Rita) pertencente à TI Comexatibá, havia sido instalado um depósito de armas e munição. Além de servir de alojamento para os pistoleiros e milicianos que passaram a monitorar as imagens captadas pelos drones que circulavam e continuam circulando no entorno. É importante situar estes acontecimentos no quadro geral da campanha de ataques e violências que vêm sendo metodicamente planejados contra nós, povos indígenas do Brasil da Bahia, especialmente nesta região, com a anuência da FUNAI e omissão dos órgãos de segurança pública. Mais grave ainda, com participação de militares que ‘prestam serviços’ extras aos fazendeiros em conflito. Porque neste caso, os nossos adversários invasores de nossas terras indígenas Barra Velha e Comexatibá, são os mesmos, os atos violentos vêm sendo protagonizados pela mesma associação de fazendeiros já citada. É de conhecimento público, visto que a exibição de suas ameaças e atos violentos circulam nas redes de whatsapp da extrema direita Bolsonarista locais e regional. Muito desse material já foi anexado às denúncias que fizemos junto a FUNAI, MPF e DPU.

Pelo exposto, os parentes pressionados por recorrentes invasões violentas de sua vizinhança decidiram expulsar os pistoleiros e auto demarcar a Fazenda São Jorge para fazê-la cessar. Essa propriedade já cumpriu esta mesma função há vinte anos atrás, quando serviu de abrigo para a pistolagem contratada pelos fazendeiros do vale da microbacia do rio Cahy. No ano 2000, sob o domínio do vulgo Betão esta área invadida foi vendida para o Senhor Nem Gomes. Este Senhor cultiva a fama de não ter compaixão com índio e se arroga ao contar sobre supostos massacres que já executou no Estado do Pará onde também afirma ter muitas posses.

Em linha com os ataques citados uma verdadeira máquina de fake News vem sendo operada nesta guerra sem fim. Principalmente, por políticos representantes das elites locais que se mobilizaram em torno de uma suposta matéria jornalística, prometida pelo senhor Juliano Ceglia. outro ator que é por nós, considerado parte no conflito. Se levarmos em conta que, segundo ele próprio informou no seu instagram e por meio de outros meios de comunicação, também, é parente consanguíneo próximo dos Sr. Normando Carvalho e Rodrigo Carvalho, supostos proprietários das áreas em litígio, sobrepostas a TI Comexatibá, autodemarcada. 

Este tal jornalista Juliano Ceglia, sob o pretexto de estar produzindo uma matéria para o programa “Domingo Espetacular” da Rede Record, fez contato e se aproximou de parentes e lideranças da Aldeia Águas Belas, até conseguir do cacique Baia a narrativa que queria para sustentar a tese que ele mesmo criou com os fazendeiros: a de que o movimento das retomadas não vem sendo feito por parentes indígenas, mas por não-índios, milicianos e criminosos infiltrados. Não corresponde em nada, a verdade dos fatos, tampouco, a força da autodeterminação de nosso movimento para garantir minimamente nossos direitos, nossas Terras Indígenas. Apesar da FUNAI que, em vez de nos defender e proteger, tem demonstrado que se encontra totalmente aparelhada por aqueles que querem invadir nossas terras, nos exterminar. 

Somos todo(a)s indígenas, indígenas Pataxó. Não há infiltrados neste movimento que realizamos pacificamente. O Cacique Baia e sua comunidade Aldeia Águas Belas vêm sofrendo as mesmas ameaças e os mesmos ataques que nós temos sido vitimados. É um parente reconhecidamente cooptado e afagado por fazendeiros e políticos locais, a exemplo da família Brito e do vereador bolsonarista de Prado Brênio Pires, invasor da área da Aldeia Tibá, protagonistas locais de vários ataques contra nós e nosso território. Sua fala manipulada nos vídeos que o tal jornalista passou a veicular, não nos representa, tampouco, seu conteúdo corresponde à verdade dos fatos, nem sua veiculação teve nosso pleno e informado esclarecimento.

O mais grave é que tudo isso serviu para atirar mais combustível na fogueira das violências autorizadas neste território, cujo consentimento vem sendo conquistado através de notícias, matérias caluniosas espalhadas nos grupos de WhatsApp e redes sociais que só desqualificam nossas lideranças, aliados (as) históricos (as) e apoiadores (as) locais. Foi usando deste artifício de manipulação da opinião pública por meio da veiculação de supostos ‘vazamentos’ de trechos da matéria jornalística citada que ameaça ser veiculada no próximo domingo dia 11 de setembro, pelo próprio autor e suposto jornalista Juliano Ceglia que, na última madrugada do domingo dia 4 de setembro, o jovem Gustavo Silva da Conceição, foi cruelmente assassinado com vários tiros de fuzil disparados covardemente contra ele durante o ataque, enquanto dormia de madrugada.

Um verdadeiro massacre teria se consumado, caso os próprios combatentes não tivessem alvejado acidentalmente, dois de seus comparsas no grupo. Cuja estratégia se configurou numa verdadeira tática de guerra com o uso recursivo de equipamentos e tecnologias altamente sofisticadas, registradas somente nas ações da segurança pública, a exemplo do emprego de toucas ninjas, gás lacrimogênio, fuzil, escopetas calibre 12, rifles 38.

Por tudo isto, clamamos por justiça, que seja impedida a veiculação pela Rede Record ou qualquer outro meio de comunicação, da matéria caluniosa anunciada para o programa domingo espetacular.

Que sejam identificados e criminalizados os assassinos de nosso(s) parente(s), os agentes locais que operam na propagação de mentiras e fakenews para dar suporte e justificar as violências.

Que a polícia federal assuma o comando para desintrusão e retirada das milícias e pistoleiros contratados para espalhar a morte e o terror no nosso território, ao longo das estradas de servidão e acessos vicinais.

Que a nossa Terra Indígena Barra Velha e Comexatibá seja, finalmente, demarcada!