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Laboratório é condenado pela Justiça por erro em exame toxicológico

O laboratório Tommasi ao dar um resultado toxicológico errado a um motorista profissional, trouxe prejuízo para o cliente, que teve a renovação da CNH negada pelo Detran-ES e se viu impedido de trabalhar | Foto: Divulgação

O laboratório Tommasi Analítica Ltda, de propriedade do grupo Laboratório Tommasi, foi condenado pela juíza da 4ª Vara Cível da Serra (ES) a pagar indenização de R$ 10 mil ao motorista RPG, pelo resultado de um exame toxicológico errado, dando positivo para a presença de benzoilecgonina, a principal substância metabólica da cocaína. O erro do laboratório, segundo o que consta no Processo 0003280-98.2021.8.08.0048 custou caro para o cliente, que alegou prejuízo com a sua carreira profissional de motorista.

O cliente precisa alterar a classificação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) para a letra “D”, afim de poder operar veículos de grande porte, cuja finalidade sua era trabalhador como operador de escavadeira e carregadeira. O laboratório do grupo Tommasi, além de ter cobrado R$ 203,34 em 5 de fevereiro de 2020 para realizar o exame, ainda cobrou mais R$ 190,00 em 14 de fevereiro do mesmo ano um segundo teste toxicológico, que também que, ao contrário do primeiro, veio como negativo para a presença de substância benzoilecgonina (metabólico da cocaína).

Mas, diante do erro da empresa Tommasi Analítica Ltda, que enviou seus resultados conflitantes diretamente para o Detran-ES, este órgão público estadual, por sua vez, inviabilizou por completo a conclusão do processo administrativo para alteração de categoria da CNH. E com isso perdeu a oportunidade de iniciar o novo trabalho, cuja empresa aguardava somente a apresentação da carteira de motorista com a letra “D”. Diante do erro do Laboratório Tommasi, a juíza mandou que essa empresa devolvesse as despesas do cliente com os exames toxicológicos que não refletiam a verdade, no total de R$ 393,34.

Leia a íntegra da decisão judicial

Processo: 0003280-98.2021.8.08.0048, 4ª Vara Cível da Serra (ES)

Data da Distribuição: 18/02/2021 17:45, Ação: Procedimento Comum Cível

Juiz : CINTHYA COELHO LARANJA

Dispositivo :

Trata-se de AÇÃO INDENIZATÓRIA ajuizada por Rxxxxxxx Pxxxxx Gxxxxxx em face de TOMMASI ANALITICA LTDA, todos devidamente qualificados na exordial.

Narra o autor que realizou cursos preparatórios para operar veículos grandes, quais seja, escavadeira e carregadeira. Desse modo, precisou de adquirir a habilitação de categoria D a fim de viabilizar sua atuação profissional.

Na finalidade descrita, tornou-se necessário a realização de exames toxicológicos, momento este que passou a estabelecer relações com a clínica da requerida, sendo efetivada a coleta de material biológico do requerente no dia 23/01/2020, com realização do exame na data 05/02/2020.

Informa que foi despendida a quantia de R$ 203,34 (duzentos e três reais e trinta e quatro centavos) para realização do referido exame.

Ao receber o resultado do referido exame, este trouxe a constatação de que o requerente fez utilização da substância benzoilecgonina (metabólico da cocaína). No entanto, o autor informa que nunca utilizou a substância citada.

Com essa controvérsia, o autor aduz que realizou no dia 14/02/2020 um segundo exame toxicológico em clínica diversa, com a despesa de R$190,00 (cento e noventa reais).

Alega que esse segundo exame resultou em negativa para as substâncias ora positivas no exame realizado pela parte demandada, sendo assim, importando em uma divergência.

O requerente aduz que com o resultado do primeiro exame restou impossibilitado ao exercício de sua habilitação, visto que o exame foi enviado diretamente para o site do Detran, inviabilizando a conclusão do processo administrativo em trâmite.

Requer que seja a empresa requerida condenada em danos materiais no valor de R$ 393,94 (trezentos e noventa e três reais e noventa e quatro centavos), compreendendo as despesas de ambos exames toxicológicos.

Pleiteia a condenação em danos morais na importância de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), considerando a falsa imputação de uso de substância ilícita pela empresa requerida.

Pedido de assistência judiciária gratuita pela parte autora.

Em despacho de fl. 49 foi deferida a assistência judiciária gratuita pleiteada na exordial, assim como, determinou-se a citação da parte demandada com todos os termos e advertências legais.

Retorno do AR em fl. 50-v devidamente cumprido, portanto, certificada a citação da requerida.

Certificada a inércia da parte demandada em fl. 51, em razão da não manifestação nos autos.

Por conseguinte, decretada a revelia em despacho de fl. 52. Ato contínuo, foi determinada a juntada de documento de fls. 15/16, visto que o apresentado na exordial se encontrava ilegível.

Cumprida a determinação, vieram os autos conclusos.

É O RELATÓRIO. PASSO AO JULGAMENTO.

Do conteúdo probatório

A demanda proposta pela requerente envolve o pleito indenizatório em face de uma falha técnica apresentada pela parte requerida.

De acordo com os documentos juntados aos autos, a janela de detecção do exame realizado nas repartições da parte demandada corresponde ao período mínimo de 90 dias, podendo ultrapassar 180 dias em casos de pelos (fl. 17). Não obstante, a data de coleta do material se deu no dia 23/01/2020.

A coleta do segundo exame, realizado em laboratório diverso, foi no dia 14/02/2020, cerca de 22 dias após ao recolhimento originário.

Outrossim, está evidenciado que no exame posterior a janela de detecção, realizada com o mesmo material biológico (pelos), está em aproximadamente 180 dias. Ou seja,  com força probatória suficiente para descaracterizar a prova do diagnóstico antecedente.

Posto isso, se reconhece a veracidade das alegações, somado aos efeitos da revelia, em que a parte suplicada não colacionou conteúdo algum para refutar a matéria alegada pelo suplicante, assim como os documentos que corroboraram às suas afirmações. Por conseguinte, está constatado que a parte autora não utilizou entorpecentes e o exame laboratorial originário apresenta falhas em suas constatações.

Da responsabilidade civil

Em que pese a responsabilização no caso, vislumbro que a aplicação do diploma consumerista é completamente cabível, visto que se trata de uma relação de consumo e a parte autora detém vulnerabilidade técnica diante da requerida, em consonância à teoria finalista mitigada aplicada pelo STJ.

Dessa maneira, a responsabilidade objetiva recairá em detrimento da fornecedora.

Art. 14 – O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

No que concerne a conduta, esta se comprova pela ocorrência do exame no ambiente da demandada, mediante os documentos colacionados às fls. 17. Portanto, verifica-se a realização do ato.

Ao analisar o dano, resta inequívoco o dano causado ao autor diante do resultado do exame. Diante disso, o requerente ao obter o referido resultado positivo para uso de entorpecentes, teve sua vida profissional obstada, pois a exigência legal ao exame toxicológico negativo é absoluta para alteração da carteira nacional de habilitação no caso em tela.

No que concerne ao nexo causal, está configurado que, somente diante da realização do exame com o laboratório da requerida, foi inviabilizada a emissão de sua habilitação perante o órgão de trânsito.

Portanto, completamente cabível o reconhecimento da responsabilidade objetiva e configurado diante da conduta perpetrada pela ré.

Do dano material

No que se refere aos gastos gerados na vida do requerente, este demonstrou que houve a despesa quanto a realização dos exames, trazendo valores no total de R$ 393,34 (trezentos e noventa e três reais e noventa e quatro centavos), compreendendo os dois exames realizados, com documentos fiscais acostados em fls. 19/23.

Sendo assim, é devido à parte autora os valores referentes aos exames realizados, considerando a falha no serviço da requerida. 

Razão pela qual reconheço o provimento ao ressarcimento, em conformidade com o Art. 927 do Código Civil.

Do dano moral

No tocante aos danos morais, está em evidência que na nossa sociedade a utilização de entorpecentes é reprovável socialmente, bem como juridicamente, ensejando em casos extremos a persecução penal. Ademais, ao inviabilizá-lo de exercer seu ofício, é demonstrado o abalo moral de grande impacto na vivência do requerente, necessitando de um provimento jurisdicional a legitimar o dano sofrido, nos termos do Art. 186 do diploma cível.

Cumpre ressaltar entendimento jurisprudencial acerca da temática específica deste processo. Dessa maneira, o Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou em um de seus julgados recentes:

“[…] É inegável, neste caso, o abalo moral sofrido pela parte autora ao se deparar com laudo falso positivo para o exame toxicológico, sabendo que era “falso-positivo”, como restou demonstrado nos exames subsequentes. Embora não fosse usuário de drogas, ele sofreu as penalidades que seriam cabíveis nessa hipótese, passando por enorme transtorno e constrangimento em seu ambiente de trabalho, pois foi afastado de seu trabalho até obter a renovação de sua CNH.” (AREsp 1892829 MG 2021/0135231-3)

Portanto, cabe a este Juízo impor o Direito atrelado ao fato, com o total respaldo do entendimento dos tribunais superiores.

Dessa maneira, levando em consideração os elementos constantes dos autos, bem como os princípios da proporcionalidade e razoabilidade fixo a indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Isto posto, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil e JULGO PROCEDENTE a pretensão autoral.

CONDENO a requerida a restituir ao autor o montante de R$ 393,94 (trezentos e noventa e três reais e noventa e quatro centavos) referente aos danos emergentes, atualizado com correção monetária a contar do desembolso até a citação, quando passará a incidir a taxa SELIC. No tocante aos danos morais CONDENO ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) com correção monetária a partir desta data até a citação, quando passará a incidir somente a taxa SELIC, evitando-se o bis in idem.

CONDENO a requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, com fulcro no art. 85, §2º do CPC.

Publique-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, nada mais sendo requerido arquivem-se os autos com as devidas cautelas de praxe.

ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

PODER JUDICIÁRIO

SERRA – 4ª VARA CÍVEL