Os produtos transgênicos são saudáveis apenas para a conta bancária das empresas transnacionais, como a Monsanto, Du Pont, Bayer, Basf, Feijão, Dow, Syngenta e até para a estatal brasileira Embrapa, alegam críticos ambientalistas. Para o bem da saúde, o consumidor deve evitar os transgênicos e adquirir apenas os produtos orgânicos, aconselham os ambientalistas
A Ufes abre a oportunidade para que seja debatido o monopólio praticado pelas transnacionais no mercado agrícola brasileiro, com o único objetivo de terem lucros abusivos. Um relatório elaborado pelo Grupo ETC, organização socioambientalista internacional que atua no setor de biotecnologia e monitora o mercado de transgênicos, revela que as seis maiores empresas, apelidadas de “Gene Giants” (Gigantes da Genética), controlam atualmente 59,8% do mercado mundial de sementes comerciais e 76,1% do mercado de agroquímicos, além de serem responsáveis por 76% de todo o investimento privado no setor.
O debate da Ufes é organizado pela Comissão Interna de Biossegurança (CIBio/Ufes) e será realizado nesta quarta-feira (26), para debater a modificação genética de produtos e sua regulação no mercado. O evento será realizado em parceria com o International Life Science Institute Brasil (ILSI), o encontro Transgênicos e a questão da rotulagem será realizado de forma híbrida: presencialmente, no auditório da Biotecnologia, no campus de Maruípe, em Vitória; e transmitido on-line, com tradução simultânea.
Com proposta didática, o evento é dirigido ao público em geral. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas até terça-feira (25), clicando neste link. O encontro está dividido em duas partes. Pela manhã, a partir das 9 horas, acontece o workshop Transgênicos são seguros?, com abertura da diretora executiva do ILSI Brasil, Flavia Goldfinger, e da professora do Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia da Ufes (PPGBiotecnologia) e presidente da Comissão Interna de Biossegurança, Patricia Fernandes.
Na sequência, o pesquisador da Fundação Espírito-Santense de Tecnologia (Fest), Oeber Quadros, ministra palestra em que define o que são os transgênicos. Em seguida, a professora da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Denise Capalbo, e a pesquisadora do Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), Adriana Gianotto, abordam formas de avaliar a segurança desses produtos. Gianotto e Fernandes voltam no último momento da manhã para falar sobre o gerenciamento da segurança dos transgênicos. Haverá períodos para perguntas e respostas da plateia, além de debate ao fim das palestras.
À tarde, a partir das 13h30, acontece a segunda parte do evento, Transgênicos e a questão da rotulagem, com abertura de Flavia Goldfinger e representantes da Ufes. Às 14 horas, o pesquisador e professor James Broach, chefe do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular e diretor do Instituto de Medicina Personalizada da Penn State University, profere a palestra que dá título ao encontro. Logo depois, às 15 horas, o professor do PPGBiotecnologia/Ufes, Alberto Fernandes, modera um bate-papo com o diretor da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (ABIA), Alexandre Novachi, a doutoranda Luiza Favarato (PPGBiotecnologia/Ufes), a professora Patricia Fernandes e dois estudantes do ensino médio – um do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) e um da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio (EEEFM) Hildebrando Lucas, localizada em Vitória. Por fim, às 17 horas, acontece o lançamento do livro Transgênicos e a questão da rotulagem, escrito por vários especialistas no tema.
Uso dos pesquisadores pelas transnacionais, para terem lucro elevado
Para a professora Patricia Fernandes, o evento é uma oportunidade para as pessoas entenderem, de fato, o que são os transgênicos e para que servem as modificações genéticas. “Sempre se associou transgênicos a agrotóxicos. A maioria das pessoas sabe só o que ouviu falar, e geralmente o que foi falado contra”, afirma ela. As grandes empresas transnacionais usam os pesquisadores de universidades para promover o desenvolvimento de mudanças genéticas, apenas para elevar ainda mais a lucratividade. Os produtores rurais ficam escravizados diante dessas empresas, já que são obrigados a pagar royalties.
Há cientistas que aceitam se submeter a essas grandes empresas e chegam a ser financiados por empresas transnacionais e acabam sendo propagadores de supostos “benefícios”. Empresas como Monsanto, Du Pont, Bayer, Basf, Feijão, Dow, Syngenta e até a estatal brasileira Embrapa, cooptam os pesquisadores para desenvolver tecnologia que venha alterar geneticamente as plantações agrícolas, para terem seus lucros elevados. Além de serem financiados, ainda elogiam a transformação da natureza, para gerar produtos geneticamente modificados, como se fosse algo vantajoso para a saúde da população, apresentou o jornal Repórter Brasil. Os produtos transgênicos são saudáveis apenas para a conta bancária das empresas transnacionais.
A concentração de mercado, por si só, já seria passível de críticas, mas ambientalistas, associações de defesa do consumidor e adversários dos transgênicos em geral também repudiam severamente os métodos utilizados ao longo dos anos pelas Gene Giants para consolidar seu monopólio. Nos países onde atuam, a ação das empresas transnacionais, ainda hoje, é norteada pela política do fato consumado na introdução de seus produtos (com práticas como a distribuição ilegal de sementes ou a contaminação deliberada de lavouras convencionais), a pressão sobre os agricultores para a adoção da tecnologia transgênica e dos produtos químicos agrícolas a ela associados e a influência direta sobre os órgãos nacionais do poder público responsáveis por deliberar sobre a liberação de organismos geneticamente modificados, prossegue o Repórter Brasil.
O que são alimentos transgênicos e os riscos para a agricultura familiar?
Os transgênicos são alimentos modificados geneticamente com a alteração do código genético. Ou seja, quando são inseridos nos organismos genes proveniente de outro. Esse procedimento pode ser feito até mesmo entre organismos de espécies diferentes (inserção de um gene de um vírus em uma planta, por exemplo) e realizado com plantas, animais e micro-organismos. As espécies transgênicas são protegidas por patentes, o que significa que o agricultor que decidir utilizá-las deverá pagar royalties para a empresa detentora da tecnologia”, informa o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
A consequência mais imediata é o aumento da dependência do agricultor das empresas transnacionais do setor. Isto por que, por regra contratual, o agricultor não pode utilizar as sementes do plantio anterior. Assim tem que comprar as sementes transgênicas a cada safra. Além disso, é muito difícil o agricultor “se livrar” totalmente das plantas transgênicas, o que pode ocorrer com qualquer plantação, já que, caso ele não queira mais plantá-las, a chance de ainda nascer uma planta transgênica na plantação convencional existe. Caso isso ocorra, ele será compelido a pagar uma multa e mais royalties, diz o Idec.
O órgão de defesa do consumidor completa: Também existe o risco da contaminação que pode ocorrer por meio de insetos ou até mesmo por meio do vento: é o caso do milho. Assim, se não existir um espaçamento adequado entre as lavouras transgênicas e convencionais, a contaminação pode ocorrer, pegando de surpresa o agricultor no momento da venda. Ocorre com frequência a perda de contrato desses agricultores, já que o comprador estava interessado em um produto não transgênico.
Os riscos dos produtos geneticamente modificados para a saúde
Segundo o Idec, são vários e graves os riscos potenciais, tendo os cientistas apontado como os principais deles:
Risco 1: Aumento das alergias
Quando se insere um gene de um ser em outro, novos compostos podem ser formados nesse organismo, como proteínas e aminoácidos. Se este organismo modificado geneticamente for um alimento, seu consumo pode provocar alergias em parcelas significativas da população, por causa dessas novas substâncias. Por exemplo, no Instituto de Nutrição de York, Inglaterra, em 1999, uma pesquisa constatou o aumento de 50% na alergia a produtos à base de soja, afirmando que o resultado poderia ser atribuído ao consumo de soja geneticamente modificada.
Outra preocupação é que se o gene de uma espécie que provoca alergia em algumas pessoas for usado para criar um produto transgênico, esse novo produto também pode causar alergias, porque há uma transferência das características daquela espécie. Foi o que aconteceu nos Estados Unidos: reações em pessoas alérgicas impediram a comercialização de uma soja que possuía gene de castanha-do-pará (que é um famoso alergênico).
Risco 2: Aumento de resistência aos antibióticos
Para se certificar de que a modificação genética “deu certo”, os cientistas inserem genes (chamados marcadores) de bactérias resistentes a antibióticos. Isso pode provocar o aumento da resistência a antibióticos nos seres humanos que ingerem esses alimentos. Em outras palavras, pode reduzir ou anular a eficácia dos remédios à base de antibióticos, o que é uma séria ameaça à saúde pública.
Risco 3: Aumento das substâncias tóxicas
Existem plantas e micróbios que possuem substâncias tóxicas para se defender de seus inimigos naturais, os insetos, por exemplo. Na maioria das vezes, não fazem mal ao ser humano. No entanto, se o gene de uma dessas plantas ou de um desses micróbios for inserido em um alimento, é possível que o nível dessas toxinas aumente muito, causando mal às pessoas, aos insetos benéficos e aos outros animais. Isso já foi constatado com o milho transgênico Bt, que pode matar lagartas de uma espécie de borboleta, a borboleta monarca, que é um agente polinizador. Sequer a toxicidade das substâncias inseridas intencionalmente nas plantas foi avaliada adequadamente. Estas substâncias estão entrando nos alimentos com muito menos avaliação de segurança que qualquer aditivo, corante, pesticida ou medicamento.
Risco 4: Maior quantidade de resíduos de agrotóxicos
Com a inserção de genes de resistência a agrotóxicos em certos produtos transgênicos, as pragas e as ervas-daninhas poderão desenvolver a mesma resistência, tornando-se “super-pragas” e “super-ervas”. Por exemplo, a soja Roundup Ready tem como característica resistir à aplicação do herbicida Roundup (glifosato). Consequentemente, haverá necessidade de aplicação de maiores quantidades de veneno nas plantações, o que representa maior quantidade de resíduos tóxicos nos alimentos que nós consumimos. No Brasil, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) autorizou em 2004 o aumento em cinquenta vezes do limite de glifosato permitido em alimentos a base de soja. Os prejuízos para o meio ambiente também serão graves: maior poluição dos rios e solos e desequilíbrios incalculáveis nos ecossistemas.
Risco 5: Prejuízos para o Meio Ambiente
Os perigos que os transgênicos podem oferecer ao meio ambiente são muitos. A inserção de genes de resistência a agrotóxicos em certos produtos transgênicos faz com que as pragas e as ervas-daninhas (inimigos naturais) desenvolvam a mesma resistência, tornando-se “super-pragas” e “super-ervas”.
Por exemplo, a soja Roundup Ready tem como característica resistir à aplicação do herbicida Roundup (glifosato). Isso vai exigir a aplicação de maiores quantidades de veneno nas plantações, com maior poluição dos rios e solos. Haverá ainda desequilíbrios nos ecossistemas a partir da maior resistência desenvolvida, ao longo dos anos, pelas pragas e ervas-daninhas.
Para o Brasil, detentor de uma biodiversidade ímpar, os prejuízos decorrentes da poluição genética e da perda de biodiversidade são outros graves problemas relacionados aos transgênicos.
Métodos de cooptação de cooperativas agrícolas
No estudo do Grupo ETC são relatados os métodos utilizados pelas transnacionais para cooptar cooperativas agropecuárias para fazer a distribuição das suas sementes e, à medida que as empresas de sementes vão sendo compradas e o mercado dominado, colocar à venda apenas a semente com a qual terão mais lucro: Aqui no Brasil, muitas vezes, os agricultores iam comprar as sementes convencionais e não as encontravam mais, ou as encontravam em quantidades muito pequenas, o que os obrigava a, não tendo outra opção, comprar as sementes que, por exemplo, a Monsanto impunha no mercado, relata o documento.
Então, essa imposição do pacote tecnológico, a imposição da transgenia, se deu a ferro e fogo. Quando os agricultores se deram conta, haviam entrado em um caminho sem volta”. No Brasil, essas transnacionais compraram praticamente todas as pequenas e médias empresas de sementes, além de dominarem a cadeia agroalimentar desde a produção de sementes, agroquímicos e agrotóxicos até a parte de logística, transporte e exportação. Os agricultores hoje no Brasil estão submetidos aos interesses dessas transnacionais.
“Isso é um problema grave para um país que quer ter soberania alimentar e condições melhores de produção para garantir alimentos de qualidade à população”, diz Darci Frigo, advogado da organização socioambientalista Terra de Direitos. Nesses dez anos de reinado transgênico no país, diz Frigo, a perda da diversidade alimentar já é realidade: “Essas empresas vêm homogeneizando a dieta com poucos produtos. Basicamente, aqueles produtos que interessam a elas do ponto de vista da aplicação de determinados agrotóxicos ou outros insumos, com a chamada venda casada”.
Pesquisadores cooptados para a destruição da lavoura convencional
A captura dos agricultores é também apontada pelo pesquisador Paulo Brack, professor do Instituto de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS): “Se você falar com um agricultor gaúcho sobre a opção de não plantar transgênicos, ele simplesmente vai te dizer que não existe mais semente convencional. O mercado foi tomado pelas sementes transgênicas. Hoje, ele está dominado, e você não tem nem mais a alternativa de plantar culturas convencionais. Isso é um escândalo, porque vai contra a economia do próprio agricultor, que perde a possibilidade de fazer a sua própria semente e tem de pagar royalties para as empresas. O círculo está se fechando, e o governo deveria resguardar, no mínimo, a possibilidade de produção de sementes convencionais e sementes crioulas”, diz dentro da matéria do Repórter Brasil.
É lembrado que uma das mais conhecidas peças de denúncia sobre os métodos utilizados pelas gigantes do setor de transgenia, o livro e o filme “O mundo segundo a Monsanto”, ambos da francesa Marie-Monique Robin, relatam a trajetória histórica da empresa americana, desde o seu envolvimento nas pesquisas sobre a bomba atômica (que acabou jogada sobre os civis japoneses nos anos 1940) e a criação do agente laranja (utilizado para matar civis na guerra do Vietnã nos anos 1960) até sua chegada à tecnologia transgênica e ao novo papel de “empresa agrícola” nos anos 1990.
No Brasil, o método básico de ação das Gene Giants para consolidar a posição de seus produtos no mercado também alia a pressão sobre os agricultores à tentativa de influenciar setores estratégicos da administração pública: “Há uma influência muito grande no direcionamento da pesquisa (na busca de pesquisadores que se aliam à devastação do plantio tradicional, em troca de dinheiro) e também no âmbito do Congresso Nacional e do financiamento das campanhas eleitorais. Isso determina que os temas de interesse das empresas de biotecnologia acabem entrando na lógica do parlamento. A bancada ruralista presta serviço à transgenia, apesar de os agricultores serem dominados pelo cartel formado por essas empresas, porque os parlamentares recebem apoio para suas campanhas eleitorais”, diz Darci Frigo.
Segundo o dirigente da Terra de Direitos, é tanta a força das gigantes da transgenia no Brasil atualmente que elas até mesmo reduziram sua propaganda: “As empresas abandonaram o discurso de que transgênico diminui o uso de agrotóxicos porque já estabeleceram seu domínio sobre os agricultores e o mercado, e agora ninguém mais vai discutir essa diminuição. As autoridades não questionam e o Ministério da Agricultura não se estrutura para fazer uma real fiscalização do que acontece no terreno. É grande a influência dessas empresas por meio da pressão sobre os parlamentares ou por meio das ações de cooptação dos órgãos responsáveis pela fiscalização, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), para liberar agrotóxicos, ou a CTNBio, para liberar transgênicos”, diz Frigo.