A busca pelo entendimento de como as universidades brasileiras podem criar possibilidades, propostas e resoluções para enfrentar as diversas violências às quais a comunidade acadêmica está suscetível motivou a elaboração do boletim jurídico nacional Violências nas universidades: o acolhimento às vítimas e enfrentamento às violências de gênero e raça. Coordenado pelo programa de extensão Fordan: cultura no enfrentamento às violências, o documento (anexado abaixo) trata da importância de os gestores universitários realizarem o acolhimento às vítimas e serem ponto de apoio no enfrentamento às violências institucionais.
O boletim apresenta 14 textos transcritos de palestras que aconteceram no Simpósio Nacional sobre Ensino Superior, realizado em formato on-line em abril de 2022 e atualizado em março de 2023. Os artigos que constam no documento tratam de racismo, LGBTQIA+fobia, xenofobia e violência contra as mulheres nos cursos de graduação e pós-graduação, e são assinados por representantes do Ministério Público, Defensoria Pública, movimentos organizados, professores de universidades públicas e privadas, Fordan e profissionais de comunicação de estados como Espírito Santo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia.
“A sequência de textos deste boletim nacional foi organizada considerando a necessidade de as universidades fazerem a escuta de profissionais que possuem um acúmulo de experiência em acolhimento das vítimas e enfrentamento das violências”, explica a coordenadora do Fordan, Rosely Pires. Segundo ela, o programa de extensão tem trabalhado em rede, visando à ampliação de debates e à promoção de ações efetivas: “O trabalho em rede é fundamental para mudar a política pública”.
Acolhimento
Pires ressalta que problemas como racismo, misoginia e homofobia não estão presentes apenas nas universidades: “Temos sérios problemas em outros espaços públicos e privados também, eles estão na estrutura da sociedade. A questão é como esta instituição está preparada para acolher a vítima e enfrentar essas violências”.
O presidente estadual da União de Negras e Negros pela Igualdade (Unegro/ES), Welington Barros, avalia que o racismo epistêmico se manifesta quando há limitações para o acesso e permanência de estudantes negros nas universidades e quando o conhecimento produzido por eles é desconsiderado. Por isso, segundo Barros, o letramento racial torna-se importante e “profundamente educador”, tanto para negros quanto para não negros. “Nós, da Unegro, atuamos politicamente pela superação do racismo, em conjunto com a luta de classes e a superação do machismo. Neste sentido, a Unegro/ES é parceira do Fordan”, sentencia.
Para o assessor jurídico do Fordan, Arthur Rodrigues, é necessário repensar as experiências de órgãos especializados, como pró-reitorias, ouvidorias e grupos de extensão. “É preciso trazer tanto a comunidade em relação à universidade, mas também a universidade em relação aos problemas que vivencia a comunidade periférica e em estado de pobreza, com foco na criação de comissões permanentes com participação paritária que fujam desses processos internos tradicionais que as universidades já detêm, com garantia de funcionamento efetivo”, analisa ele.
Comissões
A presidente da Comissão Permanente de Direitos Humanos da Ufes, Brunela Vincenzi, lembra que a Instituição possui uma forma de ingresso diferenciada, que possibilita a entrada de comunidades de imigrantes e refugiados desde 2011, além de ter um sistema de cooperação com países do sul global, cujo objetivo é oferecer oportunidade de formação superior a cidadãos de países em desenvolvimento com os quais o Brasil mantém acordos educacionais e culturais. “São estudantes negros e estrangeiros, que entram na Universidade com uma dupla vulnerabilidade”, diz.
Vincenzi cita, ainda, a Comissão de Estudos e Recebimento de Solicitações para Mediação de Conflitos e Melhoria das Relações de Trabalho e Prevenção do Assédio Moral, instituída em 2018 pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe/Ufes) a pedido dos trabalhadores técnicos da Ufes: “Ela existe, ela funciona, ela tem capacidade até de abrir processos, mas não tem capacidade jurídica de condenações. Ela encaminha esses processos para determinadas instâncias da Ufes”.
O boletim jurídico nacional foi produzido em parceria com o Fórum Nacional de Mulheres Negras (FNMN), Unegro/ES, Revista Direito e Feminismos e Instituto Baiano de Direito e Feminismos (IBADFEM). A íntegra do documento pode ser acessada no arquivo anexo, no fim do texto.