Entidades da Guiana Francesa, onde há cerca de 500 garimpos ilegais e com 10 mil garimpeiros brasileiros clandestinos, que estão fugindo da ação de repressão empreendida pelo governo brasileiro, decidiram processar a França pela ineficácia na repressão. As entidades Association des victimes du mercure – Haut-Maroni , Wild & Legal e Association Solidarité Guyane entraram na última semana com ação judicial contra o governo francês por “omissão culposa na proteção da saúde dos cidadãos e de seus ecossistemas”.
Sob o título “Nossa ação legal sem precedentes para a defesa dos direitos da Amazônia francesa”, as entidades emitiram um manifesto. “Desde o início dos anos 90, a região da Guiana Francesa passou pelo desenvolvimento frenético de garimpo (extração de ouro) em seu território e pela proliferação descontrolada de locais clandestinos. Existem mais de 500 em toda a Guiana e nada menos que 114 no Parque Amazônico da Guiana. Mais de 13 toneladas de mercúrio por ano e mais de 7.000 toneladas de lama por dia são lançadas nos rios da Guiana”, alertaram.
O rio Maroni se encontra entre o Suriname e a Guiana Francesa, esta última uma colônia da França na América do Sul vizinha ao Brasil, e deságua no Oceano Atlântico. Desde 2006, a França proibiu o uso do mercúrio para o garimpo na Guiana, “mas ele continua a envenenar a vida dos indígenas”, afirma Pierre Havard, presidente da associação Solidarité Guyane, ao site da FranceInfo. Análises realizadas em 2023 “confirmam a persistência de taxas intoleráveis”, completou.
Ação inédita
O coletivo também destaca que “a ação é inédita” e que o Estado deve “acabar com sua omissão culposa” quanto à “proteção da saúde de seus cidadãos, mas também de seus ecossistemas”. As associações requerentes pedem “um reforço drástico” nas medidas de luta contra o garimpo ilegal.
As associações se baseiam “em antecedentes judiciais” na França e em outros países. Em 2012, o Tribunal de Cassação reconheceu pela primeira vez a existência de danos ecológicos causados pela Total à costa da Bretanha, região no noroeste da França, após o naufrágio do petroleiro Erika.
Como a natureza pode ser reconhecida como vítima de seu próprio preconceito, logicamente, o juiz deve deduzir que a natureza já é implicitamente um sujeito da lei, incluindo o direito à integridade e à saúde deve agora ser explicitamente protegido, alegam as entidades no manifesto.
Para Marine Calmet, presidente da Wild Legal, “diante da falha defeituosa do estado, queremos que o juiz aproveite a oportunidade de nosso apelo para estabelecer explicitamente a existência dos direitos da natureza que são violados aqui, e em particular que o rio Maroni e seus afluentes têm direitos fundamentais, em particular o direito à saúde pelo qual o Estado deve ser o garante, assim como deve garantir o direito a um ambiente saudável para seu povo”.