O partido Solidariedade pede ao STF que a Lei das Bets seja declarada inconstitucional, por violação aos seguintes preceitos magnos como a proteção à dignidade da pessoa humana, proteção ao valor social do trabalho e à livre iniciativa e ao direito à saúde
O partido Solidariedade ingressou no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a Lei 14.790/2023, conhecida como a “Lei das Bets”, foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 30 de dezembro do ano passado. O partido sustenta que a lei não cumpriu seus objetivos de prevenir os danos causados pelas apostas on-line.
Segundo Nota Oficial divulgada pelo Solidariedade, assinada pelo seu presidente, Paulinho da Força, estudos e levantamentos recentes demonstram que a aplicação efetiva da lei aumentou exponencialmente o endividamento das famílias e o comportamento de risco associado ao jogo compulsivo, além de diminuir o poder de compra e a circulação de renda, afetando inclusive programas sociais voltados aos mais vulneráveis financeiramente.
“Assim, a lei viola frontalmente a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho, a livre iniciativa e o direito social à saúde, todos resguardados pela Constituição Federal de 1988”, diz o Solidariedade em sua nota. O partido requereu a concessão de uma medida cautelar para sustar a eficácia da Lei n.º 14.790/23, suspendendo-se, com isso, a realização de jogos de apostas online em território brasileiro. No mérito, requer seja declarada inconstitucional a integralidade da Lei 14.790/23.
Na ADI, assinada por sete advogados, são citados o crescimento do volume de apostas on-line.
- “Volume de apostas esportivas foi estimado entre R$ 60 e 100 bilhões em 2023: Com crescimento de 89% ao ano entre 2020 e 2024, estima-se um desembolso de R$ 40 a R$ 50 bilhões em 2023 com apostas esportivas (41 vezes o que se gasta com ingressos de futebol, 12 vezes o que se gasta com cinema, ou 3,5 vezes o que se gasta com games, por exemplo). O número de empresas que atuam no setor no país passa atualmente de 400 e segue crescendo’, assina o Solidariedade”;
- “A maioria dos apostadores são homens, jovens e de classe média baixa: 40% dos apostadores são da classe D e E. Segundo dados de um levantamento do Instituto Locomotiva realizado em setembro de 2023, mais de 30% da população de baixa renda já fez alguma aposta esportiva e 21% desse público ainda não conhece a modalidade, destacando o potencial de crescimento dessa forma de entretenimento para os consumidores. A principal motivação declarada pelos apostadores é ‘ganhar dinheiro’, mas apenas 23% relatam que conseguiram ganhar mais do que perderam com apostas”;
- “As apostas já representam 1,38% do orçamento familiar nas classes D/E: No orçamento médio familiar, elas representavam 0,73% em 2023 – 4,9% do que é gasto em alimentação (1,5% em 2018) e 36% em lazer e cultura (10% em 2018). Em 2018, esses números eram 0,22% na média Brasil, e 0,27% para classes D/E, o que mostra aumento de 3 a 4 vezes em apenas 5 anos. Para referência, gastos com lazer e cultura representam 1,84% do orçamento familiar na média Brasil, 1,49% nas classes D/E”.
- “Em 2024, as apostas podem chegar a 5,5% do valor das despesas com alimentação: Potenciais impactos das apostas incluem gastar menos com despesas discricionárias, como lazer, vestuário, higiene/beleza e até alimentação. Essas atividades podem aumentar o interesse por outras relacionadas (ex.: ingressos esportivos ou assinaturas para acompanhar os jogos pela TV), impulsionando suas receitas. As cotas de patrocínios, por exemplo, têm sido favorecidas pelas empresas de apostas esportivas, que vêm dominando os espaços publicitários do futebol no Brasil”;
- “A maioria dos jogadores têm a percepção de que perderam mais dinheiro do que ganharam ao longo de várias apostas, apesar da principal motivação ser o lucro. Segundo o Instituto Locomotiva, apenas 36% dos que já ganharam dinheiro com apostas usam o valor com outros gastos. Isso reforça a percepção de que grande parte do turnover (valor total de apostas realizadas) fica dentro do ecossistema das apostas e não volta para a economia para ser gasto em outros setores de consumo”.
Bolsa Família
A falta de regras para uso do dinheiro público, destinados pelo Governo Federal para famílias carentes, e que deveriam ser utilizados para a compra de alimentos, roupas, remédios e transporte, é citada na ADI:
“Neste sentido, relatório divulgado pelo Banco Central no dia 24/09/2024, que revelou que beneficiários do Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões em sites de apostas esportivas, somente no mês de agosto. O valor equivale a 21,2% dos recursos distribuídos pelo programa no mesmo mês”, destaca o partido na sua ação em tramitação no STF.
E completa: “O montante foi desembolsado por membros de 5 milhões de famílias com direito ao benefício social. Entre eles, 4 milhões são chefes de família, ou seja, aqueles que recebem diretamente a renda do governo. Só estes enviaram R$ 2 bilhões (67% do volume total) por Pix para as bets em agosto. E mais: trata-se de quadro negativo não só para os apostadores e familiares, mas para toda a economia nacional.”
A ADI ainda cita dados divulgados pelo Banco Itaú: “Segundo o Banco Itaú, o apostador brasileiro perdeu, no balanço entre vitórias e derrotas com bets, R$ 23,9 bilhões entre junho de 2023 e o mesmo mês em 2024. O jogador pagou, segundo o estudo, R$ 68,2 bilhões em apostas e taxas de serviço e recebeu de volta R$ 44,3 bilhões.”
E o partido completa: “É óbvio que tal desvio de recursos reduz a poupança interna e a capacidade de investimentos. Não por acaso, a Confederação Nacional do Comércio (CNC) revisou para baixo a projeção de crescimento do setor varejista em 2024, ajustando de 2,2% para 2,1%. A mudança reflete o impacto negativo causado pelo aumento descontrolado das apostas on-line, que tem comprometido a renda das famílias e redirecionado o consumo para jogos de azar, em vez de bens e serviços essenciais.”
E arremata: “Com mais de R$ 68 bilhões gastos em apostas entre 2023 e 2024, o setor varejista enfrenta potencial redução de até 11,2% no faturamento, o que representa uma perda de R$ 117 bilhões por ano. Apenas no primeiro semestre deste ano, a estimativa é que os cassinos on-line já retiraram R$ 1,1 bilhão do comércio. E no primeiro semestre de 2024, aproximadamente 1,3 milhão de brasileiros já têm dívidas em atraso em razão dos cassinos on-line, muitos dos quais utilizam o cartão de crédito sem controle.”
Leia a seguir a íntegra da ADI, em arquivo PDF:
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