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Rios secam em todo o mundo e oceanos se elevam com as mudanças climáticas


Além disso, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) assinala que os níveis de água subterrânea também estiveram abaixo do normal em 2023


Rios secam em todo o mundo e oceanos se elevam com as mudanças climáticas. O sistema capitalista, que promove a destruição do planeta em busca de dinheiro, é questionado por professores da UFRJ | Imagens: Reprodução

O novo relatório Estado dos Recursos Hídricos Globais 2023 da Organização Meteorológica Mundial (OMM) assinala que o descaso da humanidade com o planeta, ao prosseguir com a sua destruição, está fazendo com que os rios venham a secar e o nível dos oceanos a subir. O aumento da água nos oceanos decorre do derretimento das geleiras, inclusive na Antártida, o polo Sul e na Groelândia.

Em 2023, os glaciares perderam mais de 600 gigatonelada (GT) de água, ou 600 trilhões de toneladas de água).” A maior perda de massa registada nas últimas cinco décadas. Isto representa cerca de 100 GT a mais do que em qualquer outro ano registado desde 1976, o equivalente a 1,7 mm de contribuição para o aumento médio global do nível do mar”, diz o relatório da OMM na sua página 27.

“Depois de 2022, 2023 é o segundo consecutivo ano em que todas as regiões glaciares do mundo registaram perda de gelo. As estimativas globais da perda anual de massa dos glaciares são bons indicadores da Contribuição Anual dos glaciares ao aumento global do nível do mar. Desde a década de 1990, a perda de gelo tem vindo a aumentar em quase todas as regiões e acelerou consideravelmente depois de 2000.92, isto deve-se principalmente ao fato de as regiões apresentarem consistentemente um degelo de Verão maior do que acumulação de inverno após a década de 1990”, completa o documento.

Alterações de massa anuais e sazonais nas gigatoneladas (Gt) de 1976 a 2023 para as 19 regiões glaciares GTNG | Imagem: OMM

Brasil, Argentina e Uruguai

Os dados do estudo da OMM são do ano passado e ainda não entraram as fortes secas nos rios brasileiros, que estão ocorrendo neste ano. Na página 32, o estudo observou que as secas que ocorreram no Brasil, Argentina e no Uruguai. “No Brasil, a Amazônia viu abaixo do normal, com precipitação em oito Estados com a menor precipitação de julho a setembro em mais de 40 anos, principalmente no dia 26 de outubro”, inicia a análise.

“O Rio Negro em Manaus registou o nível mais baixo desde 1902, com níveis de água atingindo 12,70 metros. A região amazônica sofreu uma perda de armazenamento entre 2022 e 2023, resultando na seca mais longa alguma vez registada na bacia. Na porção Sudeste do Brasil observou-se uma perda de armazenamento nos poços de monitorização com uma provável origem no padrão de precipitação induzido por La Niña. Um dipolo de anomalias entre o Nordeste e o Sudoeste.127”

Na Argentina o levantamento da OMM garante que houve uma redução de 3% do PIB argentino em 2023. “De agosto de 2022 a março de 2023 na Argentina, a precipitação foi de 20% a 50% abaixo do normal grande parte das regiões norte e centro, marcando o quarto ano consecutivo de precipitação reduzida. O Uruguai enfrentou níveis de armazenamento de água criticamente baixos, afetando a água abastecimento em Montevidéu e noutros grandes centros.”

Com o derretimento do gelo, a Antártida está ficando verde, com o surgimento de vegetação no lugar das geleiras | Foto: Reprodução

Condições anormais

O estudo destaca que 50% das áreas globais de captação de água subterrânea apresentaram condições anormais. A maioria foi de um déficit idêntico às situações ocorridas nos anos 2022 e 2021. Entre as regiões mais caracterizadas por seca severa e condições de baixa vazão de rios estão os grandes territórios da América do Norte, Central e do Sul. A situação inclui níveis recordes de água abaixo da média nos rios Amazonas e Mississippi.

Ainda do território brasileiro ficaram registros de casas flutuantes e barcos encalhados no leito seco do lago Puraquequara por causa da seca severa ocorrida em outubro de 2023. O caso de Moçambique está entre os eventos hidrológicos de alto impacto que mais marcaram África. A passagem do ciclone Tropical Freddy causou 165 mortes e milhões de dólares em perdas após descargas fluviais acima e muito acima do normal.

Já na Ásia e na Oceania, as grandes bacias dos rios Ganges, Brahmaputra e Mekong conheceram condições abaixo do normal em quase todos os territórios. As alterações do clima estariam mudando o curso da água provocando inundações e secas extremas num ano confirmado como o mais quente.

Os níveis baixos dos rios e secas enfrentadas pelos países foram seguidos por inundações arrasadoras. A OMM revela ainda que essas situações extremas também foram influenciadas pela passagem dos fenômenos La Niña para El Niño em meados de 2023.

A seca nos rios da Amazônia é a pior desde 1902 | Foto: Rafa Neddermeyer/Agência-Brasil

Reservatórios abaixo do normal

O relatório enfatiza ainda a situação de estresse severo observado no abastecimento global de água, com cinco anos consecutivos de fluxos de rios e influxos de reservatórios abaixo do normal.

Para a secretária-geral da OMM, Celeste Saulo, os níveis hídricos baixos “se tornam o indicador mais revelador do tempo de angústia climática” atual. Ainda assim, ela destaca que a sociedade global não tem tomado medidas para proteger essas reservas.

Saulo ressaltou que um dos principais fatores de mudança dos ciclos da água são as mudanças climáticas e pediu maior monitoramento hidrológico para rastrear e responder às mudanças. A agência das Nações Unidas destaca haver 3,6 bilhões de pessoas com acesso inadequado à água por pelo menos um mês por ano. Esse total deve aumentar para 5 bilhões até 2050.

Em Santa Leopoldina (ES), o Rio Santa Maria da Vitória, que abastece a Grande Vitória, é um exemplo da redução. No comparativo entre 1930 e 2024. Foto à direita, tirada neste mês, mostra que o meio do rio não cobre os pés das crianças | Imagens: Arquivo GN

Escassez hídrica ainda maior este ano

O diretor de hidrologia da OMM, Stefan Uhlenbrook, disse que uma escassez hídrica ainda maior está prevista para este ano em partes do mundo onde foram relatados novos recordes de calor. A situação extrema de 2023 também acelerou a perda de massa de geleiras do mundo que alcançou 600 gigatoneladas de água. O nível é considerado um dos maiores em 50 anos.

Os níveis de água subterrânea estiveram abaixo do normal no sul da Europa, incluindo em Portugal, Espanha, na maior parte da França e na Europa Central. No verão, as geleiras da Europa e do Cáucaso mostraram tendências de equilíbrio ligeiramente reduzidas em 2023, tal como em anos anteriores. Os rios alimentados por águas originárias de geleiras como as da Europa e Escandinávia tiveram altos fluxos. Com o desaparecimento das geleiras nos próximos anos prevê-se uma situação ainda mais dramática.

O sistema capitalista e a destruição do planeta

A busca desenfreada de dinheiro e lucro do sistema capitalista, com desmatamento desenfreado, poluição ambiental e sem se importar com as consequências no planeta, está sendo coloca em xeque por três pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Karine Oliveira das Neves, Michele Mezari Oliveira e Gildo Volpat escreveram um artigo cientifico neste ano para a Revista Teia, da UFRJ, intitulado “História, capitalismo e mudanças climáticas”, onde analisaram a relação do capitalismo e a destruição do planeta, chamada de “mudanças climáticas.”

Nas considerações finais, destacam que “as mudanças climáticas já estão ocorrendo e podem ser evidenciadas pelas imagens do degelo das calotas polares, furacões, desertificação, excesso de gás carbônico na atmosfera, inundações e terremotos. No entanto, mesmo com tantas evidências, há negacionistas, que não acreditam ou dizem não acreditar (a fim de satisfazer grupos políticos e grandes empresas exploradoras do ambiente) nas mudanças climáticas causadas pelos humanos.”

“O documentário Before the Food (2016), de maneira discreta, aponta o efeito do capitalismo no estilo de vida e no consumo exagerado e alerta sobre a necessidade de mudanças de nossas ações individuais e coletivas. Ademais, sugere a implementação de políticas públicas que auxiliem na conscientização sobre a importância da preservação e da recuperação do que foi devastado de forma inconsequente. Ainda, adverte quando mostra que as paisagens naturais e estonteantes também estão sendo vítimas de todo esse processo de mudanças do clima, além de trazer opiniões de pesquisadores sobre as atitudes que o ser humano deve adquirir a fim de mitigar os efeitos das alterações climáticas”, prosseguem os autores.

E finalizam: “Além disso, é prudente ressaltar que, se não mudarmos nosso estilo de vida e os princípios nocivos estimulados pela sociedade capitalista, de competição, produção, acumulação e consumo, podemos estar no caminho da extinção de nossa espécie e de todas as outras.”

Sofismo ao chamar a destruição do planeta de “mudanças climáticas?

O termo “mudanças climáticas” é questionado por ser uma forma suave de chamar a destruição do planeta provocada pelo ser humano, que engajado no sistema capitalista, se interessa apenas por dinheiro e lucro. A falta de interesse em estancar imediatamente as emissões que provocam o efeito estufa ou criminalizar com severidade quem destrói as matas, fica mais fácil de ser chamada de “mudanças climáticas.” Chamar a destruição do planeta de “mudanças climáticas” é como se fosse falar de algo alheio à vontade da espécie humana, como se fosse um acontecimento climático gerado pelo próprio planeta.

Os dicionários definem sofismo ou sofisma como sendo “um pensamento ou retórica que procura induzir ao erro, apresentada com aparente lógica e sentido, mas com fundamentos contraditórios e com a intenção de enganar.” Atualmente, um discurso sofista “é considerado uma argumentação que supostamente apresenta a verdade, mas sua real intenção reside na ideia do erro. Seria, então, motivado por um comportamento capcioso, numa tentativa de enganar e ludibriar”, garante os dicionários.

Etimologicamente, sofismo deriva do grego sophisma, em que sophia ou sophos significam respectivamente “sabedoria” e “sábio”. Esta palavra passou a denotar todo tido de conhecimento sobre os assuntos humanos gerais. Os sofistas da Grécia Antiga eram conhecidos por serem importantes professores. Viajavam pelas cidades e ensinavam aos seus alunos a arte da retórica, que era muito importante para quem desejasse seguir na vida política.

O sistema capitalista e a destruição do planeta | Imagem: Reprodução/YouTube

O capitalismo e a crise ambiental

Em 2018, o acadêmico Frederico Seifert dos Santos defendeu uma dissertação de Mestrado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) intitulada “Mudanças climáticas e Marx: o fetichismo do carbono e os sistemas de comercialização de emissões.”  No resumo, ele diz: “A crise ambiental é um dos temas que mais influência debates sobre as consequências do capitalismo para o planeta”, inicia.

“Contudo, a maior parte dos(as) envolvidos(as) nessas discussões têm assumido uma posição pró-status quo – uns contestadores, mas sem romper de maneira definitiva com as premissas do sistema capitalista; outros de maneira consciente, como a Economia Ambiental, que adota uma postura reformista. Assim, as ações com maior respaldo propostas para sanar os problemas na relação humanidade e meio ambiente são invariavelmente aquelas alinhadas a uma economia de mercado, como os mercados de carbono”, prossegue.

“Estes esquemas, que viabilizam que agentes econômicos transacionem permissões para emitir gases de efeito estufa (GEE), são encarados como ‘solução final’ para a crise ambiental e embutem alguns fundamentos: a redução desta crise às mudanças do clima; a transformação de todas as dimensões da crise em uma única – a econômica – e, consequentemente, de todos seus aspectos qualitativos em quantitativos; e o revestimento de todo o debate com um caráter técnico e apolítico”, completa.

Serviço:

1) Faça download do Relatório Estado dos Recursos Hídricos Globais 2023 da Organização Meteorológica Mundial (OMM), em arquivo PDF e no idioma inglês, clicando neste link.

2) Leia a íntegra do artigo “História, capitalismo e mudanças climáticas”, publicado na Revista Teia, da UFRJ, clicando neste link

3) Tese de dissertação de Mestrado “Mudanças climáticas e Marx: o fetichismo do carbono e os sistemas de comercialização de emissões”, do acadêmico Frederico Seifert dos Santos, clique neste link.  

A seguir leia a íntegra do Relatório Estado dos Recursos Hídricos Globais 2023 da Organização Meteorológica Mundial (OMM), no idioma inglês e em arquivo PDF:

Relatorio-Estado-dos-Recursos-Hidricos-Globais-2023-da-Organizacao-Meteorologica-Mundial-OMM