A Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do ES vai realizar audiências públicas no interior capixaba, para que a população opine sobre a privatização das Unidades de Conservação, os parques públicos estaduais. A concessão por 35 anos, idealizada para empresários ganharem dinheiro explorando os parques estaduais, foi feita sem a oitiva da população, dizem deputados
A proposta de privatização de seis Unidades de Conservação (UCs) do Espírito Santo, conhecidas como parques públicos estaduais foi feita às portas fechadas, dentro do Palácio Anchieta e longe da população impacta com os riscos à fauna e a flora dessas áreas de propriedade da população capixaba. Essa é a conclusão da Audiência Pública realizada nesta última quarta-feira (30), na Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales).
O presidente regional do União Brasil e ocupante do cargo de secretário de Estado do Meio Ambiente do Governo Renato Casagrande (PSB), Felipe Rigoni, reconheceu que todas as decisões, inclusive a de privatizar (que ele chama de concessão), foi feita sem ouvir a população em audiências públicas. Ele chegou a afirmar que pretende promover audiências somente ás vésperas de enviar as unidades para leilão na Bolsa de Valores de São Paulo, o que foi duramente contestado na reunião.
A direção da Assembleia Legislativa, aliada do governador Renato Casagrande (PSB), cortou a transmissão da Audiência Pública que seria feita pela TV Ales no YouTube e não foi dada uma satisfação ao presidente do colegiado, deputado Gandini (PSD). O parlamentar disse que havia recebido a confirmação de que seria feita a transmissão. A ação da direção do Legislativo estadual prejudicou as pessoas interessadas em ver os debates de cidades do interior do Espírito Santo, de outros Estados e até de outros países.
Privatização foi decidida sem conhecimento da Ales
O deputado estadual Fabrício Gandini (PSD) fez questão de frisar que é contra a cobrança por visitação. “Não acho que esse deve ser um critério adotado. A visitação tem de ser gratuita. Não cabe a gente passar a cobrar para visitar os parques, porque é um bem da população”, declarou. Ele também pontuou que o tópico foi pouco discutido: “A Assembleia, por exemplo, não recebeu nenhuma informação em relação ao assunto. Então, a ideia é ouvir, entender qual a proposta de fato e discutir com a sociedade”, explicou Gandini.
Diante de um projeto de privatização feito às portas fechadas, o presidente da Comissão de Meio Ambiente da Ales, deputado estadual Fabricio Gandini (PSD), disse em nota enviada a imprensa o seguinte:
- “A audiência pública promovida pela Comissão de Proteção ao Meio Ambiente vai discutir a concessão do Parque Estadual da Pedra Azul, em Domingos Martins; Parque Estadual Paulo César Vinha, em Guarapari; Parque Estadual Cachoeira da Fumaça, em Alegre e Ibitirama; Parque Estadual Itaúnas, em Conceição da Barra; Parque Estadual Forno Grande e Parque Estadual Mata das Flores, ambos em Castelo.”
O que disse Rigoni
Logo após a abertura da Audiência Pública pelo presidente da Comissão, Gandini, a deputada Iriny Lopes (PT) leu a ordem do dia do colegiado e foi passada a palavra para o dirigente regional do União Brasil e secretário de Estado do Meio Ambiente, Felipe Rigoni. Ele iniciou a sua fala justificando a privatização, alegando que o Estado não tem como cuidar da fiscalização de combate a incêndios florestais, medida essa que já foi combatida pelo Sindipublicos, que alega não haver interesse em fazar concurso público e há propositalmente falta de funcionários.
Ele ainda disse que foi contratada uma outra empresa internacional, sem citar os valores de recursos públicos pagos e cuja contratação não foi divulgada pelo Governo do Estado. Segundo Rigoni essa empresa foi contratada para informar sobre os “potenciais” de cada parque público a ser privatizado. Depois foi feita a contratação, sem licitação pública, de outra empresa de consultoria internacional, a empresa de consultoria Ernst & Young Assessoria Empresarial Ltda, pelo valor de R$ 8.606.250,00.
ES contratou consultoria que desconhece área ambiental
“Para mim chamou muita atenção o procedimento de um projeto que não tem sustentação jurídica. Contrataram uma consultoria que não é da área ambiental por R$ 8 milhões. Tenho certeza que o resultado dessa Audiência Pública será um divisor de águas”, disse Iriny Lopes. Segundo a deputada, a Ernst & Young Assessoria Empresarial Ltda “é uma consultoria para desenvolvimento de projetos com fins lucrativos.”
Iriny cobrou do representante do Governo do Estado de onde foi tirado esses R$ 8,6 milhões de dinheiro público. “Mas, qual o motivo de contratar essa consultoria se esse projeto tem um problema de origem insanável. Vocês, literalmente, passaram por cima do Artigo 255 da Constituição Federal e de lei estadual. Não é eu apresentar um projeto para a área que está constitucionalmente como de preservação. Antes de qualquer consulta, de qualquer projeto, teria que ter a oitiva deliberativa constantes nesses artigos e nessa legislação.
O que diz o artigo citado por Iriny Lopes
- Constituição Federal, de 1988
- Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
“Então, eu não reconheço a legitimidade de um projeto que tem erro de origem. A obrigação do Estado brasileiro é de seguir a legislação. Eu vi um desprezo”, completou a parlamentar do PT.
Saiba quais os parques que serão privatizados:
Os empresários que deverão participar da licitação pública que Casagrande programou para o primeiro semestre do ano que vem e o que vierem a ganhar a concessão, uma privatização com tempo determinado de 35 anos, vão cobrar a entrada para poder vir a ter lucratividade:
Parque Estadual Pedra Azul, em Domingos Martins;
Parque Estadual Paulo César Vinha, em Guarapari;
Parque Estadual Cachoeira da Fumaça, Alegre e Ibitirama;
Parque Estadual Itaúnas, em Conceição da Barra;
Parque Estadual Forno Grande, em Castelo
Parque Estadual Mata das Flores, em Castelo.
Findes manda funcionária para defender a privatização
Durante a cessão da palavra para lideranças presentes na Audiência Pública apareceu uma pessoa desconhecida que se apresentou como sendo Graciele Zavarize Belisario e se dizendo ser engenheira e que estava ali como representante da Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes). Ela disse que foi à Audiência para defender a privatização das seis Unidades de Conservação, em nome da classe empresarial.
A representante da classe empresarial elogiou o ex-deputado federal e secretário do Meio Ambiente por estar a frente do processo de privatização e achou normal que seja feita uma audiência com as pessoas das comunidades somente após a conclusão do projeto de privatização. Ela foi bastante vaiada em sua fala, o que exigiu a interferência do presidente da Comissão, pedindo para os presentes ouvir a sua posição.
Também estava presente na Audiência Pública o ex-presidente do Bandes e atual secretário executivo da Câmara Empresarial de Turismo do Espírito Santo (CET-ES) da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Espírito Santo (Fecomércio-ES), José Bof Buffon. Ao ser perguntado se estava ali como representante da entidade empresarial Fecomércio-ES, ele respondeu que foi “avulso, como observador.” Buffon saiu bem antes do evento se encerrar.
Outra pessoa presente, que já expressou nas redes sociais ser contrário à entrega das Unidades de Conservação, os parques públicos municipais foi o ex-diretor do Banco Mundial, ex-secretário de Estado de Planejamento do Governo do Espírito Santo e professor da Ufes, o economista Arlindo Villaschi. A presença de Villaschi no evento foi citada pelo presidente da Comissão de Meio Ambiente da Ales, deputado Gandini.
“O termo correto é privatização e não concessão”, diz Camila Valadão
A deputada Camila Valadão disse na frente do secretário de Meio Ambiente do Estado que “o termo correto é privatização e não concessão. Estamos sim discutindo um projeto de privatização por 35 anos. É privatização com o nome disfarçado de concessão. Não vamos aceitar a entrega de Unidades de Conservação. O que restas da natureza está protegido ali. Esse projeto é um cavalo de troia nos últimos refúgios”, assinalou a parlamentar.
O biólogo Hugo Cavaca criticou em sua fala durante a Audiência Pública o anúncio de Rigoni de que a sociedade capixaba somente tomará conhecimento oficial do projeto de privatização, em audiência pública, no ano que vem, quando a proposta estará finalizada e pronta para ser posta à disposição dos empresários na Bolsa de Valores. Ele desmontou o Decreto Nº 5409-R, de 13 de junho de 2023, onde o governador Renato Casagrande (PSB) cria o Programa de Desenvolvimento Sustentável das Unidades de Conservação do Estado do Espírito Santo (PEDUC), para permitir a entrega das Unidades de Conservação aos empresários.