fbpx
Início > Pesquisadores da Ufes mapeiam febre do Oropouche em território brasileiro

Pesquisadores da Ufes mapeiam febre do Oropouche em território brasileiro


A doença costumava ficar restrita à região amazônica, mas entre 2010 e 2014 houve um rearranjo genético e a febre do Oropouche se espalhou pelo Brasil


Pesquisadores da Ufes mapeiam febre do Oropouche em território brasileiro | Imagem: Fiocruz

Em um esforço científico nacional, pesquisadores da Ufes apontam os principais fatores associados à propagação da febre do Oropouche no Brasil. A análise epidemiológica revela que, fora da Amazônia, a doença teve mais vantagem para se espalhar em pequenos municípios rurais. As pesquisas seguiram três linhas: uma abrangendo a região Norte brasileira, outra englobando todo o Brasil e a última específica no Espírito Santo.

A febre é causada pelo vírus Oropouche (OROV), um arbovírus transmitido por insetos, semelhante aos vírus da dengue, da zika e da chikungunya. A doença foi identificada pela primeira vez em 1955, em um indivíduo da comunidade de Vega de Oropouche, em Trinidad e Tobago, no Caribe. No Brasil, o vírus foi detectado pela primeira vez na década de 1960, em um bicho-preguiça capturado durante a construção da rodovia Belém-Brasília.

Segundo o professor do Departamento de Patologia do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Ufes Edson Delatorre, a doença costumava ficar restrita à região amazônica, porém, no início de 2024, o vírus se espalhou por diversos países e por todas as regiões do Brasil. Acredita-se que a variante que provocou a disseminação tenha surgido entre 2010 e 2014 na região central do Amazonas, devido a um rearranjo genético. Os primeiros casos foram detectados na cidade de Tefé (Amazonas) em 2015 e, posteriormente, na Guiana Francesa, em 2020, sugerindo uma dispersão silenciosa ao longo dos anos.

Contexto capixaba

Em abril de 2024, os primeiros casos de Oropouche foram confirmados no Espírito Santo. Desde então, já foram registrados mais de 450 casos, distribuídos por 36 municípios. As cidades com maior ocorrência são Laranja da Terra, Rio Bananal, Colatina, Anchieta e Itaguaçu. Segundo os pesquisadores, muitos pacientes não relataram viagens para regiões endêmicas, o que indica que o vírus já circula localmente no estado, e não apenas por introduções externas.   

“Recentemente, o Ministério da Saúde confirmou os primeiros óbitos atribuídos à febre do Oropouche no Brasil, com dois casos registrados no interior da Bahia, envolvendo mulheres jovens e sem comorbidades prévias. Houve ainda um óbito fetal causado por transmissão vertical do vírus (quando ele passa da mãe para o feto durante a gestação). Outros oito casos de transmissão vertical estão em investigação. Esses podem estar associados a outras manifestações graves, como malformações congênitas. Atualmente, há um caso de óbito sob investigação no Espírito Santo. Tudo isso reforça a necessidade de vigilância constante e de medidas de controle para prevenir a disseminação da doença no país”, afirma Delatorre.

Transmissão

A transmissão se dá pela picada do mosquito hematófago Culicoides paraensis, conhecido popularmente como maruim ou mosquito-pólvora. O vírus possui um genoma dividido em três segmentos de RNA. Essa característica facilita o fenômeno de rearranjo genético, que ocorre quando dois vírus diferentes infectam a mesma célula simultaneamente. O rearranjo pode resultar na troca de segmentos de RNA entre diferentes variantes virais, possibilitando o surgimento de novas versões com características adaptativas, como maior capacidade de transmissão, virulência e adaptação a novos vetores. Essa possibilidade de mutação genética potencializa a propagação da doença.

O professor reitera que, fora da região amazônica, o vírus tem circulado principalmente em áreas rurais. Isso ocorre porque o principal vetor, o maruim, não é tão bem adaptado ao ambiente urbano como o Aedes aegypti. Além disso, ele alerta que a proximidade com algumas culturas agrícolas, como banana e cacau, influencia a prevalência de casos de infecção, devido à maior presença do mosquito transmissor nessas áreas.

“Outros fatores, como a fragmentação das paisagens florestais, em grande parte causada pela expansão agrícola, podem ter aumentado a interação entre os insetos vetores e os hospedeiros humanos, contribuindo para a disseminação do vírus”, explica Delatorre.

Prevenção e sintomas

A principal medida preventiva é evitar a exposição ao inseto. No entanto, Delatorre alerta que repelentes e inseticidas convencionais não são tão eficazes contra o maruim. Outra dificuldade é que esse mosquito pode atravessar telas convencionais por ser muito pequeno. Diante disso, é recomendada a utilização de malhas ultrafinas ou até mesmo o fechamento completo de portas e janelas. Outra alternativa é eliminar os criadouros da espécie, que incluem água parada rica em matéria orgânica.

Com a contaminação, surgem sintomas semelhantes aos da dengue, como febre, dor de cabeça, dores musculares e articulares, além de mal-estar generalizado. Na maioria dos casos, a doença é autolimitada e se resolve em aproximadamente uma semana. Outra característica da febre do Oropouche é a possibilidade de recidiva, com reaparecimento dos sintomas de uma a duas semanas após as manifestações iniciais. No entanto, em alguns casos, a doença pode evoluir para formas mais graves, como meningite e encefalite.

Segundo Delatorre, os pesquisadores seguem analisando os dados para compreender o cenário brasileiro e capixaba. A partir disso, esperam desenvolver medidas eficazes para lidar com novas ondas de contágio, principalmente com a chegada da primavera e do verão.

“É fundamental que haja um compromisso governamental e da população para a vigilância e o combate não apenas a esse vírus, mas também a outros arbovírus, como dengue, zika e chikungunya. Ao adotar medidas de prevenção, como eliminar focos de água parada, utilizar repelentes e buscar informações sobre arboviroses, podemos contribuir para a segurança de nossa comunidade e garantir um futuro mais saudável para todos “, ressalta o pesquisador.

O estudo é financiado por diversas agências, incluindo o Ministério da Saúde, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes). Também conta com a parceria de diversos Laboratórios Centrais de Saúde Pública (Lacens) e agências de vigilância em saúde estaduais.

Texto: Ghenis Carlos Silva (bolsista)