Novo biomaterial busca acelerar a regeneração e melhorar a qualidade do osso formado
Desenvolver um biomaterial que estimule o crescimento ósseo e seja gradualmente absorvido pelo corpo humano: esse é o foco da pesquisa de pós-doutorado desenvolvida na Faculdade de Odontologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), “Avaliação in vitro e in vivo de novos agregados plaquetários autólogos associados a biomateriais e fármacos para bioengenharia”, por Emanuelle Stellet, sob orientação da professora Mônica Calasans.
O estudo investiga o uso de biomateriais principalmente em ossos, mas também considera aplicações futuras em tecidos moles, como a gengiva, e visa resolver um dos principais desafios na implantodontia e na cirurgia reconstrutiva, aliando eficiência e baixo custo financeiro.
Bioengenharia
Essa aplicação traz contribuições para a bioengenharia — área que estuda a associação de células humanas e biomateriais, que são estruturas que, quando em contato com sistemas biológicos, podem reparar ou substituir tecidos, órgãos ou funções do organismo.
“A aplicação clínica desses biomateriais tem o potencial de reduzir o tempo de recuperação pós-cirúrgica e melhorar os resultados a longo prazo para pacientes odontológicos e em outras áreas da saúde. Além disso, esse biomaterial pode ter um impacto significativo na saúde pública, tornando os procedimentos de enxerto ósseo menos invasivos, beneficiando não apenas os pacientes dos dentistas, mas também aqueles que necessitam de reconstruções ósseas devido a traumas e outras condições médicas sérias”.
Atualmente, Stellet tem explorado a produção em laboratório de biomateriais combinando antibióticos com a Alb-PRF, membrana criada e patenteada durante sua pesquisa de doutorado na UFF. O estudo já conseguiu aprimorar o elemento para promover uma regeneração óssea mais eficiente e duradoura.
“A membrana já demonstrou sucesso em casos práticos, como na regeneração óssea de um boxeador com uma fratura no úmero — osso longo do braço, que se prolonga do ombro até o cotovelo. Combinada com antibióticos, a membrana ainda tende a reduzir as chances de infecção por contaminação em centro cirúrgico”, conta.
Biomaterial inovador e custo reduzido
Stellet explica que um biomaterial, para dar sustentação para a formação de um osso, precisa permanecer no organismo por pelo menos um mês. “A célula óssea é lenta, então para formar novo osso é demorado. Na área de implantodontia, por exemplo, que é minha especialidade, eu preciso de um espaço de tempo de quatro a seis meses para colocar o dente em cima do implante”.
Com foco em aprimorar esse processo, Stellet se aprofundou, em sua pesquisa de doutorado , na fibrina rica em plaquetas (PRF), uma membrana gelatinosa, totalmente obtida através do sangue, que colabora no crescimento dos tecidos, ou seja, um tipo de ‘acelerador’ na regeneração tecidual. “Em minhas pesquisas percebi que, apesar da PRF ser um ótimo acelerador da regeneração, ela não consegue ser essa estrutura mais duradoura, pois sai rápido do organismo. Por isso, pensamos em uma maneira de prolongar sua permanência durante a regeneração”.
Juntamente ao grupo de pesquisa liderado pela professora Mônica Calasans no Laboratório Associado de Pesquisa Clínica em Odontologia (LPCO) da Faculdade de Odontologia, Stellet desenvolveu um método de modificação da PRF. “Esse método inclui a junção da PRF com uma estrutura chamada hidroxiapatita carbonatada nanoestruturada (cHA), que funciona como alicerce para o crescimento ósseo. Com isso, criamos a Alb-PRF, uma nova membrana que tornou possível, não apenas acelerar o processo de regeneração óssea, mas melhorar a qualidade do osso formado, oferecendo uma alternativa promissora aos métodos tradicionais de enxerto”, explica Stellet.
A especialista em implantodontia explica que esses biomateriais são meticulosamente testados em várias etapas antes de serem introduzidos em pacientes. “Inicialmente, eles passam por testes em laboratório, onde avaliamos sua interação com células em cultura para garantir que promovam o crescimento ósseo sem causar toxicidade ou reações adversas. Em seguida, os materiais mais promissores são testados em modelos animais, onde observamos sua eficácia em condições mais próximas do ambiente humano. Esses testes não apenas garantem a segurança dos materiais, mas também sua capacidade de integrar-se e promover a regeneração óssea antes de serem utilizados clinicamente”.
A pesquisa se compromete não apenas com a eficácia clínica da membrana, mas com sua viabilidade econômica. “Estudos liderados anteriormente pela professora Mônica já mostraram que, para além de sua eficiência no crescimento ósseo, a cHA é uma estrutura mais barata do que as comumente utilizadas no mercado da implantodontia, que podem chegar a mil reais a grama. Nesse sentido, combinar qualidade e diminuição dos custos, reflete nosso compromisso com o objetivo de garantir que essas pesquisas se transformem em solução eficiente e acessível no contexto brasileiro”, conclui a pesquisadora.