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Sem centro de zoonoses, há maus-tratos e doenças em animais abandonados em Cariacica (ES)


Poderes públicos ignoraram o sofrimento dos animais. Apenas em um quarteirão em Jardim América, Cariacica (ES), há mais de 50 gatos abandonados, alguns vítimas da Aids felina (FIV). Nos últimos dias passaram a morrer vários gatos devido a essa doença. A Prefeitura não tem Centro de Zoonoses e deu informações que não conferem com a verdade ao MPES, afirmando que já fez o resgate


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Há centenas de animais abandonados em Cariacica (ES), que não são vacinados e nem castrados e que, além de colocar em risco a vida da população por não terem vacinas, ainda estão sendo vítimas de maus-tratos, violência, doenças, que inclusive já repassou para moradores. O Ministério Público do Espírito Santo (MPES) informa que está aberto o Inquérito Civil nº 2022.0007.9918-7, com “objetivo principal é apurar deficiências nos serviços de vacinação antirrábica, recolhimento de animais e demais cuidados com a saúde pública.”

O Inquérito civil é o procedimento preliminar do qual o Ministério Público faz uso na apuração de fatos relevantes para a propositura de ação civil pública. O inquérito civil está previsto na Lei 7.347/85. É a lei que disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e dá outras providências. A lei foi assinada pelo ex-presidente José Sarney em 24 de julho de 1985.

O problema, de acordo com o MPES, está na recusa da Prefeitura de Cariacica (PMC) em reconstruir o Centro Municipal de Zoonoses, que foi destruído por vândalos em fevereiro de 2017, durante o motim da Polícia Militar do Espírito Santo (PMES). De acordo com informativo da própria PMC naquela ocasião, os criminosos “incendiaram a sede administrativa do Centro de Zoonoses, o Centro Cirúrgico, o caminhão usado para recolher cavalos e a caminhonete de recolhimento de cães, gatos e animais de pequeno porte”, e acrescenta que ainda incendiaram “dois veículos do Centro de Controle de Zoonoses de Cariacica (CCZ).”

Parte dos argumentos poder público municipal para ignorar animais soltos nas ruas

 “Recusa da Prefeitura”, diz o MPES

Dali para cá, não houve interesse de a Prefeitura reconstruir o CCZ e assim não há análise sobre as doenças que estão afetando os animais de rua e muito menos em recolher esses animais, promover a vacinação, tratar e fazer a feira de adoção. É o que alega o MPES. O inquérito é “para investigar a inexecução da campanha de castração de animais e a recusa da Prefeitura de Cariacica em reconstruir o Centro Municipal de Zoonoses”, assinala o Ministério Público, em nota assinada pelo promotor de Justiça  Luiz Renato Azevedo da Silveira.

“O inquérito, que já ultrapassou um ano de tramitação, foi prorrogado para permitir a realização de diligências imprescindíveis para sua conclusão, conforme a Resolução Nº 006/2014 do Colégio de Procuradores de Justiça do MPES”, acrescenta a nota. Na nota, o MPES dá a seguinte informação: “Quanto a construção do CCZ o Ministério Público tem a informar que a Secretaria de Saúde está recebendo um terreno com construção já para que seja feito um novo Centro de Controle de Zoonoses de Cariacica.”

Jardim América não teve voz para ser ouvida

No caso especifico do quarteirão da Rua Canadá, em Jardim América, entre as avenidas Engenheiro José Sertã e Avenida Brasil, os moradores alegam que não tiveram voz para serem ouvidos, onde foram feitas inicialmente solicitações à Prefeitura de Cariacica, desde a gestão do ex-prefeito Geraldo Luzia de Oliveira Junior, o Juninho até a atual gestão de Euclerio Sampaio, informam os moradores. Todas as solicitações não tiveram respostas e nem as colônias de gatos foram vistoriadas e a municipalidade optou por ignorar.

Em seguida, os moradores narram que foram procuradas as Organizações Não-Governamentais (ONG’s), onde todas elas, mesmo sobrevivendo com recursos públicos ou de doações de particulares, também optaram por ignorar o sofrimento desses animais. Segundo os moradores, todas elas voltadas principalmente para gatos, como as que tem nome de “patinhas”, “gatinhos” e com o final “carente”, não quiseram nem ouvir os pedidos de socorro para os animais, prossegue um dos moradores. “Todas essas ONG’s se recursaram até em ouvir os pedidos de socorro, optando em também ignorar”, contou.

Em seguida, os moradores, disseram que foram feitos contatos com a deputada estadual Janete de Sá (PSB), que se elege e reelege com uma eterna presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Maus-Tratos contra os Animais, mas é acusada pelos munícipes de ignorar o problema especifico de Jardim América e até de destratar os moradores que foram pedir uma solução dos gatos vítimas de maus-tratos, doenças e abandono daquele bairro. Moradores contam que Janete chegou a mandar um funcionário de seu gabinete ir dizer desaforos em suas casas, apenas por terem pedido uma solução para os gatos. A parlamentar é aliada política do prefeito.

MPES ouviu informações que não são verdadeiras da Prefeitura

Segundo os moradores, já foram feitas 10 denúncias ao MPES desde 2022, sem que se tenha tido uma solução. Procurado o órgão de fiscalização da sociedade emitiu a seguinte nota: “O MPES está acompanhando denúncias de maus-tratos e abandono de animais, buscando soluções para a reintegração e proteção dos animais afetados. Inclusive, todas as novas reclamações que chegavam pela Ouvidoria sobre maus tratos ou recolhimento de animais eram juntadas ao Inquérito Civil e prontamente resolvida a situação problema”, diz nota do MPES.

A única contestação dos moradores com a nota do MPES onde a Prefeitura levou ao promotor de Justiça, Luiz Renato Azevedo da Silveira, ao erro, ao afirmar em ofício de já tinha sido resolvida essa questão. É onde o promotor diz no final de seu texto que “quanto aos gatos que estavam abandonados em Jardim América, esses animais já foram recolhidos.” A informação, entendida pelos moradores como, provavelmente, ter sido dada pela Prefeitura ao MPES foi considerada como sendo “não verdadeira.”

A informação dada pelo MPES veio de documento encaminhado pela Prefeitura através do Ofício/PMSemus/Gab/Nº606/2022, assinado pela então secretária municipal de Saúde Roberta Goltara Coelho, onde diz textualmente que já havia promovido a “vacinação antirrábica, recolhimento dos animais e demais cuidados com a saúde dos animais e das pessoas.” Em seguida, anexo ao ofício enviado ao MPES, a secretária enviou a CI/Semus-GVS Nº 00233/2022, assinada pela gerente de Vigilância em Saúde, Flávia Helena Maia Costa, onde também há informação inconsistente em documento oficial remetido ao MPES.

“Em atendimento à manifestação registrada em OF/PCCC/CART/ Nº 1916/2022, quanto a demanda de vacinação em serviço municipal, informo acolhimento integral e encaminho parecer elaborado pelo médico veterinário lotado na Coordenação de Vigilância em Saúde Ambiental/Coordenação de Agravos e Zoonoses, no âmbito da Gerência de Vigilância em Saúde”, atesta a funcionária em documento oficial enviado ao Ministério Público.

E anexou o parecer assinado pelo médico veterinário Daniel Rodrigues Teixeira, de 5 de agosto de 2022. O profissional não observou que o pedido era o recolhimento de animais abandonados e usou três páginas para citar legislações, sem justificar o motivo o ponto-chave do qual foi acionado, além de não justificar a falta de vacinação para animais abandonados. Na inicial, alertou a sua chefia imediata que “não há certeza se o parecer atenderá ao requerente, se em razão da ausência de fornecimento da vacina antirrábica, ou a negativa de realiza-la, ou sobre a correta aplicação ou se a conservação do imunobiológico.”

Gatinhos que tiveram a mãe morta por doença, choram de fome e aguarda a morte. Vídeo feito nesta última quinta-feira (27). Os Poderes Públicos ignoram esse sofrimento | Vídeo: Redes sociais

O que diz o MPES sobre informações oficiais inconsistentes

Foi perguntado ao Ministério Público se há crime de uma Prefeitura fornecer informações oficiais inconsistentes, que não traduzam a verdade, para um órgão de fiscalização da sociedade. Após novo contato, em segunda nota, o MPES deu o seguinte posicionamento:

O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES) informa que recebeu da Prefeitura de Cariacica, por ofício, as explicações sobre recolhimento de animais. Em resumo, foi informado que casos de crime de maus tratos são levados diretamente à Polícia, órgão competente ao assunto; e em casos de animais abandonados, existe a tentativa de dar o melhor tratamento, entretanto, conforme legislação e orçamento do município para tal.

A prefeitura informou também que, como Cariacica ainda não possui o Centro de Zoonoses reconstruído, não há local adequado para acolhimento desses animais. Ainda assim, destacou que tenta tratar e vacinar os casos mais graves, por meio de convênio firmado com outra instituição especializada para destinação dos animais.

O MPES reforça que segue acompanhando a situação e atuando para adotar todas as diligências que se façam necessárias.”

Sofrimento, morte e ampliação da colônia de gatos continua

Os gatos permanecem desde o início das primeiras denúncias em 2022, sem que nunca estivesse algum funcionário da Prefeitura para inspecionar ou muito menos para fazer o resgate. É citado que nestes últimos dias há o agravante de os animais estarem morrendo vítimas da Imunodeficiência Felina, ou chamada de ou Aids felina (FIV) e de Leucemia felina (FeLV). 

Como a Prefeitura de Cariacica não tem interesse em cuidar dos animais abandonados e nem possui uma clínica de análises laboratoriais que deveria estar funcionando no inexistente Centro Municipal de Zoonoses, um morador relatou que quis saber qual era a doença que está matando os gatos. Ele narrou que pegou uma gatinha de rua bem nova, que já apresentava estar doente, pagou R$ 150,00 na clínica veterinária Vida Animal Pet Shop Jardim América, onde teve o diagnóstico clínico comprovando que o animal tinha a FIV e que “não tinha cura e que morreria em breve.”

Pedidos da comunidade ignorados pela Prefeitura de Cariacica

A primeira solicitação para que a Prefeitura de Cariacica dê uma solução aos mais de 50 gatos abandonados foi feita pelo Movimento Comunitário do Bairro de Jardim América (MCBJA), em 25 de janeiro de 2022 através do Pedido 002203.2022-26 à Ouvidoria daquela municipalidade. Naquela ocasião eram 22 gatos, agora são mais de 50. A solicitação foi ignorada pela Prefeitura. Nem a Ouvidoria e nenhum outro setor da Prefeitura deu resposta ou procurou fazer uma visita para averiguar. Procurada, a direção do MCBJA, disse que já fez duas solicitações, sendo uma nesta semana.

Recentemente, moradores tiveram esporotricose, uma micose subcutânea causada pelo fungo do gênero Sporothrix, que habita a natureza e está presente no solo, palha, vegetais, espinhos, madeira. A doença pode afetar tanto animais quanto humanos, principalmente os gatos que representam mais de 50% dos casos. As doenças nos animais abandonados são ignoradas em Cariacica e o MPES informou que aguarda uma solução no Inquérito Civil nº 2022.0007.9918-7, ainda aberto.

Foi diante de constatação de que a Prefeitura optou por ignorar a questão animal no município e principalmente a doença, que os próprios moradores formularam no início de fevereiro de 2025 uma denúncia contra essa municipalidade à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), através do canal Fala.BR. Nessa denúncia destinada à Anvisa é apontado o descaso da municipalidade com o risco de os munícipes serem contagiados por doenças.

Notificações e Oitivas

Segundo a nota do MPES já foi feito o seguinte: “Diversas notificações foram emitidas para autoridades municipais, incluindo o Secretário de Saúde e a Coordenadora do Centro de Controle de Zoonoses, Sra. Regina Marta Silva Ribeiro Miranda, para prestarem esclarecimentos sobre as irregularidades apontadas.”. E que também foram solicitadas requisição de informações: “Foram requisitadas informações detalhadas sobre o funcionamento da UVZ, incluindo contratos de recolhimento de animais e procedimentos de castração e adoção.”

E acrescenta na nota: “O MPES agendou audiências para colher depoimentos e esclarecimentos de autoridades municipais, visando obter uma visão abrangente das práticas e desafios enfrentados pela UVZ. O Ministério Público também notificou a Gerência de Monitoramento Ambiental para colaborar nas investigações relacionadas ao impacto ambiental das práticas da UVZ.”

Gato abandonado morto por doença nesta última semana | Vídeo: Redes sociais

Acompanhamento de denúncias

“Acompanhamento de Denúncias: O MPES está acompanhando denúncias de maus-tratos e abandono de animais, buscando soluções para a reintegração e proteção dos animais afetados. Inclusive, todas as novas reclamações que chegavam pela Ouvidoria sobre maus tratos ou recolhimento de animais eram juntadas ao Inquérito Civil e prontamente resolvida a situação problema”, diz o promotor de Justiça Luiz Renato Azevedo da Silveira em sua nota.

E finaliza: “O Ministério Público está comprometido em garantir a correta prestação dos serviços públicos pela UVZ, promovendo ações contínuas de investigação e diálogo com as autoridades competentes para assegurar o cumprimento das normas legais e a proteção da saúde pública e animal. Quanto aos gatos que estavam abandonados em Jardim América, esses animais já foram recolhidos”. Apenas essa última frase foi contestada pelos moradores, que alegam não ser a verdade, já que nunca houve recolhimento e que os animais continuam e, sem castração, a colônia de gatos está ampliando.

Denúncia à Anvisa, através do portal FalaBR | Imagem: Redes sociais

O que é FIV e FeLV

Todo cuidador de gatos deve providenciar a vacinação preventiva contra a FIV e a FeLV. A FIV, conhecida popularmente como Aids felina, e a FeLV, chamada de leucemia felina, são duas doenças distintas, mas com algo em comum: acometem exclusivamente os gatos, enfraquecendo seu sistema imunológico e deixando-os mais suscetíveis a contrair outras doenças.

A FIV pode ser transmitida por meio de arranhadura, normalmente quando um gato briga com outro. Embora seja uma doença sem cura, o animal com FIV pode levar uma vida normal, desde que tenha os cuidados necessários e acompanhamento com médico veterinário.

Já a FeLV é um vírus que induz a formação de tumores nos gatos. Normalmente, é adquirida por meio da lambedura, compartilhamento de potes de ração ou água e caixa de areia. Por ser uma doença mais grave, a partir do momento que o animal desenvolve quadros como anemia ou formação de tumores, infelizmente não há muitos tratamentos a que recorrer. É possível fazer quimioterapia e/ou transfusão de sangue, mas normalmente esses pets acabam evoluindo para o óbito muito rápido.

O cuidador deve ir em um médico veterinário e solicitar um diagnóstico para essas doenças, que é comum nos gatos, e receber as orientações necessárias. Os especialistas ressaltam que os felinos podem pegar tanto FIV quanto FeLV quando tem acesso livre à rua. O recomendado é colocar telas nas janelas e evitar que os gatos saiam de casa.

Além disso, não é recomendado introduzir um animal que foi diagnosticado positivo para uma dessas duas doenças em uma casa que tenha um gato negativo, por que há forte risco de transmissão. As informações e recomendações acima são da Secretaria Municipal da Saúde da Prefeitura de São Paulo (SP). Em Cariacica, por não ter um centro municipal de zoonoses, não há orientações aos moradores e muito menos o recolhimento de animais abandonados.