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Oposição questiona proposta de Bolsonaro de regular moderação de conteúdo na internet

Bolsonaro prepara decreto para dificultar retirada de fake news, como os que ele próprio divulga sobre cloroquina | Foto: Internet

A medida, segundo participantes da audiência pública da Câmara dos Deputados, é uma reação de Bolsonaro ao combate à Fake News e, com o decreto, quer dificultar a retirada de informações falsas

Durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, nesta última quarta-feira (2) os deputados tomaram conhecimento de que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se prepara para editar um decreto, regulando a moderação de conteúdo em plataformas digitais, como desculpa para regulamentar o Marco Civil da Internet. A atitude, segundo a representante do Coletivo Brasil de Comunicação Social (Intervozes) Flávia Lefèvre, disse que uma reação ao combate de fake news, que vem sendo adotada por algumas plataformas, como o Google, Facebook e Twitter.

No decreto, Bolsonaro quer que as remoções de fake news, como as publicações que ele próprio faz, em indicar remédios sem nenhuma eficácia contra o Covid-19, como a cloroquina, somente sejam removidas por decisão judicial. Lefèvre, que também participou da audiência pública, anda acusou o decreto em vias de ser assinado de ter vícios de motivação e finalidade. Com informações da Agência Câmara de Notícias.

Assista aos alertas feitos por especialistas durante audiência pública | Vídeo: TV Senado

Informações falsas

“O decreto foi proposto como reação à atuação das empresas de internet, que com base nos seus termos de uso têm removido conteúdos de informações reconhecidas como falsas e perigosas para saúde pública, no caso da Covid-19, promovidas por representantes do governo e seus apoiadores”, criticou. Os representantes das principais plataformas digitais – Google/Youtube, Facebook e Twitter – foram convidados a participar do debate, mas não compareceram. A audiência contou  ainda com a participação de representantes do Comitê Gestor de Internet no Brasil (CGI.br), de pesquisadores e de ativistas digitais.

A minuta do decreto, que regulamenta o Marco Civil da Internet, já está sob análise de outras pastas do governo. Entre outros pontos, estuda-se proibir a exclusão e suspensão de contas e conteúdos, salvo sob ordem judicial. O deputado Carlos Veras (PT-PE), que solicitou a audiência pública, apelou para que o governo não publique o decreto. “A gente decidiu fazer esta audiência pública antes para sensibilizar o governo, para que não publiquem um decreto que, no lugar de resolver distorções, cause muito mais problemas, inclusive para a liberdade de expressão do povo brasileiro”, clamou.

Caso o Poder Executivo decida seguir com a regulamentação, Carlos Veras propôs revogá-la por meio de um projeto de decreto legislativo. Já a deputada Erika Kokay (PT-DF) defendeu limites para liberdade de expressão. “Negar a realidade e fazer com que narrativas mentirosas se transformem em fatos não pode ser permitido. Não se pode negar a própria ciência”, ponderou. “Limites devem ser respeitados para que se assegure o debate democrático.” Kokay também criticou a definição das regras para moderação de conteúdo por meio de decreto, o que considera autoritário.

Desinformação

A deputada Vivi Reis (Psol-PA) também disse estar preocupada com os efeitos do decreto na desinformação. “O governo é o grande propagandeador de notícias que fogem ao conhecimento científico, aos fatos reais”, acusou. Vivi Reis ainda lançou suspeitas sobre as motivações do decreto, que para ela busca influenciar as eleições do ano que vem. “Esta movimentação já está visando 2022, uma eleição baseada em mentiras e notícias falsas. Isto é inaceitável.”

O coordenador do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), Márcio Nobre Mignon, alertou para a necessidade de definir os termos com clareza na regulação do Marco Civil da Internet, que trata de provedores de aplicação e de conteúdo. Ele acredita que sites www, de jornais e outros tipos de provedores não seriam alcançados pelo decreto.

Já o diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), Demi Getschko, apontou para a importância de equilibrar liberdade com responsabilidade. “Quanto maior a liberdade, maior a responsabilidade”, ponderou. “Plataformas, como clubes, têm normas de conduta. Mas estas normas não podem se sobrepor à Constituição.” Demi Getschko alertou para os problemas no uso de inteligência artificial na moderação de conteúdo das plataformas, que pode levar a erros na exclusão de usuários e postagens.

Prejuízo às plataformas comerciais

A diretora do Centro de Pesquisa em Direito e Tecnologia (InternetLab), Mariana Valente, alertou para o risco de o decreto prejudicar a gestão de plataformas comerciais. “Ao proibir a suspensão de contas sem ordem judicial, isso se aplica também a usuários de Uber que assedia motoristas, restaurantes do Ifood que servem comida estragada, para o vendedor do Mercado Livre que frauda vendas. O provedor perde a capacidade de aplicar regras que podem funcionar para garantir a confiança naquele espaço, e o usuário perde com isso.”

A representante da Coalizão Direitos na Rede Raquel Saraiva disse que o decreto tornaria inviável a gestão de plataformas de conhecimento, como a Wikipedia. Raquel Saraiva também teme a disseminação do discurso de ódio e desinformação. “É importante regular moderação de conteúdo, mas decreto não é a via adequada”, comentou. Ela defendeu a discussão das regras por meio do Projeto de Lei das Fakes News (PL 2630/20), já aprovado pelo Senado e em discussão na Câmara.