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Após invasão à colégio por vereador de Vitória, professores defendem autonomia em escolas

Reunião do colegiado de Educação debate autonomia para as escolas e obtém apoio da Assembleia | Foto: Ellen Campanharo/Ales

Documento extraído da reunião do colegiado de Educação da Assembleia Legislativa será enviado ao Ministério Público para a tomada das medidas cabíveis

Após o ataque e invasão do enfurecido vereador bolsonarista de Vitória, Gilvan Aguiar Costa, vulgo Gilvan da Federal, do Patriotas, a uma escola do Bairro Jardim Camburi, os professores foram à Assembleia Legislativa d Espírito Santo (Ales). No Poder Legislativo estadual, pediram a defesa da liberdade de cátedra e o repúdio aos ataques que profissionais da educação vêm sofrendo, especialmente no município de Vitória.

Foi exatamente em Vitória, cujo invasor da sala de aula que o despreparado Gilvan da Federal entrou e que é um dos municípios que mais foram citado em reunião extraordinária realizada pela Comissão de Educação da Assembleia Legislativa (Ales) na tarde desta última quinta-feira (1º). O vereador da capital faz parte da base de apoio do delegado de Polícia Civil licenciado que ocupa o cargo de prefeito, Lorenzo Pasolini.

Ministério Público Estadual

Os presentes decidiram enviar os fatos relatados no encontro para o Ministério Público (MPES) para que sejam adotadas  providências. Segundo a professora Zoraide Barboza de Souza, presidente do Conselho Municipal de Educação de Vitória (Comev), os profissionais da rede pública normalmente já trabalham com muitas dificuldades e nos últimos tempos passaram a ter que conviver com uma série de questionamentos feitos por pessoas que não são capacitadas na área da educação.

“Quando vem alguém externo utilizar o espaço de trabalho que é realizado na educação de forma pejorativa, desrespeitosa com o trabalho, isso crava na nossa alma porque escolhemos essa profissão, que não veio por acaso, veio pela escolha e orgulho de ser professor. (…) o conselho não pode se calar diante dos ataques na educação de Vitória”, afirmou.

Ela destacou que a autonomia docente está baseada na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), nas diretrizes curriculares, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e na Constituição Federal (CF). A professora citou diversas situações consideradas tipos de ataques aos profissionais da educação e disse que todos os casos que chegaram ao conselho foram encaminhados para instâncias municipais, mas que o Comev não tem recebido retorno satisfatório.

Bruno Lamas (PSB), presidente do colegiado de Educação, lamentou a falta de respostas ao conselho. Mais tarde, determinou que os fatos narrados pela professora Zoraide sejam remetidos no formato de notícia de fato aos órgãos de controle, tais como o MPES, para averiguação da sua legalidade e juridicidade. Ainda falou que os presentes que quisessem poderiam subscrever o documento como forma de apoio.

Autonomia

Para a vereadora do município de Vitória Karla Coser (PT) está ocorrendo uma verdadeira perseguição aos professores na capital. “Lidar com a diversidade não tem sido natural para algumas pessoas do poder público. Nada na educação é desrespeitoso ou passa do normal, o que ocorre é simplesmente a possibilidade de falar sobre diversidade”, argumentou.

Já a coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Alfabetização, Leitura e Escrita do Espírito Santo (Nepales), Cleonara Maria Schwartz, frisou que a escola democrática é assegurada pela Constituição Federal. “O que se faz na escola não se faz aleatoriamente, mas com regulamentação. (…) Cenários de enfrentamento não têm contribuído para construir aprendizagem, mas obstaculizar o trabalho do professor”, reforçou.

O presidente da Comissão Especial de Direito Educacional da OAB-ES, Rogério Nunes Romano, corroborou a defesa da autonomia educacional. “É necessária e justificável em todo e qualquer aspecto, precisa de amplitude de como a instrução vai passar a formação para os alunos. Ela (a escola) pode criar suas próprias regras. Podem criar suas propostas pedagógicas que vão ser passadas aos alunos”, explicou.

Sumika Freitas, integrante do Comitê Capixaba da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, falou que os ataques ligados à questão de gênero vêm acontecendo de maneira mais frequente desde 2015. “Geralmente contra mulheres, professoras, diretoras, gestoras, jornalistas e vereadoras. Têm uma motivação, é um ataque à gestão democrática, ao pluralismo de ideias e a nossa legislação educacional”, enfatizou.

Defesa dos professores

O deputado Sergio Majeski (PSB) salientou a diferença de tratamento das autoridades em casos envolvendo a rede pública estadual e a municipal de Vitória. Para o parlamentar, a Secretaria de Estado da Educação (Sedu) agiu de modo correto em uma situação envolvendo uma professora da rede estadual. “Mostrou que ninguém vai colocar o dedo na cara de professor. Você coloca esse tipo de pessoa no lugar dela e tenho certeza que isso vai ser repensado”, disse.

Ele criticou o fato de a mesma atitude não ter ocorrido na capital. “Não se percebeu isso na questão municipal para proteger professores e escolas. Está dentro das diretrizes, não tem ninguém exorbitando das suas funções e ameaçando crianças”, garantiu.

De acordo com a promotora de Justiça Maria Cristina Rocha Pimentel, o MPES está recebendo reclamações sobre conteúdos aplicados em sala de aula, mas reforçou que a liberdade de cátedra é indiscutível. “Estão chegando de forma muito estranha, falando que pais estão procurando autoridades para falar de conteúdos. Por que não procuraram o órgão ministerial?”, indagou.

Pimentel contou que gostaria de estar discutindo a valorização dos profissionais da educação, não temas como os abordados no encontro. Por fim, falou que o MPES só consegue fazer direcionamentos para denúncias com fatos robustos e que fatos muitos amplos não ajudam na linha de ação adotada pelo Ministério Público. Lamas respondeu que o documento retirado a partir do debate talvez possa configurar uma maneira de agir contra quem ataca os professores em Vitória.

Além dos citados, participaram da reunião profissionais da educação, representantes de sindicatos, de associações, de movimentos sociais, de fóruns e comitês locais e do poder público estadual.

Omissão da Câmara

A Câmara de Vereadores de Vitória optou em adotar a omissão para os desmandos que o citado vereador vem fazendo. O presidente do legislativo municipal, o vereador David Esmael, tomou conhecimento da gravidade da ação do vereador bolsonarista, mas mesmo tendo sido provocado em suas redes sociais, optou pelo silêncio,

A postura de inexistência de uma ação da Câmara de Vereadores é maléfica, uma vez que dá uma autorização implícita para que o vereador continue invadindo salas de aulas com agressividade. Gilvan da Federal já deu exemplo de despreparo para ocupar um cargo de representatividade popular, após adotar ataques frequentes contra as vereadoras Karla Coser (PT) e Camila Valadão (Psol), com a omissão da mesa diretora da Câmara de Vereadores.