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Esquerda celebra Dia da Anistia e pede que lei alcance os torturadores

Primeiro andar do Triplex da Resistência, no Centro de Vitória, ficou lotado de militantes jovens e idosos neste sábado

Roberto Junquilho/reprodução Século Diário

Foto: Arquivo/ GrafittiNews

Em meio à alegria e abraços por rever velhos amigos, a passagem do Dia da Anistia neste sábado (28), organizada pelo Movimento Geração 68 no Espírito Santo, foi marcada por posicionamentos que apontam para a necessidade uma revisão da Lei 6.683/79, a fim de que alcance os torturadores. Crianças de colo, jovens, adultos e idosos formaram o público presente no primeiro andar do antigo prédio do Hotel Imperial, transformado em Triplex da Resistência, no Centro de Vitória, para comemorar a data. Partidos políticos de esquerda, como o PCdoB, a Unidade Popular, PT e o Psol, participaram do ato, que contou também com as presenças de jovens e antigos militantes, de entidades sindicais e ex-presos e perseguidos políticos.

Nos discursos, o destaque foi dado aos seis capixabas desaparecidos na ditadura militar e cujos corpos nunca foram encontrados, os presos e torturados, e a Carta Aberta à População em defesa da democracia e contra o governo Bolsonaro, que nesta segunda-feira (30) será entregue a instituições representativas da sociedade civil. O documento, em circulação por todo o país, é assinado no Estado por ex-governadores, prefeitos e ex-prefeitos, parlamentares, jornalistas, artistas, intelectuais, partidos políticos e movimentos sociais e sindicais.

Para o ativista Perly Cipriano, o evento foi “muito importante e representativo, porque além de estar presente a geração de 68, o pessoal trouxe seus filhos e netos, para participar. Significa o resgate da memória, e essa é uma forma de combater a tirania da ditadura. Esse evento constitui um novo momento desse resgate no Espírito Santo”.

Foto: Arquivo/GrafittiNews

Perly ficou preso por quase 10 anos e acredita que “a anistia no Brasil não foi ampla nem irrestrita, mas representou um avanço, porque assegurou o retorno à vida politica no Brasil dos banidos, exilados, cassados e perseguidos políticos que estavam em liberdade. Porém, quase nenhum preso ou presa política foi para liberdade em função da Lei da Anistia, e sim pela unificação das condenações ou pelo livramento condicional”.

O advogado Francisco Celso Calmon, da Comissão Memória Verdade e Justiça, aponta que a interpretação da Lei da Anistia se deu pelas vozes e meios de comunicação dos ideólogos e juristas a serviço da ditadura e informa: “Todos os comitês ‘Memória Verdade e Justiça’ fazem uma campanha para a reinterpretação da Lei da Anistia, que já foi pedida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos e ao ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), que há 11 anos pediu vistas, engavetou, e até hoje não a colocou para apreciação”.

Já a ex-presa política Angela Milanez, hoje aposentada, na época filiada ao PCdoB, disse: “Não acho correto que os torturadores tenham sido anistiados”, e aponta para um futuro ainda mais sombrio: “Vejo hoje o Brasil pior do que antes. Esse Bolsonaro é igualzinho a Hitler. Eles matavam e torturavam, mas este é muito pior”, destaca.

Angela foi presa quando cursava Geografia na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), juntamente com a jornalista Miriam Leitão. Elas foram levadas para o 3º Batalhão de Infantaria, em Vila Velha, sendo liberada depois de 60 dias. Nua, sofreu a ameaça de ter uma jiboia enrolada em seu corpo, que, “felizmente, não aconteceu”.

Na época, ela era casada com o ativista Iram Caetano, que também foi preso. Iram diz que o evento, que ocorre no Brasil e em alguns lugares do mundo, retoma a vontade de lutar, a ânsia de liberdade. “Passamos pela luta naquela época, que, infelizmente, tem sido abalada pela administração desse louco, genocida, corrupto, inimigo das necessidades sociais de nossa gente e causador de uma tragédia, que fez acender a chama e levantarmos a mão. Estamos na luta”, ressaltou.

Antônio Claudino de Jesus, médico, gestor público, professor universitário e ambientalista, organizador do cineclube que funciona no Triplex, vê a geração 68 e as anteriores de mãos dadas num encontro de cidadania. É um resgate da liberdade e da dignidade do povo brasileiro, que foram aviltadas por essa ditadura disfarçada”.

A presidente estadual do PT, Jackeline Rocha, acredita que o evento simboliza, sobretudo, “o foco da resistência do nosso passado, da ancestralidade, da luta democrática, e o PT, que vem dos trabalhadores, dos movimentos sociais e estudantis, sabe que todos que estão presentes aqui continuarão na luta por um mundo mais justo, um Brasil mais justo. E que a nossa esquerda esteja unidade para vencer o fascismo, a ditadura da fome, da violência, do machismo, e, principalmente, conduzir o Brasil para tempos democráticos. Ditadura nunca mais”, exaltou.

A Lei da Anistia, sancionada pelo ditador João Baptista Figueiredo, não tratou os crimes de ambas as partes de forma equânime, nem tampouco beneficiou igualmente todos os autores de atos de violência política cometidos durante o regime militar.

O caput do Art. 1º inicialmente dá a entender que todos os crimes políticos ou conexos – de qualquer das partes conflagradas – teriam sido anistiados. Entretanto, o seu parágrafo segundo exclui as pessoas que já haviam sido condenadas pelos crimes ali relacionados. Mas em 1979, só haviam sido legalmente apurados os crimes de uma das partes, ou seja, os opositores do regime, militantes da luta armada, é que tiveram seus crimes investigados e processados.