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MPF denuncia autor de parecer contrário e que censurou politicamente o Festival de Jazz do Capão

Crime previsto na Lei Rouanet prevê prisão para servidor bolsonarista por discriminar projetos por motivo político

Festival foi censurado por servidor bolsonarista da Funarte por motivos ideológicos, o que é crime e por isso foi denunciado pelo MPF

O Ministério Público Federal (MPF) denunciou, nesta segunda-feira (20), à Justiça Federal do Rio de Janeiro, o ex-coordenador de Análise Técnica de Projetos Culturais do Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac) Ronaldo Daniel Gomes por crime previsto na Lei 8.313/1991, conhecida como Lei Rouanet. Gomes é o autor do parecer que reprovou o projeto Festival de Jazz do Capão, na Chapada Diamantina (BA) após os proponentes publicarem em rede social que o evento era um “festival antifascista e pela democracia”.

De acordo com o art. 39 da Lei Rouanet, “constitui crime, punível com a reclusão de dois a seis meses e multa de vinte por cento do valor do projeto, qualquer discriminação de natureza política que atente contra a liberdade de expressão, de atividade intelectual e artística, de consciência ou crença, no andamento dos projetos a que se refere esta Lei”.

Conforme apurou o MPF em procedimento criminal, Ronaldo Gomes era o responsável na Fundação Nacional de Artes (Funarte) por coordenar as análises técnicas dos projetos culturais apresentados no âmbito da Lei Rouanet. Nessa condição, em janeiro de 2021, recebeu o projeto referente ao Festival de Jazz do Capão e indicou  parecerista credenciada para emitir opinião técnica sobre a proposta.

Chapada Diamantina

Em fevereiro e março de 2021, a parecerista indicada emitiu pareceres favoráveis ao evento realizado na Chapada Diamantina, Bahia, pois, segundo ela, “o festival já estava em sua 9ª edição, era totalmente gratuito à população, promovia o intercâmbio com artistas de outras regiões e não teria por quê não habilitá-lo”.

Ouvida pelo MPF, a parecerista credenciada indicada também afirmou que, em 25 de junho, tomou conhecimento de que “o processo havia sido retirado de sua caixa” e que seu parecer fora substituído por outro.

A testemunha declarou, ainda, que desde 2015 está credenciada junto à Secretaria Especial de Cultura para emitir pareceres referentes a projetos de vários estilos musicais. Disse ainda que nem ela, nem outros pareceristas credenciados, fazem juízos estéticos, pessoais ou políticos a respeito dos projetos examinados.

Citações desconexas

Segundo a testemunha, o parecer de Ronaldo discrepa “totalmente” do padrão de pareceres na área. Conforme já noticiado, o parecer elaborado pelo denunciado apresenta citações desconexas a respeito da natureza divina da música e menciona post dos proponentes do projeto com os dizeres “Festival Antifascista e pela Democracia”, para justificar a reprovação da proposta.

“Verifica-se, assim, que o denunciado, no exercício da função de Coordenador de Análise Técnica de Projetos Culturais da Funarte, dolosa e conscientemente discriminou, por motivos políticos, o andamento do projeto “Festival de Jazz do Capão” (PRONAC 204126)”, afirma a ação do MPF.

Segundo a denúncia, “a discriminação consistiu na exclusão dolosa do parecer técnico favorável elaborado pela profissional designada, e na inclusão de seu próprio parecer, contrário ao projeto, apenas porque os organizadores do festival declararam, em rede social, que o evento era “antifascista e pela democracia” e que “não podemos aceitar o fascismo, o racismo e nenhuma forma de opressão e preconceito”.

Controle ideológico

Ao promover, na condição de servidor público responsável pela análise técnica dos projetos submetidos ao Pronac, o controle ideológico e político do evento “Festival de Jazz do Capão”, Ronaldo Daniel Gomes dificultou e impediu o andamento do projeto Pronac 204126, atentando contra a liberdade de expressão intelectual e artística dos proponentes e, incorrendo, com isso, nas penas do art. 39 da Lei Federal 8.313/91.

O MPF também apurou que o Festival de Jazz do Capão já havia obtido autorização para captação de recursos privados com base na Lei Rouanet em cinco outros anos, e que prestou contas na forma da legislação dos incentivos recebidos e dos eventos realizados.

Ouvido pelo MPF, Ronaldo afirmou que não recebeu ordem superior para excluir o parecer favorável elaborado pela profissional credenciada e substituir pelo de sua autoria.

Como o servidor não possui antecedentes criminais, o MPF apresentou, juntamente com a denúncia, proposta de transação penal a Ronaldo, consistente na prestação de 200 horas de serviços à comunidade.