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As vacinas de segunda geração que já estão no forno

Foto: Reprodução

Por Natalia Pasternak/Reprodução Ciência/O Globo

As vacinas que temos hoje para Covid-19 são vacinas de emergência. O que se esperava delas era que fossem minimamente eficazes, e seguras, com produção rápida, para conter o avanço feroz do vírus. Sabíamos que essas primeiras vacinas não seriam necessariamente as melhores, nem as mais adequadas para as diferentes realidades de cada povo ou país.

Levando isso em conta, tivemos muita sorte. Várias dessas vacinas foram sucessos nos primeiros testes clínicos, com eficácia muito maior do que ousávamos esperar. Mas isso não quer dizer que todas são adequadas para produção perene em todo o mundo. Agora, começam a surgir os primeiros embriões do que serão as vacinas de Covid de segunda geração: aquelas planejadas e produzidas com mais folga, levando em conta não só a eficácia e a segurança, que, claro, são essenciais, mas também as condições de transporte, aplicação e custo.

Por exemplo: um grupo da Universidade da Califórnia, em San Diego, nos Estados Unidos, desenvolveu uma plataforma vacinal baseada em vírus que normalmente atacam plantas ou bactérias. Essa plataforma usa os vírus como portadores de fragmentos do Sars-CoV-2, que devem provocar uma resposta imune em humanos, protegendo-nos da doença.

O projeto incorpora várias grandes sacadas. Primeiro, usar portadores que são fáceis de produzir. Isso facilita a manufatura, mesmo em locais que não tenham laboratórios altamente especializados e de segurança máxima. Plantas podem literalmente ser cultivadas para este fim, e fermentadores de bactérias são fáceis de construir.

Outra boa ideia foi que os pesquisadores usaram, como “carga” para esses portadores, pedaços da proteína S diferentes dos presentes nas primeiras vacinas. A proteína S é um bom alvo, porque dá uma boa resposta imune, mas também é a região que sofre mais mutações que dão origem às variantes. Os cientistas optaram por alvos diferentes, de regiões da proteína que se mostraram mais estáveis entre todas as variantes do Sars-CoV-2. E funcionou bem nos primeiros testes em animais, protegendo até contra outros coronavírus. Isso abre portas no futuro para uma possível vacina genérica para vários coronavírus ao mesmo tempo.

E os portadores, chamados nanocarregadores, resistem muito bem ao calor, eliminando a necessidade de uma cadeia de frio para o transporte da vacina. A resistência ao calor permite que a vacina seja aplicada via adesivos na pele, ou implantes, que liberam a formulação vacinal aos poucos. Com esse tipo de aplicação, pessoas em locais remotos poderão receber, até mesmo pelo correio, adesivos.

Projetos como este estão só no início. No caso destes nanocarregadores, os resultados em animais foram muito promissores, com boa quantidade de anticorpos gerados por injeção, adesivo e implante. Os pesquisadores ainda têm um longo caminho até chegar aos testes clínicos em humanos.

Agora, com a emergência já resolvida pelas primeiras vacinas, temos tempo de investir em estratégias mais criativas e adaptadas a necessidades locais. Com a vantagem de que cada plataforma vacinal nova que vier a ser validada para uma doença poderá ser aproveitada para outras. Os nanocarregadores de vírus de plantas e bactérias podem ser usados para carregar pedaços de outros vírus.

Estaremos mais preparados para emergências futuras. Logicamente, este preparo precisa de investimento de longo prazo em ciência e de visão estratégica. No momento, infelizmente, ao Brasil faltam as duas coisas.