Como podemos construir uma relação virtuosa entre desenvolvimentos tecnológicos e produtivos no Espírito Santo, assim como em outros Estados?
Reprodução: Jornal GGN
A necessária discussão no campo das políticas de inovação
por Rodrigo Medeiros e Luiz Henrique Faria
Tomamos conhecimento do ranking feito pelo Centro de Liderança Pública (CLP) sobre os empreendimentos inovadores em relação à população. O respectivo ranking considera o número de aceleradoras, incubadoras, parques tecnológicos e parques científicos associados à Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), por cada milhão de habitantes. O Rio Grande do Sul lidera o ranking e o Espírito Santo ocupa a posição 23 entre as 27 unidades federativas brasileiras. Faremos alguns breves comentários sobre o assunto.
No artigo científico “Indicadores de performance para núcleos de inovação tecnológica” (2023), publicado na Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, escrito por Luiz Henrique Lima Faria e outros acadêmicos, consta a comparação entre as exigências dos editais das fundações de amparo à pesquisa e as recomendações da literatura científica.
O artigo analisou a forma como a Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes) tem avaliado, em editais, os indicadores de performances dos núcleos de inovação tecnológica (NITs) capixabas. O diagnóstico dos autores merece reflexão, pois sugere a necessidade de ajustes na formulação e na avaliação de políticas públicas nessa importante área. Essa reflexão também interessa a outras unidades federativas.
Segundo os autores, “os resultados encontrados indicam a necessidade de atenção no que se refere à atividade de transferência de tecnologia, visto que, apesar de cada um dos NITs capixabas já possuírem um portfólio significativo de propriedades intelectuais protegidas, não houve a continuidade processual necessária para transformar essas inovações tecnológicas em produtos ou serviços a serem compartilhados com a sociedade”. Trata-se de um caso de oferta descasada das demandas das estruturas produtivas?
Como podemos construir uma relação virtuosa entre desenvolvimentos tecnológicos e produtivos no Espírito Santo, assim como em outras unidades federativas? Basta garantir recursos públicos para a produção de registros de patentes em escritórios de transferência de tecnologia para que o lado da oferta gere “um novo” ciclo de desenvolvimento?
A discussão sobre a baixa complexidade econômica da estrutura produtiva, que está associada ao baixo grau de sofisticação tecnológica do que é exportado pelo Espírito Santo, está presente entre nós. Todos sabemos que a industrialização substitutiva de importações ajudou a construir uma classe média e a urbanizar aceleradamente o Brasil na segunda metade do século XX. Esse processo, porém, carregou endogenamente as suas fragilidades ao longo do tempo.
O processo de desindustrialização vem ocorrendo desde meados da década de 1980 entre nós e quanto menos desenvolvido for um país, maior a sua dependência da exportação de produtos tomadores de preços nos mercados globais. As políticas públicas vigentes ainda estão reforçando, estruturalmente, um modelo econômico esgotado?
As experiências internacionais sobre boas práticas de proteção intelectual e transferência de tecnologia demonstram que a dinâmica virtuosa entre universidade, indústria e governo, interagindo para promover o desenvolvimento, não deve estar desvinculada dos interesses da sociedade. Registros burocráticos de proteção de propriedade intelectual não geram automaticamente resultados de desenvolvimento humano e econômico. Realizar ações para inflar indicadores não deve ser o caminho trilhado pelos governos subnacionais.
Há, portanto, o grande desafio de levar resultados reais para a sociedade a partir de uma estrutura produtiva de baixa sofisticação tecnológica e de organizações existentes que já consomem recursos públicos. As políticas públicas de apoio à inovação são importantes, porém elas se só se legitimam quando produzem resultados reais em termos da efetiva adoção de novas tecnologias.
Em economias de baixa sofisticação tecnológica, dificilmente se pode esperar resultados efetivos que confrontem estruturalmente as suas bases produtivas. Necessitamos de uma discussão ampla, para além de resultados burocráticos e de fins estatísticos, sobre como as políticas públicas poderiam ajudar a mudar esse quadro. Afinal, quais seriam as metas dessas novas políticas? A geração de empregos, a elevação da produtividade da economia, o apoio a políticas sociais, aumentar as exportações industriais?
Para Luiz Schymura, pesquisador da FGV/Ibre, em artigo publicado no Valor Econômico, no dia 2 de janeiro, ainda “não está claro como o Estado apoiará o setor industrial” na criação de mecanismos que tragam a “neoindustrialização” para o Brasil. A política monetária, por sua vez, continua hostil aos investimentos produtivos. Promover a diversificação produtiva para reduzir a dependência econômica de setores primários é algo necessário. Nesse sentido, segundo Schymura, “é fundamental aprimorar o ambiente socioinstitucional e político brasileiro para que a elaboração e o acompanhamento do cumprimento das metas tenham um caráter prioritário”.
Rodrigo Medeiros e Luiz Henrique Faria são professores do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes)