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Anistia Internacional: No Brasil, o racismo impulsiona a violência de Estado


Relatório traz maiores violações de direitos humanos de 2022/2023


Anistia Internacional aponta que o racismo das forças policiais brasileiras impulsionam a violência de Estado | Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Atentados a defensores de direitos humanos, episódios de violência política, homicídios ilegais ocorridos durante operações da polícia, situações de insegurança alimentar grave e de aumento da pobreza foram alguns dos problemas do Brasil levantados pela Edição 2022/2023 do Informe O Estado dos Direitos Humanos no Mundo, lançado nesta última terça-feira (28) pela Anistia Internacional.

A publicação reúne análises e insumos sobre a situação dos direitos humanos ao redor do globo. Na edição 2022/23, cerca de 156 países e territórios estão cobertos pelo relatório, entre eles o Brasil. O documento chama atenção para um “padrão duplo” dos países e Estados no que se refere à garantia dos direitos humanos e, consequentemente, o fracasso da comunidade internacional em se unir em torno de valores universais aplicados de forma consistente.

O relatório menciona as investigações ocorridas no Brasil sobre os assassinatos da vereadora Marielle Franco e do seu motorista Anderson Torres, que completaram cinco anos este mês, do jornalista britânico Dom Phillips e do indigenista brasileiro Bruno Pereira, ocorridos em 2022. A publicação trouxe ainda homicídios de outros defensores de direitos humanos, indígenas e ambientalistas. De acordo com o texto, até agora ninguém foi levado à Justiça pelo assassinato, no Pará, de três ativistas ambientais pertencentes à mesma família que protegia tartarugas na Amazônia. Leia a seguir a íntegra do relatório divulgado pela Anistia Internacional, em arquivo PDF:

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Brasil é líder mundial em assassinato de pessoas trans

O Brasil também continuou no topo da lista dos países com o maior número de homicídios de pessoas transgênero. De acordo com a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), pelo menos 140 pessoas transgênero foram mortas em 2021, último ano com dados disponíveis. De acordo com o informe, diversos homicídios continuaram sendo cometidos pelos órgãos policiais, em parte devido à “impunidade dos autores diretos” e da “não responsabilização” das pessoas que estão na cadeia de comando.

A Anistia Internacional mencionou três operações com a participação da Polícia Rodoviária Federal que resultaram na morte de 37 pessoas. “Em março, uma operação policial no bairro do Complexo do Chapadão, na cidade do Rio de Janeiro, deixou seis pessoas mortas. Em maio, 23 pessoas foram mortas em outra operação policial no bairro Vila Cruzeiro, também nesta capital. Essas operações policiais não seguiram as diretrizes estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal e foram realizadas apesar de um plano apresentado em março pelo governador do Rio de Janeiro para reduzir as mortes praticadas por policiais”, diz o documento.

Policiais brasileiros adotam práticas racistas

“O fato de as pessoas negras constituírem uma porcentagem desproporcional das vítimas é mais uma prova de que o racismo sistêmico e institucional continua sendo a causa da criminalização e do uso de força excessiva contra essas pessoas”, evidenciou a entidade, constatando que o racismo continuou impulsionando a violência do Estado.

O relatório ainda citou a violência política, através dos protestos de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro exigindo intervenção militar. “Em outubro, entre o primeiro e o segundo turno das eleições presidenciais, aconteceram pelo menos 59 casos de violência política. Vários episódios envolveram ameaças com armas de fogo, inclusive com a deputada Carla Zambelli apontando uma arma para um opositor político. Houve agressões físicas e verbais contra jornalistas, como a investida de um deputado contra a jornalista Vera Magalhães após um debate político”, diz outro trecho do documento.

Ataques à imprensa e negligência na crise climática

Incidentes de intimidação e violência por motivos políticos contra ativistas, defensores dos direitos humanos, jornalistas e eleitores que exerciam seu direito à liberdade de expressão, pensamento e crença aumentaram exponencialmente no período eleitoral. Segundo um levantamento do instituto de pesquisas DataFolha, 7 em cada 10 pessoas relataram ter medo de se expressar politicamente no país.

Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, entre janeiro e outubro a taxa de desmatamento na Amazônia brasileira atingiu seu maior nível desde 2015, com 9.277 km² de floresta destruídos na região conhecida como “Amazônia Legal”, uma área que abrange nove estados da Amazônia brasileira. Desastres causados pelos efeitos da mudança climática e pela omissão do Estado em adotar medidas adequadas e suficientes para mitigá-los continuaram a impactar desproporcionalmente as comunidades marginalizadas, as mais afetadas pela falta de políticas públicas de habitação, saneamento básico e infraestrutura, prossegue o documento.

Violência contra os indígenas

Entre janeiro e julho, a Comissão Pastoral da Terra registrou 759 ocorrências violentas, envolvendo um total de 113.654 famílias, e 33 assassinatos em conflitos relacionados à terra em áreas rurais do país. Comparado aos primeiros seis meses de 2021, o número de assassinatos teve aumento de 150%. Mais da metade dos conflitos ocorreu na região da “Amazônia Legal” e atingiu principalmente os povos indígenas e os quilombolas.

Em abril, o líder quilombola Edvaldo Pereira Rocha foi morto a tiros no Maranhão. Um suspeito foi preso e as investigações sobre os motivos e os mandantes do crime prosseguiam no fim do ano. Em maio e junho, respectivamente, dois indígenas Guarani-Kaiowá, Alex Lopes e Vítor Fernandes, ambos de 17 anos, foram mortos no Mato Grosso do Sul. Em setembro, Gustavo da Conceição, de 14 anos, do povo Pataxó, foi assassinado na Bahia. Até o fim do ano, ninguém havia sido levado à Justiça para responder pelos crimes.

Além dos constantes ataques às terras indígenas no estado de Rondônia, a Associação Hutukara Yanomami informou que a presença de garimpos ilegais na região está prejudicando a saúde dos povos indígenas. A Associação registrou a morte de nove crianças por doenças que poderiam ter sido tratadas com acesso adequado à saúde.