Com a sanidade mental já colocada em dúvida pelo jurista Miguel Reale Júnior, um dos autores do pedido de impeachment apresentado contra a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) apresentou nesta última segunda-feira, 22, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para impedir o presidente da República de governar, qualquer que seja ele, caso seja atestada sua incapacidade mental.
Joice, que já foi líder do governo de Jair Bolsonaro no Congresso, hoje atua na oposição ao Palácio do Planalto. A proposta foi batizada pela parlamentar como “PEC da Insanidade” e, embora não cite Bolsonaro, a proposta tem endereço certo. Na justificativa, a ex-líder do governo Bolsonaro defende a necessidade de mudar a Constituição pela “estabilidade política e segurança do regime presidencialista”.
Rainha louca
A deputada federal por São Paulo disse, na justificativa da sua proposta, que a história do Brasil tem “diversos episódios onde o primeiro dignitário da Nação se encontrou, de algum modo, incapacitado para o exercício de suas altas funções”. Entre os exemplos, citou o caso de Dona Maria I, apelidada de “Rainha Louca”, que chegou ao Brasil em 1808 e viveu no País durante oito anos.
Quando a sanidade mental de Bolsonaro foi questionada pelo jurista Miguel Reale, ele disse que Bolsonaro somente poderia ser considerado “inimputável”, por ter participado de manifestações contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), no auge da pandemia do novo coronavírus, se uma junta médica o considerasse como sendo um incapaz. Caso contrário deveria ser punido.
“Seria o caso de submetê-lo a uma junta médica para saber onde está o juízo dele. O Ministério Público pode requerer um exame de sanidade mental para o exercício da profissão. Bolsonaro também está sujeito a medidas administrativas e eventualmente criminais. Assumir o risco de expor pessoas a contágio é crime”, afirmou o jurista, naquela ocasião.
PEC da insanidade
Na proposta, batizada pela deputada PEC da Insanidade, é previsto que o vice-presidente da República, juntamente com 1/4 dos ministros, notifiquem os presidentes da Câmara e do Senado que o chefe do Executivo “está mentalmente incapacitado para o exercício do cargo”. O presidente, então, teria 15 dias para contestar a medida, mas ficaria suspenso do cargo durante o período.
A partir daí caberá ao Congresso, de acordo com o texto, decidir sobre a perda do mandato no prazo de até 30 dias, por dois terços de cada Casa, em votação nominal. Joice disse que a ideia surgiu na esteira da discussão sobre a aplicação da 25ª Emenda para afastar Donald Trump da presidência dos Estados Unidos, em janeiro, após a invasão do Capitólio. O instrumento legislativo norte-americano pode ser usado quando o presidente se mostra incapaz de desempenhar suas funções por doença física ou mental.
“Caiu a ficha de que a nossa Constituição não tem um remédio como esse. Não estou personalizando isso. Impeachment é o remédio para o caso de crime de responsabilidade”, disse a parlamentar em entrevista à imprensa.
Presidente louco
No site oficial da Academia Brasileira de Letras (ABI) há um artigo imperdível, com o título “Presidente louco”. Nos seus parágrafos iniciais diz:
Não é a primeira vez. Tivemos mesmo uma Rainha Louca, Maria I, Rainha do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. Já tivemos presidentes considerados loucos. Um tinha olhar de doido, outro se comportava como tal. Mas Delfim Moreira, presidente entre 1918 e 1919, foi o único até agora a ser clinicamente considerado louco. Vice na chapa de Rodrigues Alves, Delfim Moreira assumiu a presidência por causa de sua morte, que teria sido vítima da gripe Espanhola.
Mas a loucura de Delfim Moreira era mansa. Às vezes colocava seu fraque, com todas as condecorações, preparado para uma solenidade que não havia. Certa vez, conta a lenda, foi visitado por Ruy Barbosa, mas ficou olhando atrás da porta, abrindo-a e fechando-a. O que teria feito Ruy Barbosa comentar: “Que estranho é o Brasil, onde até um louco pode ser presidente e eu não posso”, referindo-se à eleição presidencial que perdera.
Bolsonaro não sai à rua de fraque, mas provoca mais estragos apertando a mão de incautos. O Código Penal, no seu capítulo III, que trata “ Dos crimes contra a saúde pública”, o artigo 268 (infração de medida sanitária preventiva) define como crime “Infringir determinação do poder público destinada a impedir introdução ou propagação de doenças contagiosas.”
Como o presidente da República encarna o próprio poder público, estamos numa dessas enrascadas que só acontecem abaixo do Equador. Da mesma gravidade de termos um presidente que luta contra determinações de seu próprio governo, representado nesse caso pelo ministério da Saúde.