A entrevista que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) concedeu ao vivo para o apresentador bolsonarista José Siqueira Barros Júnior, mais conhecido como Sikêra Júnior, da TV A Crítica, de Manaus (AM), nesta última sexta-feira (23) foi um show de horrores de antiética. Além de deboche com os quase 400 mil mortos pelo novo coronavírus (Covid-19), ainda houve espaço para Bolsonaro fazer piada homofóbica em relação à um garçom da emissora de televisão e de citar indiretamente, de forma debochada, adversários políticos.
A expressão “CPF Cancelado” normalmente é utilizada por policiais que participam de grupos de extermínio, por milicianos e ainda por criminosos quando assassinam um integrante de facção rival. Não é uma frase utilizada no meio acadêmico ou de pessoas cultas. A foto, que Bolsdonaro tirou após a participar do programa com toda a equipe de produção de Sikêra, com a reprodução ampliada do documento da Receita Federal com a legenda “CPF cancelado” gerou fortes críticas de deputados federais e senadores da oposição.
Reações
A deputada federal Sâmia Bomfim (Psol-SP) usou as suas redes sociais para expressar: “Quando te perguntarem o que é genocídio, mostre esta foto: com o país se aproximando de 400 mil mortos, quem deveria estar trabalhando pela vacina apareceu com uma placa que diz “CPF cancelado””. Já a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB) disse no Twitter: “É muito mais grave do que parece. Bolsonaro não apenas ironiza mortes. A placa “CPF Cancelado” é usada por grupos pró-violência e extermínio policial. Ou seja: Bolsonaro defende publicamente essas práticas
A deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL/RS) disse nas redes sociais: “Foto oficial do Palácio do Planalto. Sabe o que significa CPF cancelado? Titular falecido. É assim que Bolsonaro ri das quase 400 mil vidas perdidas por Covid-19 no país. Desprezo sem tamanho por um Brasil em luto. O lugar dessa extrema-direita é agora e no lixo da história!” Outros parlamentares também fizeram críticas do deboche de Bolsonaro ao sentimento de milhares de famílias enlutadas pela incompetência de Bolsonaro em ter agilizado à compra de vacinas ainda no ano passado.
Mau caráter negacionista
Sikêra Júnior se notabilizou desde o início da pandemia em ser um mau caráter negacionista do vírus, até que contraiu o Covid-19 e, mesmo assim, continua criticando o uso de máscaras de proteção, de distanciamento social e da adoção de um lockdown nacional para conter a expansão dos contágios e mortes. O apresentador, cujo programa faz parte da grade da Rede TV, emissora que também apóia Bolsonaro, é um pernambucano de Palmares, onde nasceu em 17 de junho de 1966.
Em março de 2020, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Amazonas (SJP-AM) divulgou uma nota de repúdio contra Sikêra Júnior, após o apresentador fazer ataques à imprensa. “A fala do apresentador de TV agride a função social e a ética do Jornalismo e os jornalistas; tenta enquadrá-los em uma percepção reducionista e deformada do que é o exercício jornalístico ao afirmar que na maioria das redações dos jornais e das TVs tem aqueles que ‘escrevem contra o País’ e ‘que só querem atrapalhar’”, diz trecho da nota.
“Mais do que isso, propõe a forma mais primária de manipulação da informação, que é tudo o que Jornalismo não é: colocar pessoas favoráveis a uma ideologia para trabalharem, supostamente, em favor dela”. Após a nota, o apresentador expôs a presidente do sindicato em rede social dizendo: “Essa é Dora Tupinambá, presidente do Sindicato dos Jornalistas do Amazonas. A que fez nota de repúdio contra mim! Tá explicado”. O comentário é devido a duas fotos de Dora Tupinambá, com as legendas que dizem: “Mulher não vota em Bolsonaro” e “#EleNão” Em uma terceira imagem tem uma publicação do SJP-AM com a imagem de Marielle Franco”, vociferou o apresentador bolsonarista.