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Casagrande anuncia nesta quinta instalação do Big Brother no ES, como preconizado por George Orwell

O controle de todos os passos do cidadão foi previsto pelo escritor George Orwell em 1949, quando publicou o livro “1984

O governador do PSB capixaba, Renato Casagrande, anunciou que lançará nesta quinta-feira (13), em cerimônia a ser realizada no São Tiago, no Palácio Anchieta, às 14 horas, o programa Cerco Inteligente. O sistema é questionado porque além de promover um monitoramento dos veículos, passa a ser na prática o verdadeiro Big Broher ou Grande Irmão, preconizado no livro “1984” do escritor Geroge Orwell. Com as placas dos carros será possível controlar para onde vai e para onde vem os inimigos políticos e opositores em geral.

Convite feito pelo governo estadual para o sistema de monitoramento das principais avenidas e estradas estaduais

O capixaba que sair de carro nas ruas vai ter todos os seus passos monitorados pelo governo do Estado, desde a saída de casa até o retorno, com o novo sistema denominado de Cerco Inteligente. O governo estadual está investindo mais de R$ 160 milhões para colocar em prática o Big Brother preconizado no famoso livro “1984” do escritor inglês George Orwell. O sistema é apresentado pelo governo estadual como um modelo para o combate à criminalidade, à evasão fiscal e ao desmatamento, mas é o modelo perfeito para monitorar os passos dos inimigos políticos e os oposicionistas em geral. O monitoramento será em todo o Estado, com milhares de câmeras.

A Prefeitura de Vitória (PMV) que já instalou o monitoramento sem ter debatido com os moradores, com o nome de Cerco Inteligente, garante que “é possível descobrir os lugares por onde ele (o contribuinte) passou em Vitória nos últimos meses, os horários e dias em que mais circula em determinado local, o percurso que mais costuma fazer e até mesmo se há outros veículos que estão sempre próximos a ele”. O sistema em Vitória apenas monitora os veículos e não se importa com os assaltos, roubos ou crimes diversos que acontecem sob essas câmeras exclusivas para vigiar a circulação de carros. O sistema de monitoramento teve Edital 021/2020 do Detran-ES, que foi suspenso pela Justiça por irregularidades, e que é o responsável pelo sistema de monitoramento total do cidadão, em arquivo PDF:

Edital_021_-_Cerco_Inteligente_Processo_2019-3B685

Monitoramento e negativa para cópia de vídeo

Há casos concretos em Vitória que provam que o monitoramento é exclusivo para vigiar os passos do cidadão a bordo de um veículo, como são os constantes arrombamentos no Centro Histórico de Vitória. Moradores da Rua Gama Rosa, Praça Ubaldo Ramalhete Maia, Rua Coronel Monjardim e Praia da Igreja do Carmo relatam que os constantes roubos e crimes diversos, devido a falta de ação da Guarda Municipal, são registrados pelas câmeras especificas para vigiar os motoristas.

Com a inexistência das câmeras comuns de monitoramento, ao solicitar o vídeo do crime a Prefeitura se nega a fornecer cópia. Apenas na Rua Gama Rosa esquina com a Rua Doutor Azambuja há quatro dessas câmeras e nenhuma que ofereça utilidade aos moradores vítimas de violência. Na Praça do Carmo há mais quatro e na Praça Ubaldo Ramalhete Maia outras três câmeras de monitoramento de veículos.

Daí veio o questionamento se as tais câmeras são exclusivas para bisbilhotar a vida das pessoas. No último dia 15 de dezembro a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) – órgão do Ministério Público Federal – oficiou o ministro da Justiça e Segurança Anderson Torres e deu  prazo de 10 dias para que a pasta preste esclarecimentos sobre pedido de informações voltado ao monitoramento de movimentos sociais em Goiás. No documento, o procurador federal dos Direitos do Cidadão, Carlos Alberto Vilhena diz que ‘causa perplexidade’ tal iniciativa de monitoramento, ‘em caráter ordinário, sem registro de qualquer anormalidade que justifique esse controle’.

No ofício, Vilhena destacou que os movimentos sociais ‘são expressão central da democracia e constituem atividade protegida por uma ampla gama de liberdades expressamente asseguradas na Constituição Federal’. O procurador diz que, segundo a Constituição, a não ser que se demonstre a existência de ‘fundadas suspeitas’ de que as reuniões do movimento ‘se destinam a fins ilícitos, ou de eventual caráter paramilitar da organização’, é vedado ao Estado interferir em seu funcionamento.

Na ocasião da publicação do Edital de Pregão Eletrônico 021/2020, o governador do PSB, Renato Casagrande, ignora o monitoramento com controle total do cidadão e prefere falar apenas sobre a outra vertente do serviço de bisbilhotice: “Estamos publicando esse edital para incorporar tecnologia no combate à criminalidade. Não é uma tarefa fácil devido a audácia dos grupos criminosos e até pela capacidade de aquisição de armas e equipamentos que os criminosos têm. Por isso, temos que estar um passo à frente e usar a tecnologia para inibir esses atos criminosos. O Cerco Inteligente já é usado na cidade de Vitória e agora será estendido primeiramente para a Região Metropolitana. As faixas de pedestres e balanças de cargas serão monitoradas, bem como toda a vigilância da Fazenda e do Meio Ambiente voltadas à proteção dos capixabas”, disse o governador do PSB capixaba.

Monitoramento do “Grande Irmão”

O portal de notícias Diário do Centro do Mundo (DCM), em um texto assinado pelo jornalista Pedro Rafael Vilela produziu o texto a seguir. No romance “1984”, escrito por George Orwell, o Big Brother, ou Grande Irmão, é o personagem ao mesmo tempo oculto e onisciente em uma sociedade marcada pela vigilância total do Estado sobre os cidadãos. A clássica obra distópica do escritor britânico já deixou de ser um horizonte distante e sombrio. As tecnologias de vigilância, aplicadas sobretudo na segurança pública, estão se convertendo em uma ferramenta de monitoramento em massa da população, com riscos não apenas para a privacidade das pessoas, mas para o própria democracia.

Recentemente o portal de notícias The Intercept Brasil rinformou que o Ministério da Justiça e Segurança Pública do governo Bolsonaro estava expandindo um sistema de inteligência artificial, batizado de Córtex, que usa milhares de câmeras rodoviárias espalhadas pelo país para monitorar placas de veículos e, com isso, obter informações em fração de segundos sobre os deslocamentos de qualquer pessoa. As informações são cruzadas com bancos de dados do governo federal, que por sua vez acessam registros pessoais dos indivíduos.

Mas o Córtex não é o único. Um levantamento do Instituto Igarapé mapeou ao menos 47 sistemas de reconhecimento facial já em operação no Brasil, utilizados em dezenas de cidades. Na maior parte dos casos, são câmeras que monitoram o sistema de transporte urbano (em ônibus e metrôs) e a circulação de veículos, seguido do uso aplicado na segurança pública, como sistemas que identificam possíveis pessoas implicadas com a Justiça. Há casos até de uso de vigilância com reconhecimento facial utilizado em escolas para monitorar e prevenir a evasão escolar.

Modelo chinês de vigilância em massa

Esse tipo de tecnologia vem sendo empregada desde 2011, mas se tornou ainda mais popular em 2019 com o governo de extrema direita de Bolsonaro. Pouco depois da posse, Bolsonaro um grupo de deputados e senadores da sua base de sustentação no Congresso Nacional fez uma viagem à China para conhecer o sistema de vigilância em massa adotado pelo país, que usa tecnologia de reconhecimento facial com imagens obtidas por mais de 170 milhões de câmeras espalhadas pelo território do gigante asiático. A justificativa, claro, era sua aplicação em políticas de segurança pública.

“As tecnologias de vigilância trazem uma série de riscos pra diversos direitos. Isso é cada vez mais reconhecido e debatido entre acadêmicos e ativistas de direitos humanos no mundo inteiro. Elas ameaçam, por exemplo, o direito à privacidade, o direito à autodeterminação informativa, que fala da capacidade do cidadão exercer controle sobre seus dados pessoais, sobre como eles estão sendo tratados, para qual finalidade e, eventualmente, até demandar que aquele tratamento se encerre”, analisa Gustavo Ramos Rodrigues, pesquisador do Instituto de Referência em Internet e Sociedade (Iris).

“Não sabemos, por exemplo, a que finalidades a que esse tratamento, de fato, se destina. Nós não sabemos que autoridades estão tendo acesso a esses dados pessoais e nós não sabemos quais são os mecanismos que estão sendo colocados ali para evitar, por exemplo, um vazamento de dados, um uso indevido, um acesso não-autorizado e por aí vai”, acrescentou.

Destrói direitos do cidadão, sem revolver violência

Na opinião de Helena Martins, professora da Universidade Federal do Ceará (UFC) e coordenadora do Laboratório de Pesquisas sobre Tecnologia, Políticas e Economia da Comunicação (Telas), esse “vale tudo” pela segurança pública, além de violar direitos, não tem tido eficiência em resolver o problema da violência urbana, como se propõe.

“Me parece fundamental questionar a capacidade execução desse monitoramento, a forma como isso é feito, o que é produzido em termos de políticas públicas a partir das informações que são coletadas, e mesmo quanto que é gasto e qual a efetividade da implementação desse tipo de política. Além, é claro, de outras questões, como a importância de medidas preventivas, a questão das desigualdades, medidas estruturantes pra gente enfrentar efetivamente a questão da segurança pública”.

Uso indiscriminado da vigilância do cidadão

Para Gustavo Ramos Rodrigues, há uma ameaça real para o exercício das liberdades democráticas com o uso indiscriminado e sem qualquer controle social dessas tecnologias de vigilância. Uma delas é o que se chama de direito inibitório, que é quando uma pessoa, tendo ciência que está sendo vigiada, se torna menos capaz de se expressar plenamente porque sabe que, especialmente quando a vigilância vem de uma autoridade, o comportamento pode gerar um sanção.

“As tecnologias de vigilância também trazem riscos para a liberdade de associação e de reunião, para o direito ao protesto, quando nós pensamos, por exemplo, que uma pessoa pode deixar de ir numa manifestação política, a um protesto, porque ela sabe que, ao ir naquele ato, ela está sujeita a ter um dado de localização, ou a ter uma imagem capturada, registrada e, posteriormente, num contexto em que há práticas antidemocráticas acontecendo, ter aquele dado sendo utilizado para algum tipo de perseguição política ou sendo acessado indevidamente por terceiros”.

Um dos casos mais explícitos de vigilância em massa vem sendo adotado no Ceará, com mais de 3,5 mil câmeras instaladas em todo o estado, sendo 2,5 mil apenas ne capital, Fortaleza. O governo do estado também possui uma versão local do Córtex, que se chama SPIA (Sistema Policial Indicativo de Abordagem), e também coleta dados de reconhecimento facial utilizados por policiais em abordagens e diligências.

O Brasil conta com uma Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que afirma a proteção de dados pessoais como um direito, mas vem sendo ignorada por governos estaduais que fingem se preocupar com a “segurança” coletiva, mas adotam a prática de monitoramento intenso da vida privada do cidadão. Os governantes totalitários se aproveitam de uma brecha no artigo 4º da LGPD, que abre uma exceção para o uso de dados na segurança pública, mas prevê, nestes casos, a adoção de uma legislação própria que cumpra os mesmos princípios da Lei Geral.

“Qualquer lei que trata de dados na segurança pública deve seguir os princípios da LGPD, como finalidade, proporcionalidade, segurança dos dados, necessidade de consentimento, uso sempre muito restritivo. São questões que me parecem importantes e que vão de encontro dos sistemas como o Córtex ou mesmo o sistema aqui no Ceará”, afirma Helena Martins, da UFC.

“Um ambiente democrático precisa de uma série de coisas para se desenvolver de forma saudável. Precisa de transparência, de privacidade, de liberdade de expressão. As pessoas precisam ser capazes de se opor ao governo sem sofrer sanções públicas por isso. A tecnologia, ela não só pode como muitas vezes é usada no mundo inteiro por governos com tendências autoritárias e antidemocráticas para suprimir as liberdades da população. Então, é preciso que haja um controle social muito forte sobre essas ferramentas, e extrema cautela no uso delas. Caso contrário, a própria democracia fica em risco”, afirma Rodrigues, do IRIS.

Reações da sociedade civil no mundo

Em todo mundo, cresce uma reação da sociedade civil organizada contra o uso do reconhecimento facial em massa, que tem se expandido para formas de controle das próprias cidades, em movimento inverso ao que vem acontecendo no Brasil. Os danos potenciais e essas iniciativas de vigilância em massa levaram a cidade de São Francisco, nos Estados Unidos, a banir o uso de tecnologia para fins de vigilância, uma espécie de “moratória” sobre esse tipo de política de segurança pública. A empresa de tecnologia IBM também anunciou recentemente que vai deixar pesquisas, desenvolver e oferecer tecnologia de reconhecimento facial.

“Estamos caminhando cada vez mais para um Big Brother, vigilantista, autoritário e sem nenhum diálogo com a população sobre essas políticas”, aponta Helena Martins. Uma outra característica preocupante no uso dessas tecnologias de reconhecimento facial e vigilância é que elas reproduzem um lógica de discriminação já praticada historicamente.

“Do ponto de vista da tecnologia, embora haja esse ideário de que e sempre muito bom, moderno e neutro, várias pesquisas no mundo inteiro têm mostrado que as tecnologias não são neutras, elas incorporam um viés de classe, de raça e de gênero”, afirma Helena Martins. “É muito difícil que uma pessoa branca, rica seja objeto de um reconhecimento facial por um celular de um policial, ao passo que nós sabemos que uma abordagem dessa é bem mais factível no caso de uma pessoa jovem, pobre e negra”, completa.

Sobre isso, a relatora Especial das Nações Unidas sobre formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância relacionada, E. Tendayi Achiume, chegou a produzir um relatório intitulado “Discriminação racial e tecnologias digitais emergentes: uma análise dos direitos humanos”. No documento, ela pede que haja avaliações obrigatórias de impacto nos diretos humanos como pré-requisito para a adoção de novas tecnologias de vigilância, uma forma de conter o aprofundamento do preconceito e das desigualdades.