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Caso Samarco: Justiça determina suspensão de toda a propaganda da Fundação Renova


Dados de campanhas publicitárias não são apresentados de forma transparente, clara e objetiva e violam acordos que criaram a fundação


Caso Samarco – Justiça determina suspensão de toda a propaganda da Fundação Renova | Foto: Arquivo/Antonio Cruz/Agência Brasil

As instituições de Justiça que atuam no caso Samarco – Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU), Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DPMG), Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPES) e Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) – obtiveram uma liminar, em ação civil pública, que obriga a Fundação Renova a suspender a divulgação de toda e qualquer propaganda veiculada ou patrocinada por ela.

A medida deve ser tomada até que seja criada uma política interna de divulgação de informações que se estabeleça em premissas de qualidade e confiança, cujas diretrizes se pautem em conteúdo informativo, de forma a orientar as comunicações institucionais a serem realizadas pela fundação. Essa nova política de comunicação deve ser apresentada em até 60 dias à Justiça Federal.

A decisão foi expedida depois que as instituições de Justiça, em julho deste ano, reiteraram o pedido liminar, em razão da insistência da Fundação Renova em continuar com a política de comunicação irregular. No documento enviado à Justiça, é informado que, somente entre janeiro e maio deste ano, a Fundação Renova gastou a quantia de R$ 4.497.587,01 em investimentos de mídia. O valor teria sido gasto na contratação de inserções em diversos veículos de mídia, entre eles duas grandes rádios de Belo Horizonte que, juntas, receberam mais de R$ 600 mil.

Até ser definida e aprovada essa nova diretriz, a Fundação Renova está impedida de repassar ou realizar novos gastos ou despesas, independente da natureza da verba empregada – administrativa ou finalística –, com propaganda ou publicidade, bem como de veicular ou patrocinar propaganda por rádio, televisão, jornais, revistas, sites, redes sociais, aplicativos de mensagens (Whatsapp etc.) ou qualquer outro meio, físico ou digital.

De acordo com a decisão liminar, em até 15 dias, a fundação deve tomar as providências necessárias para suspender as ações de divulgação e impulsionamento. No caso de conteúdo já disponível em suas redes sociais, a Fundação Renova deve manter disponíveis apenas informações escritas de nítido caráter informativo e objetivo que não traga qualquer tipo de marketing ou autopromoção. Os vídeos deverão ser retirados de todas as suas redes sociais, ao menos, temporariamente.

Em caso de descumprimento, foi estabelecida uma multa no valor de R$ 10 mil por peça de informação veiculada.

Falta de transparência

Na decisão, a 4º Vara Federal Civil e Agrária de Belo Horizonte concordou com as provas apresentadas pelas instituições de Justiça de que a Fundação Renova não cumpriu o dever de informar estabelecido no Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) e no TAC-Gov. “As provas documentais apresentadas pelas instituições de Justiça indicam neste juízo de cognição sumária que a Fundação Renova não desempenhou corretamente as obrigações assumidas por ela nos instrumentos coletivos. Os acordos extrajudiciais são explícitos, como supramencionado, quanto à necessidade da informação disponibilizada pela Fundação ser ‘ampla, transparente, completa e pública’”, diz trecho da liminar.

Além disso, segundo a Justiça Federal, há claros indícios de autopromoção da Fundação Renova, o que não pode ser tolerado. “A Fundação Renova não precisa de slogan e campanha de marketing com a promoção de suas ações. Seu papel é meramente executor e sua natureza transitória. A fundação não constitui um fim em si mesma e não dispõe de direitos próprios.

Há um duplo desvio das verbas que poderiam ser gastas na reparação. Primeiro, com a criação de campanhas publicitárias e vinculação em redes de comunicação, com alto custo. Segundo, há o dispêndio de dinheiro com a própria da defesa da Fundação Renova, quando na verdade, é evidente que ela não tem interesses jurídicos próprios a proteger. Os seus interesses jurídicos e direitos são bastante limitados dada a sua natureza instrumental, executória e transitória.”

Desvio de finalidade

A decisão liminar ainda analisa um vídeo veiculado pela Fundação Renova sobre pagamento de indenizações, em que descumpre todas as regras do TTAC. A informação acerca do pagamento de indenizações é imprecisa, pois no áudio da peça a fundação trata de indenizações a 320 mil pessoas, mas não indica se os auxílios financeiros de subsistência e emergenciais estão inclusos.

Por outro lado, a informação na tarja superior do vídeo quanto à indenização engloba também os auxílios financeiros “Há nítida imprecisão, que não permite segurança e confiança na propaganda formulada, a qual deveria ser clara e objetiva. (…)há desvio de finalidade já que o gasto com a informação se tornou gasto de publicidade e autopromoção, o que não pode ser tolerado. Há evidente dispêndio de recursos que poderiam ser direcionados aos atingidos, o que impacta o processo de reparação”, ressalta a liminar.

A ação

A ação civil pública, ajuizada em maio de 2021, quando a tragédia tinha completado cinco anos, pedia que fosse impedida a divulgação de todo e qualquer material publicitário ou propagandístico pela Fundação Renova, em especial os divulgados sob as rubricas “Da reparação até aqui”, “Expedição Rio Doce” e “Conteúdo de marca – site UOL”, e quaisquer outras assemelhadas que ainda se encontrassem no site da fundação.

De acordo com as instituições de Justiça, o material questionado na época continha “informações imprecisas, dúbias, incompletas ou equivocadas”, e noticiavam o restabelecimento de uma normalidade inexistente, em temas fundamentais para a população, como a qualidade da água e do ambiente aquático, recuperação de nascentes e bioengenharia, recuperação econômica, indenização, reassentamento e concentração de rejeitos.

A ação apontava que a realidade vivida diuturnamente pelas comunidades ribeirinhas de Minas Gerais e do Espírito Santo não encontrava correspondência com o conteúdo do material publicitário produzido pela Renova, no qual “vídeos de qualidade hollywoodiana” e textos laudatórios afirmam que, na época, “o dano ambiental seria imperceptível” e “5 anos depois, a vida de todos voltou ao normal”.

Além disso, as instituições de Justiça também questionavam os gastos feitos pela Fundação Renova com a publicidade. Até 2021, a fundação havia gastado R$ 28,1 milhões em publicidade, sendo R$ 0,3 milhões em 2018, R$ 6,7 milhões em 2019, R$ 17,8 milhões em 2020 e 3,3 milhões em 2021. Os valores adquirem especial relevância quando se constata que foram gastos em detrimento de diversos programas cuja execução é a única razão da existência da Renova.

Um outro exemplo citado na ação era o do valor de R$ 17,4 milhões gastos com a campanha veiculada em 2020, que eram superiores ao valor individualmente gasto em 13 dos 42 programas previstos no acordo que criou a entidade, conforme dados apresentados no site da própria fundação.

Serviço:

Ação Civil Pública nº 1023835-46.2021.4.01.3800

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