A opção de usar lona, ao invés das coberturas tradicionais e mais baratas, serviu apenas para gastar dinheiro público
A cobertura com lona importada no Terminal de Itaparica, em Vila Velha (ES) não resiste às chuvas fortes. Só neste ano a lona apresentou problemas três vezes. Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Espírito Santo (Crea-ES) pediu a substituição da lona. “Por tudo o que constatamos, recomendamos que a estrutura do Terminal de Itaparica seja substituída totalmente ou parcialmente”, disse o presidente do Conselho, engenheiro Jorge Silva.
A decisão do Governo do Estado em colocar as lonas importadas da Alemanha, ao invés de utilizar as opções de cobertura mais baratas, provocou críticas entre os usuários daquele terminal que atende o sistema Transcol de Vila Velha. O Governo estadual já gastou até agora mais de R$ 26 milhões por causa da sua opção em colocar lona ao invés de um telhado convencional.
Inicialmente, o Terminal de Itaparica foi inaugurado, no dia 26 de abril de 2009, onde foram investidos aproximadamente R$ 12,4 milhões, para atender uma média diária de 60 mil passageiros. O dinheiro veio de recursos do erário público e um empréstimo contraído junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Naquela ocasião, a Ceturb divulgou que “a cobertura utilizava telhas autoportantes, que permitem grandes vãos e eliminam a necessidade de estruturas intermediárias de apoio. ” Em toda a fachada foram aplicadas chapas de alumínio alubond, uma moderna tecnologia que associa resistência e leveza. O fechamento lateral das marquises foi feito com brises metálicos, que favorecem a ventilação e a incidência de luz, contribuindo com a redução do consumo energético.
Próximo à Praia de Itaparica, onde há maresia e forte vento nordeste, o terminal não resistiu a sua primeira prova à tempestade e uma marquise do terminal desabou após uma chuva em 2013 e outra foi removida preventivamente em 2015. As linhas que operavam no terminal foram transferidas para o Terminal Urbano do Ibes, Terminal Urbano de Vila Velha e a rua em frente à Rodoviária de Vila Velha, gerando o caos para os usuários.
Para acertar o erro do projeto, o terminal foi reinaugurado em 25 de janeiro de 2021 após uma reforma que exigiu mais R$ 12,2 milhões de dinheiro público. Dessa vez foi adotada as lonas da empresa alemã. “Ele (o terminal reconstruído) começa a operar nesta segunda-feira e nos enche de orgulho por ser um terminal moderno e com uma arquitetura linda. Essa obra mostra que uma de nossas prioridades é o transporte público da Região Metropolitana”, afirmou na ocasião o governador Renato Casagrande (PSB).
Em comunicado à imprensa, naquela ocasião, a Ceturb disse: “A tecnologia utilizada na nova cobertura é mesma aplicada em obras de grande porte em todo o mundo, como a cobertura do Estádio Maracanã, no Rio de Janeiro, no novo paddock do Circuito de Interlagos, em São Paulo, além da Estação de metrô de Frankfurt, Estação de Berlim e em vários terminais rodoviários na Europa.”
IPT apontou deficiência da lona do Maracanã em 586 pontos
O Estádio do Maracanã também foi alvo da opção equivocada de utilizar lona ao invés de outro tipo de cobertura mais barata. Em maio de 2017, antes de reinauguração do Terminal de Itaparica, o Instituto de Pesquisas Tecnológicas da USP (IPT) elaborou o seguinte laudo técnico: “A lona da cobertura do Maracanã está repleta de danos. A queima de fogos do encerramento da Copa do Mundo de 2014 causou os primeiros estragos. E o documento revela que o prejuízo ficou ainda maior depois das quatro cerimônias com fogos de artifício nos Jogos Olímpicos.”
E o estudo do IPT ainda trouxe a constatação de outros rasgos na lona do Maracanã, como arranhões e outros danos não relacionados a queimaduras, chegando a um total de 586 pontos em que a lona está danificada. A lona da cobertura do Maracanã, assim como do Terminal de Itaparica, é uma membrana de cerca de 3 milímetros de espessura, com durabilidade prevista de 35 anos. É formada por três camadas: uma interna, de fibra de vidro, que recebe os esforços de tensão e fixação da cobertura; e duas camadas de proteção.
Tempestades de janeiro e fevereiro de 2024
Mais uma vez a lona do Terminal de Itaparica não resistiu as fortes tempestades dos primeiros meses deste ano e promoveu rasgos. O primeiro foi em janeiro último e o segundo foi devido a uma enorme bolha, com milhares de litros de água acumulada, em fevereiro. Na iminência de estourar e jorrar água em cima das pessoas que ali estavam, um passageiro a furou. Por isso, esse cidadão foi levado preso. Esses rasgões nesses dois primeiros meses deste ano exigiu gastar mais R$ 2 milhões de dinheiro público, com novos remendos da lona.
Averiguações do Crea-ES neste ano
Equipes do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Espírito Santo realizaram na manhã do dia 19 de fevereiro último uma vistoria no Terminal de Itaparica, em Vila Velha. A inspeção, feita com a participação da Comissão de Infraestrutura da Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales), teve como objetivo verificar as condições e apontar as medidas necessárias para garantir o pleno funcionamento e segurança dos usuários do terminal.
Os problemas nas membranas que cobrem o terminal rodoviário persistem desde 2021, segundo o Crea-ES. Nesse período, houve pelo menos cinco episódios importantes e, em pelo menos três deles, rompimento das estruturas. “Em todos esses momentos, o Crea-ES fiscalizou, vistoriou e orientou os responsáveis para a necessidade de uma solução definitiva visando a segurança dos frequentadores do espaço. No entanto, nos primeiros dois meses de 2024, a estrutura voltou a ceder por causa das chuvas, rompendo e provocando vazamentos e alagamentos no piso”, disse o presidente do Crea-ES engenheiro Jorge Silva.
Nessa vistoria foram identificadas mais uma vez avarias na membrana tensionada da cobertura do local, muitos pontos cobertos de maneira paliativa, com utilização de cola e adesivo, e rasgos de mais de 3 metros de comprimento. “Os locais onde já haviam sido feitas manutenções, próximos dos reparos da manta, foram novamente danificados. Há uma empresa trabalhando no local. Solicitaremos ao órgão responsável uma cópia do laudo que está sendo elaborado, os nomes e as Anotações de Responsabilidade Técnica (ARTs) dos responsáveis. Vamos apurar também se houve manutenção preventiva periódica e se, por ventura, ocorreram falhas nessas manutenções”, afirmou o representante do Conselho. engenheiro civil, ambiental e de segurança do trabalho Giuliano Battisti.
A recomendação do Crea-ES é por ações corretivas imediatas e pela adoção de um sistema de monitoramento constante do Terminal de Itaparica, caso seja mantida essa atual estrutura. “Nosso parecer preliminar é de que se for mantida essa estrutura, com esse tipo de membrana, será necessário adotar um sistema de acompanhamento diário do local, que passa diuturnamente por variações térmicas importantes, sofrendo impactos diretas do sol, da chuva e de fortes ventos”, concluiu Battisti.
Relatório conclusivo do Crea-ES
O Crea-ES concluiu na semana passada, em 7 de março, o Relatório de Vistoria Técnica do Terminal de Itaparica. O estudo, realizado por uma equipe multidisciplinar de profissionais do Conselho, foi demandado pela Comissão de Infraestrutura da Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Coinfra) devido aos últimos episódios de chuvas fortes que ocorrem na Grande Vitória, que causaram danos à estrutura do Terminal Rodoviário.
O relatório levantou questões como segurança dos cidadãos, projeto realizado, execução e fiscalização da obra. O trabalho do Crea-ES teve como propósito verificar o estado geral da cobertura do Terminal, identificar riscos e necessidades de intervenções de engenharia para resguardar a segurança dos usuários da área.
“Por tudo o que constatamos, recomendamos que a estrutura do Terminal de Itaparica seja substituída totalmente ou parcialmente”, concluiu o engenheiro Jorge Silva. O documento será encaminhado aos órgãos competentes para as providências necessárias.
Quais são os tipos de cobertura existentes no Brasil?
Segundo o Grupo MB – Projetos industriais de iluminação e ventilação natural a cobertura industrial de galpões, como é o caso do Terminal de Itaparica, “é uma etapa da construção que não pode ser negligenciada de forma alguma.” Além da atenção à qualidade dos materiais e à estabilidade da estrutura – de modo a evitar danos ou até mesmo seu colapso – é fundamental levar em conta o tipo de atividade que será desenvolvida na fábrica, diz a empresa de estudos técnicos.
“Há opções com diferentes valores no mercado, porém, o custo-benefício deve sempre falar mais alto. Naturalmente, um produto de qualidade superior terá um preço mais elevado, no entanto, o a segurança e o retorno do investimento compensam, já que você não terá dor de cabeça com necessidade de manutenções corretivas constantes”, assinala o Grupo MB.
São citadas as opções, sem mencionar o uso de lona, como as coberturas metálicas, que são bastante recomendadas e utilizadas na construção de galpões. “Antigamente restritas a obras de grande porte, as coberturas metálicas hoje também são escolhidas para diversos projetos de retrofit industrial em fábricas menores e quadras poliesportivas, por exemplo. Mais baratas e eficientes do que concreto armado, estruturas metálicas aliadas a bons projetos arquitetônicos ajudam a diminuir o custo total da obra e trazem bons resultados”, ensina a consultoria.
Outras opções
A cobertura em trapézio, onde “as telhas trapezoidais são um clássico na construção civil brasileira, bastante utilizadas em coberturas e fachadas de construções industriais e comerciais. ” Seu formato e alta capacidade de carga permitem vencer vãos maiores, sendo adequada em situações especiais de condições sobrecarga X vão.
Outra indicação são as telhas zipadas ou roll on, que são indicadas para coberturas de pouca inclinação e de extensões maiores (100m ou mais). No caso das telhas roll on, a indicação é da aplicação sobre um conjunto de treliças paralelas, dispostas em estrutura modular. “Nesse processo, os painéis – as telhas – podem ser confeccionados no local da construção. Há inclusive a possibilidade de realizar estar tarefa no nível da cobertura, a partir de bobinas de aço pré-pintado, galvanizado ou galvalume desenroladas e perfiladas in loco”, explica o Grupo MB.
Ainda há a citação da cobertura de concreto, que tem um peso maior do que as opções de cobertura metálica listadas anteriormente, o que tende a elevar o custo estrutural da construção – a fundação da obra. Como vantagens, as coberturas de concreto apresentam alta durabilidade, não sofrendo de corrosão nem oxidação, além de suportarem bem a ação do vento.
A lista cita ainda as coberturas em fibrocimento, que já tem “amplo uso tanto em projetos residenciais quanto comerciais e industriais, a cobertura de fibrocimento apresenta boa resistência às intempéries, sendo também uma opção versátil e de fácil manuseio e instalação. A desvantagem é que o fibrocimento tem baixa resistência térmica.”
Essas últimas telhas citadas são onduladas e em W, que permitem inclinações mínimas de até 5%. No entanto, recentemente o fibrocimento sofreu uma mudança em sua composição, já que a fibra utilizada para criar o material – o amianto ou asbesto – teve sua comercialização proibida no Brasil, sendo substituído pela fibra sintética de polipropileno.
As várias opções de cobertura, sem o uso de lona
- Telha Metálica Simples;
- Telha Termoacústica;
- Telha de Aço Colorida;
- Telha de Cerâmica;
- Telha de Concreto;
- Telha Esmaltada;
- Telha Shingle;
- Telha de Fibrocimento;
- Telha de Fibra Ecológica;
- Telha de Claridade;
- Telha de Pet;
- Telha de Polipropileno ou Policarbonato;
- Telha de PVC.