Após a rejeição no último dia 19 de julho e agressões verbais do vereador bolsonarista carioca Gilvan Aguiar Costa, vulgo “Gilvan da Federal” (Patriotas), o Projeto de Resolução (PR) 06/2021 da vereadora Camila Valadão (Psol) instituindo a Comenda Lula Rocha foi aprovado nesta última terça-feira (3). De 14 vereadores presentes no plenário da Câmara de Vereadores de Vitória, 10 ficaram a favor de instituir a nova comenda. Apenas quatro vereadores bolsonaristas ficaram contra. Na véspera a mesma comenda foi aprovada na Câmara de Vereadores de Cariacica e sem ataques bolsonaristas.
Os bolsonartistas contrários foram: o presidente do legislativo municipal da capital, o evangélico Davi Esmael (PSB); o policial federal licenciado Gilvan; o policial civil na ativa Leandro Piquet de Azeredo Bastos, vulgo “Delegado Piquet” (Republicanos) e Maurício Soares Leite (Cidadania). Os 10 a favor foram: Aloisio Varejão (PSB), Anderson Goggi (PTB), Andre Brandino (PSC), Armandinho Fontoura (Podemos), Camila Valadão (Psol), Dalto Neves (PDT), Denninho Silva (Cidadanbia), Duda Brasil (PSL), Karla Coser (PT) e Luiz Paulo Amorim (PV).
O PR 06/2021, que íntegra o processo 1522/2021 foi protocolado pela vereadora Camila Valadão no dia 25 de fevereiro e altera o artigo 1º, inciso I da Resolução nº 1.912, de 20 de maio de 2013, a fim de acrescentar a Comenda Lula Rocha. Ele foi um militante do movimento negro, da educação popular e dos direitos humanos e que morreu neste ano aos 36 anos. Lula Rocha era morador do Bairro Santana, em Cariacica. Era filho do ativista dos direitos humanos Isaías Santana e teve laços fortes com a cultura de Vitória. Além de ser um dos fundadores do Círculo Palmarino e de ter atuado na Coalização Negra por Direitos, teve participação expressiva no bloco AfroKizomba e na escola de samba Unidos da Piedade. A seguir veja quem votou a favor e contra.
1383984-202108031226128695Justificativa
Na sua justificativa, a parlamentar municipal do Psol diz: “O presente Projeto de Resolução visa incluir no rol de comendas a serem concedidas pela Câmara Municipal de Vitória a Comenda Lula Rocha, a ser entregue para personalidades que tenham se destacado na defesa da dignidade e emancipação do povo negro e da juventude negra. Luiz Inácio Silva da Rocha possui em sua trajetória imensa relevância por seu legado de luta em direitos humanos em solo capixaba. Nascido em 1985, seus pais Isaias Santana da Rocha e Maria da Penha Silva, homenagearam o líder popular, sindical que naquele momento trazia esperança para a classe trabalhadora, para os negros e pobres desse país, dando-lhe o nome de Luiz Inácio Silva da Rocha, antes mesmo de nascer já era chamado de Lula. ”
Na mesma justificativa, a vereadora lembrou que Lula Rocha era de família católica, seguiu os preceitos dessa religião, foi batizado, crismado e participou do grupo da perseverança e da pastoral da juventude, espaço eclesiástico que tão bem contribuiu para os primeiros passos de sua luta por direitos. “Já no ensino médio Lula Rocha iniciou a sua militância política organizando o Grêmio Escolar e na sequência foi estudar Geomática no antigo CEFETES, atual IFES, onde participou do movimento REBELE-SE, que era um movimento de defesa da Escola Técnica, no período do presidente Fernando Henrique Cardoso. Ainda na sua adolescência foi trabalhar como voluntário no Conselho Estadual de Direito Humanos”.
Lutas sindicais e contra o fascismo
Camila Valadão prossegue na sua justificativa: “Ao ingressar no CEFETES por meio do cursinho Universidade Para Todos da UFES, prestou vestibular para ciências sociais, passou, mas optou por ingressar no curso de direito na FAESA onde concluiu seu bacharelado. Já militante em várias frentes, como a estudantil, a de direitos humanos, a luta dos negros, dos cursinhos populares para o povo de periferia. Sua determinação e sua entrega à militância era familiar, seu pai, sua mãe, suas tias, sua irmã mais velha e seu irmão mais novo, visto que todos engajados na luta pelos Direitos Humanos, contra o racismo, contra a LGBTIfobias, nas lutas sindicais, populares e culturais”.
“Uma família e muitas lutas, garra, resistência, dedicação e comprometimento com o outro e outra, com a dor do outro e da outra com as suas próprias dores. Com essas vivências Lula Rocha foi pavimentando sua trajetória de luta e militância, adquirindo experiências e cada vez mais liderança nas organizações que participava. Quando assumiu a Secretaria Executiva do Conselho Estadual dos Direitos Humanos do ES, deslanchou sua atuação política e organizativa nas várias frentes de lutas dentro e fora do Estado, como também em nível internacional”, continua.
No Movimento Negro, Lula Rocha se destaca nacionalmente ao incidir na organização e liderança da juventude negra. Lula foi fundador do Fórum Nacional da Juventude Negra e coordenou o FEJUNES, um dos primeiros no Brasil. Criou a Rede Afirmação de Cursinhos Populares para jovens negros e de periferias na região da Grande Vitória, atuou junto ao movimento de mães e familiares vítimas de violência, na defesa dos familiares de vítimas de violência da greve da PM/ES, na coordenação do programa nacional da juventude do governo da ex-presidente Dilma Rousseff, o Juventude Viva, sendo um dos mentores da campanha nacional contra o extermínio da juventude negra. Atuou como conselheiro nacional do Movimento Nacional dos Direitos Humanos. Participou da articulação e da criação dos conselhos nacional, estaduais e municipais da juventude, da comissão nacional e estadual de enfrentamento e combate a tortura.
Luta pelos direitos humanos no exterior
Lula Rocha levou a luta por direitos humanos para outros países, quando participou da Encontro Internacional de Jovens Comunistas na África do Sul, do Pacto Mundial pelos Direitos Humano dos Refugiados e Imigrantes em Marrocos, além de diversas Conferências Latino-Americanas, Conferência da ONU para Direitos Humanos e da Comissão Americana de Direitos Humanos, Conferências internas da Juventude, de Combate ao Racismo, dentre outras conferências por todo país. No âmbito de organizações de proteção e defesa em direitos humanos, Lula Rocha presidiu o Conselho Deliberativo do Programa de Proteção à Criança e o Adolescente Ameaçados de Morte no ES, e foi coordenador do Centro Apoio aos Direitos Humanos/ES, entidade vinculada ao Movimento Nacional dos Direitos Humanos.
Por sua representatividade e na luta pela juventude negra, carregou a Tocha Olímpica, quando passou pelo ES, em nome da juventude capixaba. Estava atuando no último período na coordenação do Círculo Palmarino, na Rede Afirmação, no CADH, no Conselho Estadual dos Direitos Humanos e no Instituto Elimu. Estava compondo também a FAMOC, a Pastoral de Moradores de Rua e Vicariato para a Ação Social Política e Ecumênica da Arquidiocese de Vitória. Acompanhava de perto as lutas e debates nacionais a partir da Coalizão Negra por Direitos. Além do apoio às diversas lutas por Direitos Humanos, de modo que era a ele e a seu pai, Isaias Santana, que as organizações sempre recorriam.
No que diz respeito à cultura, especificamente o samba, Lula contribuiu com o fortalecimento dos blocos de carnavais no Centro de Vitória além de se fazer presente nos redutos da boemia na cidade. Lula Rocha estava presente nas rodas de samba, principalmente na Escola de Samba Unidos da Piedade como Ritmista, local onde se uniu com seu pai e mais alguns militantes da luta contra o racismo e criaram o bloco Social/Político/Cultural denominado “AFROKIZOMBA”. No Forte São João e Romão, Lula Rocha era folião assíduo na Escola de Samba Imperatriz do Forte e em Caratoíra e Morro do Quadro participando da bateria Escola de Samba “Chega Mais”. Grande parte da atuação e da incidência política de Lula Rocha se deu na cidade de Vitória. Sua contribuição na organização da luta pela juventude negra e pela defesa e proteção dos grupos historicamente violados fazia com que Lula Rocha fosse sempre chamado para entrevistas nos principais veículos de comunicação da cidade.
“A avenida Jerônimo Monteiro no Centro de Vitória foi um dos asfaltos onde pioneiramente foi organizada a Marcha contra o Extermínio da Juventude Negra no ES,e Lula Rocha como liderança do FEJUNES contribuiu para que tais violação ganhasse notoriedade na sociedade. A Praça Costa Pereira também foi espaço para ativismo e luta, com diversos atos em defesa e luta das juventudes, sobretudo a periférica e negra. Tantos outros territórios como Piedade, Romão, Caratoíra e Santo Antônio estava Lula Rocha no fronte dos movimentos e articulações comunitárias em apoio aos que sempre defendeu e lutou”, continua Camila Valadão.
“Homenagear Lula Rocha por meio da presente propositura é reconhecer e levar em frente sua voz, é fazer com que sua imensa e relevante contribuição alcance outras gerações e inspire no surgimento de outras lideranças capixabas na defesa e luta por direitos humanos. Assim, considerando a relevância do presente Projeto de Resolução ora apresentado e inexistindo qualquer vício formal ou material que impeça sua regular tramitação, submete-se a presente proposição à apreciação dos pares, dos quais se espera o apoio fundamental para a sua aprovação”, conclui a vereadora do Psol.