fbpx
Início > Debate sobre despejos lota Assembleia. Iriny conseguiu aprovar PL suspendendo despejos até final do ano

Debate sobre despejos lota Assembleia. Iriny conseguiu aprovar PL suspendendo despejos até final do ano

O plenário da Assembleia ficou lotado durante a sessão especial proposta pela deputada Iriny Lopes (PT) | Foto: Lucas S. Costa/Ales

Para evitar uma catástrofe de vir a ocorrer mais de 132 mil despejos de imóveis no Espírito Santo, tanto no campo quanto na cidade, a deputada estadual Iriny Lopes (PT) conseguiu aprovação do então projeto de lei (PL) 125/2021 e agora lei estadual 57/2022 (que depende apenas de vir a ser sancionado pelo governador do PSB Renato Casagrande). Para ser demonstrada a relevância da nova lei, que estende a suspenção dos despejos judiciais até o dia 31 de dezembro deste ano, foi realizada uma sessão especial no plenário da Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales) nesta última quinta-feira (24), com o plenário Dirceu Cardoso lotado.

O intuito da sessão especial foi o de debater a situação das famílias que correm o risco de despejo no Espírito Santo e no país. De acordo com dados da campanha Despejo Zero, o risco de remoções no Brasil subiu em torno de 600% durante a pandemia. Os números foram apresentados pela defensora pública do Núcleo de Defesa Agrária e Moradia (Nudam) da Defensoria Pública do Espírito Santo, Marina Dalcomo.

“A gente sabe que hoje, com base nos dados dessa campanha, são mais de 132 mil famílias ameaçadas de despejo e que estão em risco de realmente serem colocadas para fora das suas residências, caso não haja realmente alguma ação nesse sentido”, alertou. A proponente da reunião, deputada Iriny Lopes (PT), atestou a gravidade do problema, e fez comentário a aprovação do PL 125/2021, iniciativa de sua autoria que trata sobre o assunto.

“Essa semana nós tivemos uma vitória importante no Espírito Santo. Tem um decreto presencial que vencerá agora no dia 31 de março e que proíbe os despejos, em função da pandemia. Nós conseguimos aprovar aqui, na Assembleia Legislativa, a suspensão dos despejos no Estado do Espírito Santo até 31 de dezembro de 2022”, comemorou. A matéria seguiu para análise do governador Reanto Casagrande (PSB).

Guilherme Boulos participou virtualmente da sessão e alertou sobre os riscos no pós-pandemia de ocorrer um agravamento nos despejos | Foto: Lucas S. Costa/Ales

Alerta feito por Guilherme Boulos

Membro da Coordenação Nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e relevante filiado ao PSOL, Guilherme Boulos também participou, de forma virtual, do debate. O convidado se solidarizou com a situação dos mais vulneráveis. “Milhares de brasileiros têm de fazer a dura escolha no final do mês, entre pagar o aluguel ou botar comida na mesa da sua família. E é justamente por esse cenário, de gente que está sendo despejada, às vezes individualmente, sem barulho, sem ruído, que aumentou tanto a quantidade de sem teto nas ruas das nossas cidades”, avaliou.

Boulos destacou a necessidade de uma política pública mais justa e regrada, que defenda os interesses dos mais necessitados. “Existe um caminho pra que a gente consiga encontrar uma solução que seja razoável para o nosso povo. Não dá pra aceitar que se despeje ninguém sem alternativa de moradia nas cidades. Não dá pra aceitar que se despeje ninguém sem garantir uma gleba, um lote no campo, e isso se faz com política pública”, afirmou.

O convidado finalizou sua fala com um alerta. “Nosso povo, que já está sofrendo com a fome, com o desemprego, com a inflação, não pode sofrer com uma onda de despejos. Porque é isso que vai acontecer se não houver uma prorrogação da decisão do Supremo, ou se os outros legislativos do país não seguirem o grande exemplo, liderado pela deputada Iriny, aí no Espírito Santo. Nós vamos viver uma epidemia de despejos, a partir do mês que vem no Brasil, se isso não acontecer”, pontuou.

Muitos participantes da sessão especial levaram cartazes | Foto: Lucas S. Costa/Ales

Medida federal que suspende despejos vence na semana que vem

O representante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no evento, Rodrigo Gonçalves, falou em nome dos demais movimentos sociais e colocou o foco para a situação no Espírito Santo. “Com o fim dessa medida, que vence agora no dia 31, só no campo, só de família sem terra, são mais de 30 mil, que a qualquer momento podem ser despejadas. Aqui no Espírito Santo, o nosso acampamento em João Gomes, no município de Linhares, já foi notificado para desocupar a área onde está o acampamento produtivo”, lamentou.

A falta de investimentos em políticas públicas habitacionais preocupa o líder comunitário. “Não existe nenhuma política pública para resolver o problema do acesso à terra e à moradia. No passado já existiu, por exemplo, o ‘Minha Casa, Minha Vida’ acabou em 2014; de lá pra cá, nenhuma família sem-teto teve acesso à moradia, ao contrário, o que se veem são ameaças frequentes de despejo”, afirmou o líder do MST capixaba.

Déficit habitacional no Espírito Santo

A defensora pública Marina Dalcomo endossou a fala do representante do MST. “Apesar de já termos hoje 20 anos do Estatuto da Cidade, ainda existe um déficit habitacional aqui no Espírito Santo de mais de 200 mil famílias. A gente precisa olhar pro que passou e perceber que alguma coisa está acontecendo de errado”, apontou.

A advogada entende que é preciso aproveitar o momento em que a discussão está em foco para sensibilizar o judiciário. “Durante a pandemia, apesar de termos inúmeras questões negativas, um ponto positivo foi ter trazido à luz essa questão do despejo e a necessidade da gente lidar um pouco mais sobre essa questão. Inclusive trouxe ao Judiciário, que muitas vezes nem era tão sensível assim, a necessidade de avaliar melhor essa questão”, opinou Dalcomo.

A defensora é a favor da prorrogação da medida provisória que suspende as execuções das ações de despejo no país, mas entende que o problema deve ser encarado de forma a encontrar uma solução definitiva para que novas remoções não ocorram. “A gente precisa pensar soluções para conflitos fundiários. Tanto no âmbito urbano, como no rural, a gente precisa pensar em saídas que tragam esse acesso ao direito à moradia, de uma forma ampla e efetiva”, pontuou.

Membro da Defensoria Pública da União (DPU-ES), Antônio de Fonseca e Oliveira concordou com a defensora e disse apostar na força popular. “Eu, apesar de ser do ramo do direito, acredito muito mais na força popular do que no direito burocrático em si. Eu acho que a força popular consegue mobilizar tanto o Legislativo, quanto o Poder Judiciário”, comentou.


Quilombolas

A situação das comunidades quilombolas no Espírito Santo também foi tratada na reunião. “Eles vêm sendo vitimados há muito tempo. São comunidades que estão vivendo uma situação de vulnerabilidade extrema, sem acesso à água potável, sem nenhum tipo de apoio do poder público estadual, uma situação muito difícil”, expôs Mariana Dalcomo.

“Existem mais de 60 comunidades em todo o Espírito Santo e apenas uma até o momento foi titulada, ou seja, se não há território, não há proteção. A gente precisa lutar realmente pra que essas pessoas tenham acesso às terras, uma terra protegida e é preciso que o poder público estadual se comprometa com essa causa”, opinou a convidada.

A deputada Iriny Lopes também comentou o tema e reforçou a importância dos movimentos sociais. “Isso é o que o sistema capitalista produz para valorizar terra. Terra sempre teve valor. Por isso que tem tanta dificuldade na titulação das terras quilombolas. Imagina num país com fortes traços escravocratas como o Brasil, você dar terra pra preto. Imagina se a elite brasileira aceita isso com facilidade. Por isso a importância dos movimentos”, finalizou. 

Leia a seguir a íntegra da nova lei aprovada na Assembleia

A matéria foi aprovada em votação simbólica, no Plenário, na forma dos pareceres orais, em conjunto, das comissões parlamentares, na 17ª sessão ordinária, hibrida, virtual e presencial do dia 22/03/2022 e no mesmo dia o processo 2550/2021 contendo o então projeto de lei (PL) 125/2021 foi enviado para o governador Renato Casagrande (PSB) sancionar no prazo de15 dias úteis a partir do dia 24.03.2022, agora como Lei estadual 57/2022.

AUTÓGRAFO DE LEI Nº 57/2022

Dispõe sobre a suspensão do cumprimento de medidas judiciais, extrajudiciais ou administrativas em todo o Estado do Espírito Santo que resultem em despejo, desocupações ou remoções forçadas em tempos de pandemias e epidemias.

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 66 da Constituição Estadual e tendo aprovado o presente Projeto de Lei nº 125/2021, resolve enviá-lo a S. Exa., o Senhor Governador do Estado, para os fins constitucionais.

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

DECRETA:

Art. 1º Fica suspenso o cumprimento de medidas judiciais, extrajudiciais ou administrativas que resultem em despejos, desocupações ou remoções forçadas, em imóveis privados ou públicos, urbanos ou rurais, até 31 de dezembro de 2022, em todo o Estado do Espírito Santo.

Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, aplica-se a suspensão nos seguintes casos, dentre outros:

I – execuções de decisões liminares e de sentenças, em ações de natureza possessória, petitória e de despejo;

II– desocupações e remoções forçadas promovidas pelo Poder Público;

III– medidas extrajudiciais;

IV- autotutela;

V– remoções em imóveis públicos;

VI– imissão na posse que implique remoções.

Art. 2º A suspensão dos despejos ou remoções se aplica a imóveis que sirvam de moradia ou que representem área produtiva pelo trabalho individual ou familiar, e tem como objetivo evitar medidas que resultem em pessoas e famílias desabrigadas, bem como garantir a proteção do direito à moradia adequada e segura durante o período pandêmico que estiver instalado, promovendo:

I – a garantia de habitação, visando o cumprimento do isolamento social;

II – a manutenção do acesso aos serviços básicos de comunicação, energia elétrica, água potável, saneamento e coleta de lixo;

III – a proteção contra intempéries climáticas ou outras ameaças à saúde e à vida;

IV – o acesso aos meios de subsistência, inclusive o acesso a terra, fontes de renda e trabalho;

V – a privacidade, segurança e proteção contra qualquer tipo de violência;

VI – o serviço de moradia social;

VII – a proteção de segmentos mais impactados pela pandemia, tais como: os idosos, pessoas com deficiência, crianças e população em situação de rua, negros e negras, mulheres e LGBTQIA+.

Art. 3º Considera-se nula a medida judicial, extrajudicial ou administrativa que resulte em despejos, desocupações ou remoções forçadas de imóveis privados ou públicos, urbanos ou rurais, realizada durante todo o período de pandemia e epidêmico, ou enquanto vigorar o estado de emergência ou calamidade pública em função de Decreto Estadual que o reconheça.

Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Palácio Domingos Martins, 23 de março de 2022.

ERICK MUSSO

Presidente

DARY PAGUNG

1º Secretário

CORONEL ALEXANDRE QUINTINO

2º Secretário