Texto do Jornal da USP
As mudanças climáticas causadas pelo desmatamento e o fenômeno La Niña estão impactando diretamente as chuvas no Brasil. E, conforme especialista, o prognóstico não é bom: se a quantidade de chuvas continuar ínfima, o abastecimento hídrico no País corre risco, prejudicando a produção elétrica, industrial e de serviços.
Neste episódio de O Ambiente é Nosso Meio, Pedro Luiz Côrtes, docente da Escola de Comunicações e Artes (ECA) e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP, explica que atualmente vivemos duas importantes situações climáticas: a primeira é a redução de umidade transportada pela zona de convergência do atlântico sul, os rios voadores, por conta do desmatamento. O resultado é o nível baixo de reservatórios importantes, como Furnas, que está com 38% da capacidade, Serra da Mesa, com 36%, Embarcação, com 22%, Nova Ponte, com 16% e Itumbiara, com 27%. “São reservatórios muito importantes para o sistema nacional, que estão com os níveis muito baixos. Essa é uma situação que vem perdurando ao longo dos últimos dez anos em consequência do desmatamento”, disse.
Outro fator é o La Ninã, responsável por reduzir a temperatura da superfície das águas do Oceano Pacífico, Tropical Central e Oriental. A instalação do fenômeno no ano passado, que durou até o fim de abril de 2021, causou estiagem na Região Sul, repercutindo inclusive em parte do Estado de São Paulo. Na Região Norte, proporcionou grandes quantidades de chuvas, causando inundações em Manaus. Devido à instabilidade climática no País, o uso de termelétricas aumentou e levou ao acréscimo dos custos de produção de energia.
Segundo o professor, a questão climática é somada a problemas estruturais do Brasil. Mesmo se o País não vivesse a crise da pandemia, o suprimento de energia elétrica não seria capaz de atender toda a demanda. “Se não houver uma atenção especial quanto ao abastecimento de energia elétrica, nós podemos ter apagões em áreas específicas, comprometendo a retomada. Isso já deveria ter entrado no radar do governo federal”, informa Côrtes. O prognóstico da situação não é favorável. A redução de chuvas tem prejudicado o abastecimento do sistema Cantareira, do sistema do Alto Tietê também e Guarapiranga. Quando o período de chuvas retornar, provavelmente ocorrerá a volta do La Niña, levando a estiagem do Sul para o Sudeste. “Infelizmente, é possível que tenhamos condições satisfatórias de recarga só a partir do segundo semestre do próximo ano”, alerta o especialista.
Imprensa internacional
Em entrevista neste final de semana ao jornal espanhol El Pais, o professor Côrtes disse que não são apenas R$ 14,20 por cada 100 quilowatt-hora que o brasileiro vai pagar a mais com a bandeira de escassez hídrica criada pelo Governo Bolsonaro para tentar contornar a ameaça de apagão. “O que está sendo precificado na conta de luz é o desmatamento da Amazônia”, explica Pedro Luiz Côrtes, professor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (IEE-USP). Num momento em que a economia ainda ensaia estratégias para se recuperar da pandemia de covid-19, com inflação em alta e renda das famílias em queda, a iminência de uma crise energética acende um alerta sobre o impacto que o descaso com o meio ambiente pode causar à economia do Brasil.
Quem é Pedro Luiz Côrtes
Professor do Departamento de Informação e Cultura da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP. Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação ECA-USP). Professor do Programa de Pós-graduação em Ciência Ambiental (PROCAM) do Instituto de Energia e Ambiente da USP (IEE-USP). Professor da Universidade do Porto (Portugal) onde atua como orientador do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologias do Ambiente da Faculdade de Ciências. Pesquisador do grupo de pesquisa “Meio Ambiente e Sociedade” do IEA.