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Em 1960 o capixaba foi para a rua lutar contra a tarifa abusiva de energia elétrica


A disposição de ir à luta pelos seus direitos ficou no passado. Atualmente, as pessoas se limitam a ficar reclamando em redes socais e não tem mais a mesma disposição de brigar quando o seu direito é violado


O download do livro, que se encontra na biblioteca do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) pode ser feito nesta matéria | Imagem: IJSN

Muito ao contrário do Século XXI, quando as empresas estrangeiras que exploram o comércio de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica e o consumidor se limita a ficar reclamando em rede social, no início da década de 1960 as pessoas iam para a rua lutar pelos seus direitos. E isso aconteceu no Espírito Santo e está registrado no livro “A indústria de energia elétrica no Espírito Santo – 1889/1978”, do historiador capixaba Gabriel Augusto de Mello Bittencourt, publicado em fevereiro de 1979 dentro da série Documentos Capixabas, editado pelo Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN). Clique neste link e leia a íntegra das 96 páginas do livro em PDF.

No livro, ele conta que a primeira cidade capixaba a ter iluminação elétrica foi Cachoeiro de Itapemirim, com a captação da força hidráulica a ilha da Boa Esperança, no rio Itapemirim, que a partir daí passou a denominar-se Ilha da Luz. Em 1º de novembro de 1903, na festa de Todos os Santos, foi inaugurada oficial a iluminação a energia elétrica e fez com que Cachoeiro de Itapemirim tornou-se a décima cidade brasileira dotada desse tipo de iluminação pública com 154 lâmpadas de 47 e 16 velas, alimentadas por um gerador de aproximadamente 70HP.

A partir daí foi ampliando as cidades e os responsáveis pela geração de energia, entre públicos e privados. A partir da década de 1920 grandes grupos americanos, interessados na lucratividade fácil que a exploração de energia proporciona no Brasil, começaram a entrar no mercado. Entre esses o conglomerado americano Bond and Share, que em 1928 entrou no Brasil, através de São Paulo, e começou comprando as principais usinas hidrelétricas e passou a usar o nome de Companhia Paulista de Energia Elétrica.

“Em 1941, existiam no Estado 44 empresas de energia elétrica, operando 45 usinas. A exploração da eletricidade entre nós limitava-se ao âmbito territorial do município onde se localizava o serviço, salvo, evidentemente o caso da Central Brasileira e cinco outras empresas bem menores que a primeira. Era~ de iniciativa de prefeituras municipais ou de pequenos empresários, limitando o fornecimento à iluminação, com raras exceções para fins industriais fora da área de concessão da Central Brasileira”, narra o autor.

No Espírito Santo, após ter sido estatizada as empresas de energia que haviam sido entregues a estrangeiros, governadores da época cederam à pressão e do capital internacional e entregaram o controle das geradoras, empresas de transmissão e distribuidoras de energia elétrica às mãos dos estrangeiros. A então Serviços Reunidos de Vitória e de Itapemirim foram deixados nas mãos da Companhia Central Brasileira de Força Elétrica (CCBFE), do grupo American Foreign Power Company. Também a americana General Eletric andou explorando os serviços de energia no Espírito Santo.

O livro foi publicado em 1979 | Imagem: IJSN

Estado teve fortes protestos contra as tarifas de energia abusivas

Como as empresas estrangeiras adquirem um setor industrial com o intuito de ter lucro elevado e repassar para as suas matrizes, no exterior, logo o capixaba começou a notar aumentos abusivos na tarifa de energia elétrica. “Os aumentos constantes das tarifas e as medidas paliativas da Companhia no atendimento a demanda de energia e que se acelera com o tempo, irão gerar as crises nas quais vê-se envolvida a Central Brasileira, não chegando ao fim de seus 50 anos de concessão”, diz o historiador no seu livro.

O problema começou quando em 1959 a empresa estrangeira que atuava no Espírito Santo não investia na geração de energia e não tinha oferta de energia que acompanhasse a evolução do crescimento. Para tentar aumentar o oferecimento, passou a gerar energia elétrica com termelétrica a diesel, chegando a oferecer 7.500 Kw de um total de 12.700 Kw instalados movidos a diesel. Os preços das tarifas dispararam e foi quando iniciaram os protestos.

Muito ao contrário da população capixaba atual, que sente o abuso dos preços elevados, muito acima da capacidade de pagamento e se limita a ficar reclamando em redes sociais. No início da década de 1960, “Elementos do povo, industriais, comerciantes e agricultores de Cachoeiro de Itapemirim organizaram uma comissão encarregada de lutar pelo barateamento da energia elétrica na Cidade, objetivando equiparação de preços aos Estados circunvizinhos servidos por energia muito mais barata”, diz o historiador Gabriel Bittencourt.

“Inicialmente, decidiram os manifestantes promover uma campanha de esclarecimento a propósito do alto preço cobrado pela Companhia subsidiária do poderoso grupo Bond and Shire. Mas, reconheciam os líderes do movimento que a redução no preço da energia não traria a solução aos problemas, que só poderia vir sé fosse realizada a encampação da Central Brasileira por uma organização como a ESCELSA, na qual o Estado detivesse pelo menos 51% das ações e. ainda “que diretrizes mencionadas pela Comissão constituem meros paliativos para problemas de eletricidade, a verdadeira solução só poderia vir com a criação de uma Eletrobras com monopólio estatal, a exemplo da Petrobrás”, prossegue o escritor.

Boicote de pagamento

Bem diferencia dos dias atuais, onde o pagamento de cobrança de energia elétrica pode ser feito em rede bancária, casas lotéricas, entre várias outras modalidades, em 1960 a conta era feita no escritório da antiga Escelsa na Praça Costa Pereira, no Centro Histórico de Vitória. E foi lá que se concentrou o protesto. “Em reunião posterior, decidiu-se a deflagração de um movimento boicotando o pagamento de contas de energia a partir ·de 1′: de janeiro de 1960, e uma campanha de porta em porta para esclarecimento do consumidor”, diz o autor.

“Nesse ínterim, recrudesce o movimento de rua. A Prefeitura Municipal instalara uma árvore de Natal em colaboração com a Central Brasileira, o que incitou os ânimos de alguns descontentes que tentaram danifica-a e e agredir ao próprio prefeito, que comparecera ao local do incidente. O tumulto estender-se-ia ao dia seguinte com agressões generalizadas e no dia marcado irrompe o movimento pré-determinado As poucas pessoas que se dispuseram pagar suas contas de luz são interceptadas com vaias e apupos e a Companhia cerra suas portas temendo o pior, enquanto corriam rumores de adesão de outros municípios”.