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Estudo da Ufes constata que microplásticos contaminam águas e mexilhões no litoral do ES

Microplásticos estão contaminando o litoral capixaba e afetando os mexilhões | Foto: Fábio Bom/Ufes

Um estudo realizado pela Ufes no litoral do Espírito Santo constatou que as águas e os mexilhões (foto principal) da região estão contaminados com microplásticos. As 240 amostras do molusco da espécie Perna perna e as 40 de água foram coletadas em um sítio costeiro natural, na cidade de Vitória, e num sítio de aquicultura, em Guarapari, nas quatro estações do ano. As concentrações de microplásticos foram expressas em número de partículas por indivíduo e em número de partículas por grama (peso), no caso dos mexilhões, e em número de partículas por litro, para amostras de água.

Considerando a média nos dois locais de coleta, o resultado foi, em relação aos mexilhões, a presença de 1,4 partícula de microplástico por grama ou 8,3 unidades de microplásticos por indivíduo. A concentração em amostras de águas superficiais foi de 41,4 partículas de microplásticos por litro.

“É possível, por meio dos resultados, afirmar que sim, há microplásticos nos ambientes em que pesquisamos. Identificamos que, independentemente da época do ano e do local de coleta, são encontradas partículas de plástico tanto na água quanto nos mexilhões, e isso tende a aumentar no futuro, tendo em vista o descarte irregular de microplásticos e de quantidades enormes de plástico nos rios que chegam aos oceanos”, afirma Fábio Bom, autor do estudo que integra sua pesquisa de doutorado intitulada Microplásticos em Bivalves de Importância Econômica da Região Costeira do Espírito Santo. Ele é orientado no Programa de Pós-Graduação em Oceanografia Ambiental (PPGOAM) da Ufes pelo professor Fabian Sá.

Segundo Bom, os microplásticos (foto) – partículas de até 5 milímetros – podem ser divididos em primários, que são aqueles fabricados para uma aplicação em esfoliantes faciais, cremes dentais (em que pese hoje ser proibido pela legislação o uso de microplásticos na indústria de cosméticos) e pastilhas de resina usadas na indústria plástica; e os secundários, que são formados a partir da fragmentação de grandes itens plásticos. Eles podem entrar no meio ambiente via vazamento durante a fabricação, o transporte, o uso e por meio do esgoto. “Quando lavamos roupa, por exemplo, as fibras se transformam em micropartículas e vão para a rede de esgoto”.

Estudo em mexilhões descobriu contaminação por microplásticos | Foto: Fábio Bom/Ufes

Bioindicadores de poluição

A opção por trabalhar com mexilhões, explica o pesquisador, foi devido ao fato de o animal ser um bom bioindicador de poluição, dado que são filtradores por natureza. “Tudo o que tem na água eles ingerem, e as micropartículas de plástico são de tamanho semelhante às orgânicas, alimento desses animais. Além disso, os mexilhões têm uma importância econômica e social na região, pois servem de alimento para a população. Isso acaba tendo um impacto maior para o ser humano, pois, diferentemente dos peixes, cujas vísceras não comemos, os mexilhões são ingeridos inteiros”.

Segundo estudos laboratoriais, os impactos da ingestão de microplásticos para os animais são especialmente na reprodução, no crescimento e nas atividades metabólicas, tudo interferindo negativamente na vivência do molusco. Para o ser humano, poucos são os estudos avaliando as consequências da ingestão de alimentos com microplásticos, mas já se sabe de respostas cancerígenas, inflamatórias e alguns comprometimentos em processos respiratórios.

Um dos principais problemas para o enfrentamento da poluição por microplásticos é a ausência de legislação específica sobre o tema. “Apesar de existirem leis sobre descarte irregular de resíduos sólidos, o termo microplástico é relativamente novo, começou a ser usado há cerca de 15 anos. Não há nenhum controle sobre quantas partículas estão no ambiente, não há parâmetros sobre esse tipo de poluição, não há nenhuma regulamentação no Brasil e no mundo. O que podemos afirmar é que há micropartículas e que necessitamos de mais estudos e de formatação de legislação”, afirma Bom.

LixoMar

O estudo de Bom (na foto, em laboratório) está entre os que a Ufes desenvolve como parte do grupo de pesquisa Lixo Marinho (LixoMar), que atua desde 2019 desenvolvendo projetos voltados a contribuir com políticas públicas de combate ao lixo marinho. O grupo, registrado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), é formado por 21 pesquisadores, dentre eles sete docentes da Ufes e da Universidade Federal do Paraná (UFPR), e 14 estudantes de mestrado, doutorado e graduação.

Fabian Sá, que também é coordenador do LixoMar, destaca que a redução do lixo marinho é uma das preocupações da Organização das Nações Unidas (ONU) na Década dos Oceanos, que teve início em 2021 e vai até 2030. Segundo dados do grupo de pesquisa, “cerca de 80% dos resíduos que entram nos oceanos têm origem em atividades terrestres, podendo tanto terem sido descartados diretamente nos rios como também passado pelos sistemas de filtros dos esgotos (no caso das micropartículas) até se depositarem nos oceanos (o ralo da terra). Estima-se que a maior parte do lixo marinho seja constituída de microplásticos”.

As estimativas, segundo publicações científicas, é que atualmente existem flutuando na superfície do oceano globalmente cerca de 51 trilhões de partículas de microplásticos, contaminando desde pequenos organismos zooplanctônicos até grandes espécies, como tubarões e baleias. As implicações são não apenas para a saúde dos organismos marinhos, mas para a cadeia alimentar como um todo, chegando aos humanos.

“As pesquisas que desenvolvemos buscam gerar conhecimento sobre a atual situação da poluição por plástico e propor ações socioambientais e políticas públicas para podermos, ao menos, minimizar os efeitos desse tipo de poluição. É fundamental promover o entendimento científico da realidade brasileira em consonância com uma metodologia de ação participativa junto às comunidades das regiões de abrangência para avançarmos na resolução da problemática quanto ao lixo marinho”, afirma o professor Fabian Sá.