A empresa foi questionada sobre o real motivo das fortes explosões, mas optou em dar uma informação genérica, dizendo que a causa foi um “blackout (falta de energia)”. Especialistas mundiais analisaram casos semelhantes e garantem que a causa é sempre falta de manutenção. O motivo do “blackout” não foi informado pela usina
Por volta das 15 horas deste último domingo (17) a população de Vitória, Serra, Vila Velha e Cariacica foi surpreendida por fortes explosões vindas da usina siderúrgica Arcelor Mittal Tubarão, a antiga usina CST. As explosões, ouvidas até em Cariacica-sede, provocaram tremores em prédios em Jardim Camburi e em Jardim da Penha. No entanto, mesmo sendo cobrada a explicação, a siderúrgica não deu as devidas informações.
O Corpo de Bombeiros Militar do Espírito Santo (CBMES) enviou imediatamente seus veículos para dar garantia contra o que aparentava ser focos de incêndio, mas foram barrados na portaria. Os bombeiros militares ficaram na porta da empresa por cerca de quatro horas e voltaram para o quartel. Depois, o CBMES distribuiu a seguinte nota à imprensa:
- “Recursos foram enviados ao local, entretanto, não houve atuação do CBMES, pois a empresa informou que a situação foi controlada pelas equipes próprias.”
Nas redes sociais foram divulgados muitos vídeos feitos por populares, onde apareciam chamas a usina, causando preocupação. A empresa se posicionou disse que as chamas, que saiam por diversas chaminés, foram ativadas automática por um dispositivo de segurança conhecido como bleeder, que provoca de forma controlada a queima dos gases produzidos no processo industrial da usina, quando há uma emergência.
O Grafitti News entrou em contato com a empresa, neste último domingo (17) através de seus canais de contato com a imprensa e fez os seguintes questionamentos:
- Na nota divulgada pela empresa não é dada a informação cobrada pela população sobre as fortes explosões ouvidas até em Cariacica-sede, em bairros de Vila Velha e que provocou tremores em prédios em Jardim da Penha. Então a pergunta: O que realmente ocorreu na usina para provocar essas fortes explosões?
- Há informações de que o acesso do Corpo de Bombeiros ao interior da usina foi barrado pela empresa, obrigando os bombeiros militares a ficar esperando em vão na porta da ArcelorMittal Tubarão por 40 minutos até voltarem para o quartel. Isso é verdade?
- Na nota a empresa diz que as labaredas saindo das chaminés é a queima de gases bleeder. Isso ocorre por qual motivo? O que leva ao acionamento desse dispositivo?
Em resposta a essas perguntas específicas, a Arcelor Mittal Tubarão, através de sua assessoria, repetiu a mesma nota padrão, divulgada anteriormente:
Segue abaixo o posicionamento da ArcelorMittal:
- “Posicionamento
- A ArcelorMittal, unidade Tubarão, informa que houve um blackout (falta de energia) na Usina hoje, que afetou sua Central Termelétrica. O evento gerou um barulho intenso, mas não houve vítimas. Estão sendo veiculadas por pessoas imagens em mídias sociais mostrando chamas em um dos processos, que na verdade é um sistema de segurança, chamado bleeder, que são dispositivos que realizam a queima controlada dos gases em caso de falha no sistema. Todas as medidas estão sendo tomadas voltadas à segurança das pessoas, meio ambiente e estabilidade dos processos. Os órgãos ambientais já foram informados.”
A geração de energia na antiga CST
A empresa fica entre o final da Praia de Camburi, entre os municípios de Vitória (ES) e da Serra (ES), onde a usina ocupa 7 Km2, dentro de uma área de sua propriedade de 13,5 Km2 no Complexo Siderúrgico de Tubarão, onde há o porto de exportação de minérios da Vale e oito usinas de Pelotização de minério de ferro. A antiga CST produz anualmente 7,5 milhões de toneladas de aço em placas e bobinas a quente.
Segundo a própria ArcelorMittal Tubarão, em seu portal na internet, é dada a informação de que “adotou, desde a sua construção, um modelo energético que permite utilizar os gases do processo siderúrgico para gerar energia. A geração de energia vem de seis termelétricas e outros sistemas de reaproveitamento de gases, como turbinas de topo, sua capacidade total de geração é da ordem de 500 MW, o equivalente a quantidade de energia elétrica necessária para o consumo de 1,4 milhão de residências.
Especialistas dizem que falhas de manutenção provocam ‘blackout’
O professor do Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade Príncipe Sattam bin Abdulaziz Naeim Farouk, em Riyadh, na Arábia Saudita, Sattam bin Abdulaziz Naeim Farouk, explica em artigo divulgado na internet. Ele analisa a ocorrência de blackout em usinas termelétricas no Sudão. E garante que o problema é ocasionado por falta de manutenção.
- “Neste estudo, a Usina Termelétrica de Cartum Norte foi tomada como estudo de caso, uma vez que é mais afetada por esse fenômeno. Na Unidade 6, que é a usina a vapor, os dois eixos das turbinas de alta e baixa pressão foram seriamente desertados. Outros defeitos foram notados nos assentos do virabrequim e anéis de óleo em turbinas de alta e baixa pressão”, inicia o professor.
- “Todos esses defeitos foram causados principalmente pelo alto atrito entre as peças rotativas devido à lubrificação insuficiente que aconteceu quando o lubrificante circulante e as bombas de óleo foram repentinamente interrompidas pelo apagão completo. Também foram observados alguns defeitos no gerador elétrico, principalmente no eixo principal e suas sedes devido ao mesmo motivo citado acima. Para minimizar o fenômeno do apagão completo, algumas recomendações foram sugeridas neste estudo”, prossegue.
- “Primeiro, evite a sobrecarga da usina instalando mais usinas para atender ao aumento da demanda. Em segundo lugar, aumentar os efeitos dos apagões de energia elétrica em usinas de turbinas a vapor PJAEE, 17 (6) (2020) 8175 no monitoramento de operações e programas de manutenção e, finalmente, reduzir os erros humanos por meio de treinamento intensivo para todos os engenheiros e técnicos.
Estudo analisa deficiência em termelétrica na China que gerou explosão
Os pesquisadores chineses Gui Fu, Lin Zhou, Jianhao Wang e Meng Shi publicaram na revista científica Science Direct um artigo intitulado “Análise de um acidente de explosão na Usina de Dangyang, em Hubei, China: causas e lições aprendidas” onde analisam explosões semelhantes as que ocorreram na antiga CST neste últiomo domingo.
- No Abstract do estudo, informam:
- “Em 11 de agosto de 2016, uma explosão de um oleoduto de vapor de alta pressão ocorreu em uma usina na cidade de Dangyang, Província de Hubei, China. O acidente deixou 22 mortos e 4 feridos. Os fatores causais do acidente foram analisados para evitar tal catástrofe no futuro. Todo o processo de acidente foi dividido em três eventos sequenciais para respectiva análise com base na linha do tempo. Além disso, um novo modelo demonstrando as relações entre diferentes fatores causais foi proposto e aplicado para esta análise de acidentes”, iniciam.
- “Com relação à usina, foram identificadas as deficiências de cinco categorias causais, que demonstraram claramente o mecanismo do acidente desde as causas imediatas até as causas raízes. Os resultados da análise indicaram que atos inseguros praticados por funcionários de diferentes níveis na usina levaram a condições inseguras, que se deveram a três fatores, ou seja, conhecimento inadequado de segurança da equipe, fraca consciência de segurança e maus hábitos de segurança”, prosseguem.
- “Os elementos do sistema de gestão de segurança (por exemplo, ‘aquisição’, ‘determinação dos Requisitos Legais aplicáveis e outros requisitos’) não foram implementados e mantidos. Além disso, a equipe não chegou a um consenso sobre crenças específicas de segurança (por exemplo, “a segurança é a primeira prioridade”, “a importância do compromisso da alta gerência”), o que indicou uma cultura de segurança deficiente na organização. Por fim, a fim de evitar as recorrências de acidentes semelhantes, foram propostas as principais lições aprendidas com essa explosão e discutida a aplicação dos resultados da análise para o treinamento de segurança relacionado.
Superaquecimento ocasiona explosão em usina termetlétrica
No seu livro “Chemical Kinetics. From Molecular Structure to Chemical Reactivity, in Second Edition 2021 (Cinética Química. Da estrutura Molecular à reatividade química, na sua segunda edição 2021, o professor de Química da Universidade de Coimbra, em Portugal, Luis Arnaut analisa o que ocasiona fortes explosões em usinas termelétricas:
- “Uma explosão térmica é aquela em que a causa primária é a autocatálise produzida pelo efeito de autoaquecimento das misturas de reação. Para uma reação exotérmica, o calor evoluído durante o curso da reação eleva a temperatura das misturas reagentes, acelerando assim as taxas de reação, levando a mais aquecimento e reação adicional, até que ocorra uma explosão. Essa reação térmica se estabiliza quando a taxa de geração de calor é compensada pela dissipação térmica por convecção e condutividade térmica ou por radiação.”
O professor português prossegue em seu livro, explicando o que motiva a explosão e diz que é ocasionada por um “superaquecimento de líquidos e à rápida evaporação que pode gerar ondas de choque que se propagam no ar livre”.:
- “O termo explosão refere-se à rápida liberação de calor ou aumento de pressão que pode produzir danos (uma falha estrutural, uma lesão, uma perda de controle) diretamente devido à expansão isoentrópica (por exemplo, para o aumento da temperatura de um sistema gasoso aquecido em um recipiente) ou para a onda de pressão de magnitude significativa, movendo-se rapidamente para fora da fonte de explosão (Glassman & Yetter, 2008). Os dois tipos de fenômenos são tipicamente, mas não necessariamente, associados à luz, ruído e fragmentos.
- No contexto industrial, as necessidades de previsão, prevenção e mitigação de explosões acidentais têm direcionado cientistas e técnicos para definições mais específicas, que envolvem os fenômenos físicos ou químicos detalhados que subtendem o cenário destrutivo. No entanto, ainda existem grandes contradições entre os livros didáticos científicos fundamentais e as diretrizes e compêndios internacionais como o Livro Amarelo (van den Bosch & Weterings, 1997), Mannan e Lees (2005), ou as Diretrizes AIChE dos CCPS (2010).
- Para esclarecer essa discussão, propõe-se taxonomia geral (Fig. 1). Na Fig. 1, a via esquerda está relacionada à ocorrência de uma reação química com uma cinética rápida. No caso da combustão, esse fenômeno ocorre entre o combustível e o oxidante (ar, muito raramente outros oxidantes). Neste caso, condições pré-misturadas para reagentes e mecanismos de Aceleração para a propagação da chama (efeito Schelkin) são essenciais para a explosão em um ambiente não confinado ou parcialmente confinado, enquanto efeitos termoquímicos puros podem ser relacionados aos efeitos da explosão no caso de sistemas confinados (isolados).
- Explosões térmicas devido à decomposição rápida ou reações de fuga são essencialmente lideradas pela compressão do equipamento, devido a reações secundárias exotérmicas e/ou gasosas. Daí, uma explosão física (mecânica) (a seção direita da Fig. 1), que em geral se caracteriza por uma falha catastrófica da casca, com fragmentos e onda de choque (onda de pressão com duração muito curta e pico de pressão intenso) produzida pela expansão do gás pressurizado. Neste caso, elementos estruturais (pressão de falha da carcaça) e opções de projeto (por exemplo, o projeto das válvulas de segurança) são parâmetros essenciais. Finalmente, transições de fase rápidas e BLEVE (Boiling Liquid Expanding Vapor Explosion) estão essencialmente relacionadas ao superaquecimento de líquidos e à rápida evaporação que pode gerar ondas de choque que se propagam no ar livre.”