Os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Alberto Fernández, da Argentina, defenderam em uma nota conjunta publicada neste domingo (22), onde defenderam a adoção de uma moeda sul-americana comum, a exemplo do que ocorre na comunidade europeia, que tem o euro. A nota foi publicada no portal oficial do governo argentino, o Casa Rosada, e que pode ser lido na íntegra, em espanhol, clicando neste link. Nesta matéria tem a tradução do texto.
No documento os dois presidentes se referem ao Brasil e à Argentina como sendo “duas nações irmãs” e que se comprometem a “quebrar as barreiras em nossas trocas”. Uma das medidas para isso é “avançar nas discussões sobre uma moeda sul-americana comum que possa ser usada tanto para fluxos financeiros quanto comerciais, reduzindo custos operacionais e nossa vulnerabilidade externa”, diz o documento.
A proposta prevê que, inicialmente, a nova moeda comum não viria a substituir de imediato o Real ou o Peso argentino, mas serviria como uma moeda internacional, aos moldes do Euro. A proposta prevê que as duas nações venham a promover políticas para incentivo do uso de moedas locais na América do Sul, e utilizar o Mercosul como uma “plataforma para nossa efetiva integração com o mundo, por meio da negociação conjunta de acordos comerciais equilibrados que respondam aos nossos objetivos estratégicos de desenvolvimento”. Com isso, o dólar teria a sua influência reduzida.
Outra proposta debatida entre Lula e Fernández é a atuação conjunta em projetos de construção de infraestrutura, em especial energética, com planos de integração da rede de distribuição de gás natural entre os dois países. Outra proposta discutida foi a retomada da política de parceria no desenvolvimento de energia nuclear, além da montagem de projeto conjunto para o lançamento de satélite espacial para monitoramento marítimo e costeiro dos dois países.
“Queremos que o Mercosul constitua uma plataforma para a nossa integração efetiva no mundo, através da negociação conjunta de acordos comerciais equilibrados que respondam aos nossos objetivos estratégicos de desenvolvimento”, afirmaram. Quanto à União Sul-Americana de Nações (Unasul), afirmaram que irão trabalhar para “salvar e atualizar” esta organização e salientaram que a Argentina e o Brasil estão “firmemente empenhados na construção de uma América do Sul forte, democrática, estável e pacífica”.
Leia a íntegra da nota conjunta em português:
“Relançamento da aliança estratégica entre Argentina e Brasil”
Alberto Fernández e Luiz Inácio Lula da Silva *
Duas nações irmãs se encontram novamente. Amanhã [22.jan] nos encontraremos em Buenos Aires para o 1º encontro presidencial entre Brasil e Argentina em mais de 3 anos. Em seguida, será realizada a 7ª Cúpula da Celac, fórum que reúne os 33 países da região da América Latina e Caribe e que, desde o ano passado, está sob a presidência da Argentina. O evento marcará o retorno do Brasil a esse mecanismo de diálogo e consulta regional. Uma relação que nunca deveria ter sido interrompida e que a história da irmandade latino-americana consegue retomar.
Ambos os encontros marcam um novo começo, justamente no ano em que celebraremos o bicentenário de nossas relações diplomáticas. Em Buenos Aires vamos relançar a aliança estratégica bilateral com a reativação de vários espaços de cooperação e diálogo. São múltiplas as áreas em que voltaremos a trabalhar juntos em temas importantes para a qualidade de vida de nossas populações, como combate à fome e à pobreza, saúde, educação, desenvolvimento sustentável, mudanças climáticas e redução de todas as formas de desigualdade. De uma vez por todas, a história será escrita por nossos povos.
Vamos fortalecer o papel da sociedade civil, dos governos estaduais e municipais e dos parlamentos como atores dessa aproximação. Sabemos que o sonho de estarmos unidos é agora uma realidade possível.
Os laços entre Argentina e Brasil são baseados na consolidação da paz e da democracia. Queremos a democracia para sempre. Ditadura nunca mais.
A reindustrialização de nossas economias merecerá atenção especial, com geração de empregos de qualidade e investimento em inovação. O comércio entre Argentina e Brasil já tem alta participação de produtos industrializados em setores estratégicos. A integração entre nossas cadeias produtivas ajuda a mitigar choques externos, como os ocorridos durante a pandemia. Não podemos depender de fornecedores externos para podermos ter acesso a insumos e bens essenciais ao bem-estar das nossas populações.
Temos um setor privado dinâmico e empreendedor, cuja contribuição para o processo de integração bilateral é cada vez mais necessária. Compartilhamos a firme intenção de estreitar os já sólidos laços comerciais e de investimentos entre nossos países e promoveremos um seminário empresarial no âmbito da visita presidencial.
Nossos países continuarão a desempenhar um papel crítico para a segurança alimentar em um mundo afetado por riscos geopolíticos e graves interrupções nas cadeias de abastecimento. Temos o compromisso de dotar a nossa agricultura e pecuária de elevados padrões de sustentabilidade e de manter elevados níveis de produtividade.
Queremos promover projetos na área das infraestruturas. Um tema central deste novo momento é a integração energética. A interligação eléctrica entre os nossos países já é uma realidade e a integração do gás tem potencial para se tornar um dos projetos estratégicos da relação bilateral, com benefícios duradouros ao nível da atração de investimento, criação de emprego e ao nível da nossa segurança.
Consolidaremos nossa posição como possuidores de tecnologia nuclear para fins pacíficos, fortalecendo a Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares e dando continuidade a projetos ambiciosos como o reator multiuso. Com a reativação do Grupo de Trabalho Conjunto de Cooperação Espacial, vamos colocar satélites em órbita para realizar estudos costeiros e oceanográficos.
A relação fluida e dinâmica entre Brasil e Argentina é essencial para o avanço da integração regional. Junto com nossos parceiros, queremos que o Mercosul constitua uma plataforma para nossa efetiva integração com o mundo, por meio da negociação conjunta de acordos comerciais equilibrados que respondam aos nossos objetivos estratégicos de desenvolvimento.
Pretendemos quebrar as barreiras em nossas trocas, simplificar e modernizar as regras e incentivar o uso de moedas locais. Também decidimos avançar nas discussões sobre uma moeda sul-americana comum que possa ser usada tanto para fluxos financeiros quanto comerciais, reduzindo custos operacionais e nossa vulnerabilidade externa. “Trabalharemos juntos para resgatar e atualizar a Unasul, com base em seu inegável legado de conquistas. Argentina e Brasil estão firmemente comprometidos em construir uma América do Sul forte, democrática, estável e pacífica. Precisamos enfrentar um mundo cada vez mais complexo e desafiador e temos ampla convergência na agenda multilateral. Falta uma vontade política efetiva para enfrentar os dilemas atuais e as grandes crises: mudanças climáticas, pandemias, guerras, fome e imigração. A ONU e o G20 devem ajudar a preencher essa lacuna de liderança para provocar mudanças. Ambos os fóruns podem promover agendas inclusivas, sinalizando claramente a atuação de organizações como a OMC, o FMI e o Banco Mundial.
Trabalharemos em colaboração pela paz e pelo desenvolvimento.
O mundo mais justo e solidário a que aspiramos só será viável se tivermos coragem de construir juntos o nosso futuro. Esse é o significado estratégico da integração bilateral.
Não há nada mais emancipador do que a irmandade dos povos que vêm desde o alvorecer da nossa história para tomar posse do seu futuro.”