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Não houve tentativa de regularização de joias, diz Receita Federal


Neste último domingo (5) foi revelado que o governo Bolsonaro recebeu um outro conjunto de joias do governo da Arábia Saudita e que foi entregue para compor o acervo pessoal de Jair Bolsonaro e não fazia parte dos presentes à ex-primeira dama Michelle. A Receita diz que orientou governo Bolsonaro, mas disse que nada foi feito


A segunda remessa de jóias presenteadas pelos árabes teria sido destinada ao ex-presidente Bolsonaro, segundo reportagem da Folha de São Paulo | Foto: Reprodução de documento oficial da Receita Federal

A Receita Federal disse, por meio de nota divulgada na noite desse último sábado (4), que não houve tentativa de regularização das joias avaliadas em mais de R$ 16 milhões, que teriam sido um presidente dado pela Arábia Saudita para a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.

Segundo a Receita, além de não pedir a regularização, o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro também não apresentou um pedido fundamentado para incorporar as joias ao patrimônio público, mesmo após orientações do órgão.

A informação sobre as jóias foi revelada inicialmente em reportagem do jornal O Estado de S. Paulo publicada na última sexta-feira (3). Segundo a publicação, um colar, um anel, um relógio e um par de brincos de diamantes foram barrados pela Receita Federal em outubro de 2021. Os itens, avaliados em 3 milhões de euros (cerca de R$ 16,5 milhões) foram encontrados na mochila do militar Marcos André dos Santos Soeiro, que assessorava o então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. Ambos retornavam de uma viagem oficial ao Oriente Médio. Ainda de acordo com a matéria, a retenção ocorreu no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, após inspeção por raio-X. As informações são da Agência Brasil.

Na ocasião, o ex-ministro teria se valido do cargo para pedir a liberação das joias, alegando serem presentes do governo saudita para a então primeira-dama. Os servidores da Receita Federal, no entanto, alegaram que o procedimento para a entrada desses itens como presentes oficiais de um governo estrangeiro para o governo brasileiro teriam que obedecer a outro trâmite legal e, por isso, retiveram as joias pelo não pagamento dos tributos.

Pela legislação, todo viajante que traga ao país bens pertencentes a terceiros deve declará-los na chegada, independentemente de valor. No caso de bens pertencentes ao próprio portador, devem ser declarados aqueles em valor acima de US$ 1 mil, limite atualmente vigente. Caso não haja declaração de bem, é exigido 50% do valor a título de tributo, acrescido de multa de 50%, reduzida pela metade no caso de pagamento em 30 dias.

Sem pagar imposto, só se for propriedade pública

“Na hipótese de agente público que deixe de declarar o bem como pertencente ao Estado Brasileiro, é possível a regularização da situação, mediante comprovação da propriedade pública, e regularização da situação aduaneira. Isso não aconteceu no caso em análise, mesmo após orientações e esclarecimentos prestados pela Receita Federal a órgãos do governo”, diz a nota.

Como não houve a regularização, a Receita disse que o bem passa a ser tratado como pertencente ao portador e, não havendo pagamento do tributo e multa, é aplicada a pena de perdimento, cabendo recursos cujo prazo, no caso das joias, terminou em julho de 2022.

Possibilidade de as jóias irem a leilão

A Receita disse ainda que após o perdimento, é possível, em tese, o bem ser levado a leilão. Do total arrecadado, 40% é destinado à seguridade social e o resto ao tesouro. Além do leilão, também é possível a doação, incorporação ao patrimônio público ou destruição. Segundo a nota, não houve pedido para que as joias fossem incorporadas ao patrimônio da União.

“A incorporação ao patrimônio da União exige pedido de autoridade competente, com justificativa da necessidade e adequação da medida, como, por exemplo, a destinação de joias de valor cultural e histórico relevante a ser destinadas a museu. Isso não aconteceu neste caso. Não cabe incorporação de bem por interesse pessoal de quem quer que seja, apenas em caso de efetivo interesse público”, disse a Receita.

A nota saúda os agentes aduaneiros que realizaram na retenção dos bens e diz ainda que os fatos foram informados ao Ministério Público Federal e que o órgão está à disposição para prosseguir nas investigações, “sem prejuízo da colaboração com a Polícia Federal, já anunciada pelo Ministro da Justiça.”.

Recibo dos presentes dos árabes emitido pela Receita Federal | Imagem: Reprodução

Mais presentes dados pelos árabes às vésperas da compra de refinaria

Neste último domingo (6), além das joias avaliadas em mais de R$ 16,5 milhões que foram retidas pela Receita Federal por questões legais, o jornal Folha de S.Paulo revelou neste último domingo (6) que há um segundo pacote de joias enviado pelo governo da Arábia Saudita ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O segundo pacote não chegou a ser interceptado pela Receita Federal, mas foi observado pelos fiscais que estava na bagagem de um dos integrantes da comitiva que foi ao Oriente Médio em outubro de 2021, em missão oficial, e que, em tese, seria mais um presente do governo saudita.

Sem um valor estimado pela Receita, o segundo pacote de presentes continha relógio, caneta, abotoaduras, anel e um tipo de rosário, todos da marca suíça de diamantes Chopard. Segundo o recibo obtido pela Folha de S. Paulo, o conjunto da marca Chopard inclui uma masbaha (espécie de rosário para a religião islâmica), um relógio com pulseira em couro, um par de abotoaduras, uma caneta e um anel. Não há estimativa ou avaliação de quanto vale o conjunto. O presente estava na bagagem de um dos integrantes da comitiva do Brasil e não foi interceptado pela Receita.

Refinaria Landulpho Alves (RLAM), em São Francisco do Conde (BA) foi vendida por Bolsonaro aos árabeas um mês após ter recebido os presentes | Foto: Divulgação/Petrobras

Dúvidas e coincidências que a PF deve apurar

Depois que o ministro da Justiça, Flávio Dino, disse através de suas redes sociais que nesta segunda-feira (6) determinará que a Polícia Federal (PF) faça uma apuração dos presentes milionários dados pelos árabes, o portal brasiliense Congresso em Foco fez uma relação de perguntas que a PF deverá esclarecer à sociedade brasileira. Junto com as perguntas, as coincidências que envolvem a venda da refinaria Landulpho Alves (RLAM), em São Francisco do Conde (BA), para o fundo árabe Mubadala Capital pelo valor de US$ 1,8 bilhão (R$ 10,1 bilhões em valores à época).

A venda ocorreu um mês após aos presentes em ouro e diamantes, que a família Bolsonaro tentou entrar no Brasil, sem pagar imposto. Pelas leis em vigor no Brasil, qualquer objeto que tentar entrar no solo brasileiro, sem prestar declaração, tem que ter o valor máximo de US$ 1 mil (R$ 5.200,50). A seguir leia as perguntas formuladas pelo portal de Brasília:

> Quem deu o presente? Por que razão?

> Qual a participação do então ministro de Minas e Energia no caso?

> Por que as joias não foram entregues pessoalmente a Michelle em uma viagem do então presidente ao país e, sim, enviada por meio de um auxiliar de Bolsonaro?

> Por que as joias foram trazidas em uma mochila de um assessor do ministro?

> Por que o governo brasileiro não declarou, previamente, que os diamantes eram um presente dado à primeira-dama?

> Michelle pretendia guardar para si um presente dado à figura da primeira-dama do Brasil?

> Por que o presente foi e continua apreendido na Receita Federa, se o ex-ministro Bento Aluquerque disse que as jóias  “foram devidamente incorporadas ao acervo oficial brasileiro”?

> Se a primeira-dama não sabia, alguém ocultou dela o presente? Quem teria sonegado a informação a ela?

> Qual o grau de envolvimento de Bolsonaro no episódio?

> O ex-presidente exorbitou de suas funções ao tentar liberar as jóias quatro vezes? Ameaçou funcionários da Receita, servidores de carreira do Estado brasileiro?

> Bolsonaro pretendia que o presente ficasse com a primeira-dama ou com ele mesmo?

Íntegra da Nota oficial da Receita Federal:

“Acerca das notícias veiculadas inicialmente no jornal O Estado de São Paulo sobre a apreensão de joias no Aeroporto Internacional de Guarulhos, no dia 26/10/2021, a Receita Federal esclarece o seguinte, preservando dados protegidos por sigilo:

– todo cidadão brasileiro sujeita-se às mesmas leis e normas aduaneiras, independentemente de ocupar cargo ou função pública.

– os agentes da Receita Federal atuantes na aduana são servidores de Estado, com prerrogativas e garantias constitucionais que lhes garante isenção e autonomia no exercício de suas atribuições legais.

– todo viajante que traga ao país bens pertencentes a terceiros deve declará-los na chegada, independentemente de valor.

– no caso de bens pertencentes ao próprio portador, devem ser declarados aqueles em valor acima de US$ 1 mil, limite atualmente vigente.

– caso não haja declaração de bem, é exigido 50% do valor a título de tributo, acrescido de multa de 50%, reduzida pela metade no caso de pagamento em 30 dias.

– na hipótese de agente público que deixe de declarar o bem como pertencente ao Estado Brasileiro, é possível a regularização da situação, mediante comprovação da propriedade pública, e regularização da situação aduaneira. Isso não aconteceu no caso em análise, mesmo após orientações e esclarecimentos prestados pela Receita Federal a órgãos do governo.

– não havendo essa regularização, o bem é tratado como pertencente ao portador e, não havendo pagamento do tributo e multa, é aplicada a pena de perdimento, cabendo recursos cujo prazo, no caso, encerrou-se em julho de 2022.

– após o perdimento, é possível, em tese, o bem ser levado a leilão, sendo que 40% do recurso arrecadado é destinado à seguridade social e o resto ao tesouro. É possível também, em tese, a doação, incorporação ao patrimônio público ou destruição.

– a incorporação ao patrimônio da União exige pedido de autoridade competente, com justificativa da necessidade e adequação da medida, como por exemplo a destinação de joias de valor cultural e histórico relevante a ser destinadas a museu. Isso não aconteceu neste caso. Não cabe incorporação de bem por interesse pessoal de quem quer que seja, apenas em caso de efetivo interesse público.

– os fatos foram informados ao Ministério Público Federal, sendo que a Receita Federal colocou-se à disposição para prosseguir nas investigações, sem prejuízo da colaboração com a Polícia Federal, já anunciada pelo Ministro da Justiça.

Finalmente, a Receita Federal saúda os agentes da aduana que cumpriram seus deveres legais com altivez, cortesia, profissionalismo e impessoalidade, honrando a instituição a que pertencem.”