Nesta semana o prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini (Republicanos) esteve no Parque Municipal Gruta da Onça, onde a PMV realiza uma obra que descaracteriza o local histórico através de intervenções paisagísticas modernas, como escadarias largas e com corrimão de aço. A intervenção paisagística de Pazolini, que custou aos cofres públicos municipais a despesa de R$ 14.651.097,25, segundo a própria Prefeitura de Vitória, apesar de a placa na entrada do local diga que é de R$ 9.843.775,74. Mas, o visitante que desejar caminhar por trilhas, esqueça. Já não existem mais.
O atrativo do parque para quem gosta de caminhadas na natureza era seguir por trilhas em ziguezague, que foram construídas com pedras há mais de 200 anos por escravos. Apenas no topo no morro ficou um remanescente das trilhas feitas pelos escravos, somente porque o Instituto do Patrimônio Histórico e Natural no Espírito Santo (Iphan-ES) recebeu denúncias, em novembro de 2021, da existência de uma obra clandestina promovida pela gestão Pazolini no parque. O local é protegido pelo Iphan e qualquer modificação paisagística tem que ser aprovada pelo órgão federal.
Do acesso até a parte mais alta, passando pela capela, o visitante não vai mais reconhecer o parque natural histórico. Há um emaranhado de escadarias largas e com corrimões imensos em aço brilhante, que tirou a originalidade do local.
Consórcio de construtoras foi criado pouco antes da licitação
O Consorcio Gruta Da Onça, com sede na Ilha de Santa Maria e integrado pelas empreiteiras VLZ Construtora Ltda e W F Engenharia Ltda e que tem como administrador o proprietário desta última, Wallace Ferreira é quem está executando o serviço e vai embolsar R$ 14.651.097,25. A reforma tem, o número de contrato 165/2020, ano em que foi selecionada por licitação e iniciou a alteração paisagística. Curiosamente, na ficha cadastral o consórcio foi registrado com o CNPJ 36.489.503/0001-10 em 27 de fevereiro de 2020, pouco antes de ter sido selecionada pela administração Pazolini na Prefeitura de Vitória (PMV).
O Parque Gruta da Onça foi oficialmente criado pelo ex-prefeito João Coser (PT) no dia 5 de dezembro de 2005, quando assinou a Lei municipal 6.482/2005. No artigo primeiro, a legislação define o tamanho do parque. “Fica criado o Parque Natural Municipal da Gruta da Onça, com 69.;914 metros quadrados em área pública remanescente da Mata Atlântica, localizada no Morro da Capixaba ou da Vigia”. O parque tem acesso à visitação através da Rua Barão de Monjardim, próximo à Casa do Porto das Artes Plásticas, no Centro Histórico de Vitória.
Na lei instituída pelo ex-prefeito João Coser é estabelecido que a PMV faça um Plano de Manejo para o Parque Gruta da Onça, o que não foi cumprido 17 anos depois que a legislação entrou em vigor. Só o Parque da Fonte Grande possui o Plano de Manejo e mesmo assim está desatualizado. A desculpa é a falta de verbas. A lei estabelecia um prazo de cinco anos para que o plano fosse feito.
Enaltece a destruição das passarelas de pedra construídas no Império pelos escravos
Como é do hábito do prefeito, a descaracterização do Parque Gruta da Onça não teve a opinião dos moradores do Centro Histórico de Vitória, que somente ficaram sabendo quando o Iphan denunciou a então obra clandestina. Em release divulgado pela PMV nesta semana à imprensa, o prefeito bolsonarista conta que fez uma visita nesta última terça-feira (15) e que a obra que mandou fazer já está 70% pronta.
“Onde existiam escadarias em pedra, com degraus irregulares, foram construídas escadarias nos padrões de acessibilidade em vigor, com guarda corpo em aço inox, trazendo conforto e segurança para os visitantes”, narra o prefeito do Republicanos de como foi a destruição que promoveu no sítio arqueológico, que é protegido pelo Iphan. E ainda dá detalhes: “A obra de revitalização foi iniciada em 2020, quando foram executados 750 metros de escadarias dos 1.100 metros existentes. Quando a atual gestão assumiu em janeiro de 2021 a obra estava paralisada por falta de recursos”.
Análise do impacto da obra ainda está em execução pelo Iphan
O release ainda conta que a obra foi reiniciada em julho 2021 e após seis meses de obras em andamento o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN determinou a contratação de um arqueólogo para avaliar se há impacto das obras ao patrimônio arqueológico do local. A análise do arqueólogo está em andamento.
“As obras estão em andamento na sede de parque. São mais de 70% das intervenções já concluídas. Estamos trabalhando para entregar o empreendimento no aniversário da cidade, em setembro deste ano”, disse o secretário de Obras Gustavo Perin, segundo o release da PMV. “Com essas obras o Parque Municipal Gruta da Onça passará a ser ainda mais acessível. Em breve teremos mais um local disponível para a população. É o nosso compromisso de desenvolvimento sustentável com compromisso ambiental”, disse Pazolini.
O secretário de Meio Ambiente também comemorou a descaracterização em andamento: “Estamos fazendo um conjunto de obras aqui no Parque Gruta da Onça para oferecer à população acesso, contemplação, educação ambiental e lazer aos visitantes”, afirmou.
Lenda que deu origem ao nome
Segundo a ONG Últimos Refúgios, em um vídeo institucional sobre a importância histórica do Parque Municipal Gruta da Onça, as trilhas em ziguezague foram construídas com pedras há mais de 200 anos por escravos, para facilitar a passagem das pessoas e o transporte de mercadorias vindas das fazendas vizinhas até o ponto de comercialização, o então Mercado da Capixaba. Bem antes da atual administração do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) foi feito um resgate das antigas trilhas e dos muros de arrimo, que agora o atual prefeito e onde uma dessas trilhas leva ao poço azul e outra ao poço dos escravos.
O Parque Municipal Gruta da Onça, localizado no Maciço Central (Morro do Vigia) da Ilha de Vitória, teve seu nome retirado de uma lenda. Conta a lenda que em meio a floresta existia uma grande gruta de onde brotava uma fonte de águas límpidas. Certo dia, um índio tentou se abrigar na gruta e ao beber da água da fonte, viu refletir no espelho d’água a imagem de uma enorme onça pronta para atacar.
Apavorado, o índio fugiu correndo em direção ao mar, que beijava as praias junto ao Morro do Penedo. Desde então, a onça passou a ser guardiã da gruta, continuando a viver em seu interior. Para perpetuar esta lenda capixaba, seus personagens foram transformados em monumentos, estando a onça localizada no alto das pedras que formam a gruta e o índio, na Avenida Beira-mar, próximo ao Morro do Penedo.”