O uso pelo governo israelense de mecanismo de explosão a distância em pagers trouxe receio no Brasil de que os celulares também possam conter explosivos e provocarem mortes e feridos
O alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos da ONU pediu uma “investigação independente, completa e transparente” sobre as circunstâncias das explosões simultâneas generalizadas da terça-feira (17) no Líbano e na Síria. A ONU se refere as explosões simultâneas de pagers da empresa taiwanesa Gold Apollo, modelo AR-924, onde o governo de Israel colocou explosivos no seu interior. O resultado foi a morte de 37 pessoas e 3,4 mil feridos.
Em nota, Volker Turk destacou a morte de 12 pessoas após a detonação de pagers, provocada remotamente pelo governo israelense. O intuito era assassinar membros do Hezbollah, mas feriu milhares de pessoas inocentes e matou crianças. O secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou estar profundamente alarmado com relatos da explosão de muitos dispositivos e em nota emitida pelo porta-voz, pede o máximo de moderação para que seja evitada qualquer nova escalada.
Violação do direito internacional
Para ele ter milhares de indivíduos como alvos, “sejam civis ou membros de grupos armados, sem conhecimento de quem estava de posse dos dispositivos visados, sua localização e seus arredores no momento do ataque, viola o direito internacional dos direitos humanos e, na medida aplicável, o direito internacional humanitário”.
Logo após as explosões, a coordenadora especial da ONU para o Líbano, Jeanine Hennis-Plasschaert, disse que estes episódios marcam uma “escalada extremamente preocupante no que já é um contexto inaceitavelmente volátil”. Enquanto está sendo apurado o impacto total do ataque, Hennis-Plasschaert pediu a todos os envolvidos que se abstenham de qualquer ação adicional ou retórica bélica, porque “poderia desencadear uma conflagração mais ampla que ninguém pode pagar”.
Fabricante taiwanês da marca Gold Apollo tira página de internet do ar
Após ter sido tornado público o envolvimento de sua marca, o fabricante taiwanês tirou sua página de internet do ar e é onde aparece a mensagem: “Limite De Largura De Banda Excedido. O servidor está temporariamente incapaz de atender a sua solicitação devido ao proprietário do site atingir seu limite de largura de banda. Tente novamente mais tarde.”
Segundo relato do jornal Taipei News, de ilha de Twain, disse que a Comissão Nacional de Comunicações daquela ilha reivindicada pela China como sendo parte de seu território, “disse que a licença comercial da Gold Apollo para fabricar e vender dispositivos de radiofrequência (RF) expirou no ano passado.’ Ou seja, a empresa não tem licença para comercializar os pagers, dispositivo utilizado para envio e recebimento e mensagens.
“O Regulamento Administrativo sobre Dispositivos de Radiofrequência de Telecomunicações Controladas (de Taiwan) exige que aqueles que desejam importar, vender, produzir dispositivos de radiofrequência de exibição no país obtenham um certificado da comissão, disse o regulador em nota enviada ao jornal Taipei Times.. Mas, o jornal relata que o órgão acrescentou: “No entanto, os pagers são receptores de mensagens e não são dispositivos RF de telecomunicações controlados, e esses produtores não precisam obter um certificado.” Ou seja, estava liberado a vender.
O que diz especialista de Taiwan
Um especialista em telecomunicações que optou por permanecer anônimo disse ao Taipei Times que é surpreendente que um dispositivo tão pequeno possa ser usado como arma mortal. “A bateria de um pager é muito menor que a de um smartphone e tem capacidade limitada de armazenamento de energia, por isso é bastante difícil matar alguém com uma explosão de bateria de pager, disse o especialista.
Um pager não é tão bem montado quanto um telefone celular, o que torna os pagers fáceis de modificar, disse o especialista. “Meu palpite é que substâncias explosivas e mecanismos de controle de denotação foram adicionados aos pagers antes de ficarem nas mãos dos usuários, disse o especialista. “É muito provável que a função de vibração do pager para mensagens recebidas tenha sido usada como parte do mecanismo de controle de denotação e um comando especial de mensagem recebida desencadeou a detonação,”, completou.
Fabricante diz que pagers foram feitos na Hungria
Em entrevista coletiva na sede de sua empresa, a cidade de Nova Taipei, em Taiwan, o fundador da Gold Apollo, Hsu Ching-kuang, afirmou que os pagers vendidos para o Líbano e a Síria foram fabricados pela BAC Consulting, uma empresa com sede em Budapeste, sob um contrato de licença com a empresa taiwanesa Gold Apollo. De acordo com o relato do fundador, foi essa empresa que em conluio com o governo de Israel, preparou os explosivos para pagers matar seus usuários.
De acordo com relato do Taipei Times, nessa entrevista coletiva à imprensa, Hsu Ching-kuang fez as seguintes afirmações: “Fornecemos apenas autorização de marca registrada e não temos envolvimento no design ou fabricação deste produto. O produto não era nosso. Acontece que tinha nossa marca, disse o fundador da Gold Apollo”, acrescentando que sua empresa fez um acordo de autorização com a BAC nos últimos três anos. “A BAC cooperou conosco e representa muitos de nossos produtos”, completou.
O fundador da empresa disse na entrevista coletiva que ter “a lembrança do bloqueio de um pagamento da empresa BAC Consulting, emitido por um banco no Oriente Médio.” Mas afirmou não ter questionado sobre a origem do dinheiro. Já o governo húngaro afirma que a BAC era “um intermediário comercial, sem local de produção ou operacional na Hungria”. Nos registros de empresas da Hungria, semelhante à Junta Comercial brasileira, consta que que a BAC Consulting está em nome de Cristiana Arcidiacono e a empresa não tem nenhum funcionário.
O que provocou a explosão
Segundo a ONG internacional RF Safe, que tem como missão o aumento da conscientização sobre os potenciais riscos à saúde associados à exposição à radiação em rádio frequência (RF), analisou o que provou as explosões dos pagers. Garantiu que o Mossad, o órgão de inteligência do governo israelense, conseguiu injetar um composto de Tetranitrato de Pentaeritritol (PETN) nas baterias de novos pagers criptografados usados pelo Hezbollah.
O PETN é um poderoso explosivo, comumente utilizado em aplicações militares e conhecido por sua alta velocidade e estabilidade de detonação. “Ao incorporar o PETN nas baterias, o Mossad preparou o terreno para uma detonação remota, fazendo com que as baterias de lítio nesses dispositivos superaquecessem e explodissem.
Como o PETN foi usado:
- Injeção em baterias: A alegação sugere que o PETN foi incorporado nas baterias do pager antes que os dispositivos chegassem aos membros do Hezbollah. O PETN, sendo altamente explosivo, mas relativamente estável em condições normais, poderia permanecer sem ser detectado até ser ativado.
- Detonação Remota: Ao usar PETN, que pode ser acionado por calor, choque ou uma pequena carga elétrica, os operadores poderiam ter induzido remotamente uma condição de superaquecimento na bateria de lítio, levando a uma explosão. O PETN aumentaria a explosão, tornando-a mais destrutiva.
O significado do PETN neste contexto:
Alta Potência: PETN é um explosivo potente com alta velocidade de detonação (até 8.400 m/s). Uma pequena quantidade pode causar danos significativos, o que se alinha com os efeitos relatados das explosões do pager.
Ocultação: O PETN pode ser incorporado de várias formas e pode ser bastante difícil de detectar se estiver devidamente oculto. Isto permitiria a infiltração de componentes explosivos em dispositivos de comunicação seguros.
Contexto histórico do uso do PETN:
PETN é usado em inúmeros incidentes de alto perfil devido à sua capacidade de ser moldado em diferentes formas e sua natureza relativamente estável até a detonação. A sua utilização neste cenário mostra até que ponto os intervenientes estatais podem fazer para desactivar secretamente as capacidades de comunicação inimigas.
Um ataque coordenado com consequências fatais
Ocorreu uma violação de segurança significativa em todo o Líbano e na Síria, quando centenas de pagers utilizados por membros do Hezbollah detonaram simultaneamente, causando milhares deferidos e várias mortes. Este evento marca um dos ataques mais sofisticados envolvendo dispositivos de comunicação pessoal, com relatos indicando que os pagers estavam equipados com baterias alcalinas AAA, sugerindo que a explosão não foi causada por um mau funcionamento típico da bateria.
A operação envolvendo a detonação de pagers usados pelo Hezbollah, segundo a ONG RF Sabe, foi uma mistura altamente sofisticada de sabotagem física, manipulação cibernética e guerra psicológica. Aqui está um detalhamento dos elementos envolvidos:
- .1 – Acesso Físico e Modificação: Para que explosivos como o PETN fossem incorporados nos pagers, era necessário acesso físico. Isto implica uma violação na cadeia de abastecimento, onde os dispositivos foram interceptados e modificados antes de serem entregues aos utilizadores pretendidos. O componente explosivo provavelmente foi cuidadosamente colocado dentro do dispositivo, possivelmente como uma carga moldada para direcionar a explosão em direção ao usuário.
- .2 – Atualização de firmware para detonação: Para acionar remotamente os explosivos, seria necessária uma modificação de firmware. Esta atualização poderia ter programado o dispositivo para responder a um sinal ou código específico enviado pela rede pager. O vídeo relatado onde a tela do pager ficou em branco antes da detonação sugere que o dispositivo recebeu um sinal de disparo, potencialmente cortando a energia do display momentaneamente para direcionar a energia da bateria para iniciar a explosão.
- .3 – Interdição direcionada da cadeia de suprimentos: Em vez de comprometer um grande lote de dispositivos, o que correria o risco de detecção precoce ou danos acidentais a utilizadores não intencionais, esta operação parece ter envolvido uma interdição direcionada da cadeia de abastecimento. Os pagers provavelmente foram modificados bem a tempo antes de serem distribuídos para alvos específicos, reduzindo a chance de os explosivos serem descobertos e garantindo que chegassem aos usuários pretendidos.
- .4 – Mistura Cibernética: Esta operação representa uma mistura perfeita de guerra cibernética e cinética. O componente cibernético provavelmente envolveu modificação de firmware e o uso de um código ou mensagem específica para acionar a detonação. O aspecto cinético foi a modificação física dos dispositivos para conter explosivos, transformando uma ferramenta de comunicação em uma arma letal.
- .5 – Execução Estratégica: A operação foi executada com precisão, maximizando o impacto psicológico. O método de detonação relatado, onde a tela ficou em branco e levou o usuário a mover o pager para mais perto de sua cabeça, indica uma estratégia bem planejada para causar o maior dano. O escurecimento da tela poderia ter sido uma tática deliberada ou um efeito colateral do redirecionamento de energia para detonar a carga.
Os pagers envolvidos: Gold Apollo AR-924
Os pagers envolvidos na ação criminosa de Israel foram os do modelo Apollo AP-924 dourado modelo. Esses pagers foram fabricados pela BAC Consulting, uma empresa com sede em Budapeste, sob um contrato de licença com a empresa taiwanesa Gold Apollo. A BAC Consulting foi outra a tirar a sua página da internet.
A Gold Apollo esclareceu que, embora sua marca fosse usada nos dispositivos, eles não estavam envolvidos no processo de design ou fabricação. Este modelo apresenta um design moderno com uma capacidade de carregamento USB, sugerindo que ele usa uma bateria recarregável de íons de lítio em vez de baterias alcalinas AAA.
Como os explosivos foram incorporados e detonados
A operação para incorporar o PETN nas baterias do pager exigiria acesso físico direto, indicando uma possível violação da cadeia de abastecimento. Os dispositivos provavelmente foram interceptados e modificados antes de chegar ao Hezbollah, com o explosivo cuidadosamente colocado para direcionar a explosão para o usuário.
Além disso, uma modificação de firmware poderia ter sido implementada para permitir a detonação remota, onde um sinal específico enviado pela rede de pager acionou o explosivo. Essa ativação remota foi evidenciada em relatórios mostrando telas de pager ficando em branco antes de explodir, indicando uma execução bem coordenada e estratégica projetada para causar o máximo de dano.
Não a primeira vez que explosões em massa ocorrem
A ONG RF Safe lembra que esse incidente relembra eventos históricos em que dispositivos sem fio foram usados para assassinatos seletivos, como o assassinato de Yahya Ayyash, em 1996, um importante agente do Hamas. Nesse caso, o Shin Bet israelense equipou um celular com explosivo RDX e o detonou remotamente. A utilização do PETN nos recentes ataques de pager ilustra uma evolução significativa na utilização da tecnologia na guerra, destacando a crescente complexidade e natureza encoberta do conflito moderno.
Análise comparativa do potencial explosivo da baterias de celular
- Baterias de íon de lítio: Normalmente, as baterias de íons de lítio têm uma alta densidade de energia (150-250 Wh/kg), mas são projetadas para liberar essa energia lentamente. Quando danificados ou superaquecidos, eles podem entrar em fuga térmica, causando incêndios ou explosões baseadas em pressão. No entanto, estes eventos são geralmente menos destrutivos e não geram a onda de choque de alta velocidade característica dos altos explosivos.
- PETN: Em contraste, o PETN tem uma densidade de energia muito maior e pode produzir uma velocidade de detonação de cerca de 8.400 m/s. Mesmo uma pequena quantidade pode causar uma explosão poderosa, criando uma onda de choque de alta velocidade capaz de força direcionada, como em uma carga moldada. A incorporação de PETN dentro da bateria de lítio ou do pager amplifica significativamente o potencial explosivo do dispositivo.
A detonação de pagers e walkie-talkies usados pelo Hezbollah significa um novo nível de sofisticação na guerra moderna, misturando a manipulação cibernética com a sabotagem física para transformar dispositivos de comunicação diários em armas letais, assinala a ONG. A utilização do PETN e a execução estratégica destes ataques sublinham o potencial da tecnologia sem fios ser explorada de formas cada vez mais perigosas. À medida que a investigação continua, o incidente serve como um lembrete assustador das ameaças em evolução representadas pela integração da tecnologia e da guerra.