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Operação Resgate II flagra trabalho escravo contemporâneo em fazendas de cinco municípios do Espírito Santo

Foram resgatadas 337 pessoas de trabalho análogo à escravidão em todo o Brasil | Foto: Polícia Federal

A Operação Resgate II realizou ações conjuntas de combate ao trabalho análogo à escravidão, entre os dias 12 e 14 deste mês, em propriedades rurais nos municípios de Vila Valério e Jaguaré, e de 18 a 22/7, em fazendas de Linhares, Mantenópolis, Jaguaré, Ponto Belo e São Mateus. A maioria são fazendas de café e em Linhares uma fazenda de cacau.

Além do resgate de trabalhadores, a ação interinstitucional teve o objetivo de verificar o cumprimento das regras de proteção ao trabalho; permitir a coleta de provas para responsabilizar, na esfera criminal, os responsáveis pela exploração dos trabalhadores; e garantir a reparação dos danos individuais e coletivos provocados aos resgatados.

A iniciativa é resultado de parceria entre seis órgãos públicos: Ministério Públicos do Trabalho (MPT) e Federal (MPF); Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Previdência (SIT); Polícia Federal (PF); Defensoria Pública da União (DPU); e Polícia Rodoviária Federal (PRF).

A força-tarefa ocorreu simultaneamente em 23 unidades da federação, a partir do envolvimento de 50 equipes em, pelo menos, 65 municípios. As fiscalizações aconteceram tanto em propriedades rurais quanto na área urbana, contabilizando o resgate de 337 trabalhadores. Todos os dados da Operação Resgate II foram apresentados na manhã desta quinta-feira (28), na sede da Procuradoria-Geral da República, em Brasília, por meio de coletiva de imprensa.

Duas semanas de ações fiscais

Na primeira etapa da Operação no Espírito Santo, no total, cinco estabelecimentos foram inspecionados. Houve o resgate de dois trabalhadores na colheita de café e outros 40 foram beneficiados pela ação fiscalizatória. O valor das verbas salariais e rescisórias foi de aproximadamente R$ 13 mil.

Segundo o procurador do Trabalho, Marcos Mauro Rodrigues Buzato, “dentre os trabalhadores resgatados, havia uma senhora que não tinha documentação, apenas a certidão de nascimento. Destarte, foi necessário atuação da força-tarefa no sentido de possibilitar a expedição de documentos básicos para que ela pudesse ter sua carteira de trabalho eletrônica devidamente preenchida. Para tanto, foram empreendidos esforços junto à Polícia Civil (Jaguaré) e à Receita Federal (Linhares)”, explanou.

Já na segunda fase da Operação, durante as diligências, sete trabalhadores foram encontrados em situação degradante. O MPT, após resgate realizado em Linhares, em virtude do “descumprimento da ordem jurídica, firmou um termo de ajuste de conduta (TAC) emergencial com o empregador, por meio do qual este se comprometeu a sanar as irregularidades constatadas pela fiscalização e a pagar indenização por danos morais individuais e coletivos, de modo a compensar a violação a direitos fundamentais trabalhistas ocorrida. Além disso, foi determinada a instauração de notícia de fato, que irá apurar se, de fato, houve a adequação da conduta, e se o empregador, no futuro, irá manter-se em conformidade com a ordem jurídica”, explicou a procuradora do MPT, Fernanda Barreto Naves.

A atuação da Defensoria Pública da União (DPU) também é relevante nas operações de resgate. O defensor público ferderal Juliano Martins de Godoy destacou que, caso os empregadores não aceitem pagar os valores devidos aos trabalhadores e suportar os danos coletivos, o defensor público ajuizará as ações cabíveis (inclusive ação civil pública (ACP), se necessário)”.

Em todo o Brasil foram resgatados 337 trabalhadores. foram resgatadas, ainda, de condições análogas à escravidão, cinco crianças e adolescentes e quatro migrantes de nacionalidade paraguaia e venezuelana. Pelo menos 149 dos resgatados na Operação Resgate II foram também vítimas de tráfico de pessoas. As fiscalizações ocorreram nas seguintes unidades da federação: AC, AL, AM, BA, CE, DF, ES, GO, MA, MS, MG, MT, PB, PE, PA, PI, PR, RJ, RO, RS, SC, TO, SP.

Segundo nota divulgada pela Polícia Federal (PF), os empregadores flagrados submetendo trabalhadores a essas condições foram notificados a interromper as atividades e formalizar o vínculo empregatício dessas pessoas, bem como a pagar as verbas salariais e rescisórias devidas aos trabalhadores – que somaram mais de R$ 3,8 milhões. Além disso, podem ser responsabilizados por danos morais individuais e coletivos, multas administrativas e ações criminais.

Situação degradante

As condições que caracterizam o trabalho escravo contemporâneo estão estabelecidas no art. 149 do Código Penal, tais como: trabalho forçado, jornada exaustiva, trabalho em condições degradantes e servidão por dívida. Não é necessário que todos os aspectos estejam presentes.

O auditor-fiscal do Trabalho, Cláudio Secchin, relatou que, durante a ação fiscalizatória no ES, não existiam crianças, refugiados ou estrangeiros submetidos a condições análogas à escravidão nas propriedades em que a equipe conjunta visitou. No entanto, o que mais o surpreendeu “foi ter um cenário de desleixo e descaso com a estada dos trabalhadores em alojamentos de uma grande empresa do agronegócio”.  

Parceria interinstitucional

De acordo com o superintendente da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Amarílio Boni, a instituição “se sente honrada em trabalhar em conjunto com a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, com o Ministério Público do Trabalho nas ações de enfrentamento ao trabalho análogo à condição de escravo. A PRF se coloca à disposição para outras ações. Qualquer que seja o enfrentamento contra os crimes contra os direitos humanos”, comentou.

Já são 222 denúncias de escravidão no Espírito Santo

Conforme dados extraídos do sistema MPT Gaia, no período de 2018 e 2022, o MP do Trabalho no Espírito Santo recebeu 222 denúncias, assinou 15 TACs e ajuizou 4 ações.

Já o Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas (plataforma SmartLab) revela que 877 pessoas foram resgatadas em condição análoga à escravidão no Espírito Santo, de 1995 a 2021. E no período de 2003 a 2021, os homens são os que mais se encontram entre os resgatados. Além disso, o cultivo de café está em primeiro lugar no ranking do setor econômico mais frequentemente envolvido, e a ocupação mais frequente é a do trabalhador agropecuário em geral. Quanto à raça dos resgatados, envolve, em sua maioria, mestiços. E, no que se refere à escolaridade, a maior parte só estudou até o 5º ano.

Como fazer denúncias

Em caso de suspeita, denúncias podem ser realizadas por meio dos canais de comunicação do MPT (website, e-mail, telefone ou pessoalmente, nas Procuradorias Regionais do Trabalho (PRTs) e Procuradorias do Trabalho nos Municípios (PTMs), assim como pelo Disque 100 ou ainda pelo site www.mpt.mp.br..Pode ocorrer, inclusive, denúncia anônima e sigilosa.