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Partidos pedem ao STF implementação de plano para enfrentar racismo institucional


Segundo as legendas, a exposição à violência institucional e estrutural da população negra no país não é compatível com um pleno Estado Democrático de Direito


Provocados pela Colização Negra por Direitos, PT, PSOL, PSB, PCdoB, Rede Sustentabilidade, PDT e PV acionaram o STF para que a União implante uma Plano Nacional de Enfrentamento ao Racismo Institucional | Foto: Tomaz Silva/ Agência Brasil

Sete partidos políticos (PT, PSOL, PSB, PCdoB, Rede Sustentabilidade, PDT e PV), provocados pela Coalizão Negra por Direitos, ajuizaram no Supremo Tribunal Federal (STF) a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 973, em que pedem que a Corte reconheça “o estado de coisas inconstitucional” caracterizado pela alta letalidade de pessoas negras, ocasionada pela violência do Estado, e pelo desmonte de políticas públicas voltadas à população negra do país. As legendas pedem a implantação de um Plano Nacional de Enfrentamento ao Racismo Institucional.

A ADPF foi apresentada neste 13 de maio, que marca os 134 anos da assinatura da lei que aboliu a escravidão no país. As legendas destacam, no entanto, que as pessoas escravizadas foram libertadas sem nenhuma perspectiva de inserção formal na educação, na economia e na cultura. “Pessoas negras foram marginalizadas e, sem trabalho ou terra, compulsoriamente transformadas nos principais alvos da repressão policial, uma das táticas executivas mais eficientes de controle social e vigilância de coletividades, grupos sociais e territórios vulnerabilizados historicamente”, ressaltam.

Os partidos pretendem que sejam reconhecidas e sanadas as lesões a preceitos fundamentais da Constituição praticadas pelo Estado brasileiro por ações e omissões que têm levado a uma violação sistemática dos direitos constitucionais à vida, à saúde, à segurança e à alimentação digna da população negra. Apontam, especialmente, o crescente aumento da letalidade de pessoas negras em decorrência da violência institucional – sobretudo fruto da atuação policial –, bem como o desmonte de políticas públicas de atenção à saúde da população negra e de redistribuição de renda, que dificulta ou impossibilita o acesso às condições de vida digna, entre elas a alimentação saudável.

Os pedidos da ação incluem a elaboração e a implementação, pelo Estado brasileiro, de um Plano Nacional de Enfrentamento ao Racismo Institucional e à Política de Morte à População Negra, além de diversas outras medidas para solucionar o problema. “O Supremo Tribunal Federal deve impor aos Poderes Públicos a formulação e a promoção de medidas efetivas para que as violações de direitos sejam mitigadas”, reforçam. A ação foi distribuída à ministra Rosa Weber. Leia a seguir a íntegra da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 973, em arquivo PDF:

Arguicao-de-Descumprimento-de-Preceito-Fundamental-ADPF-973

Coalizão

A Coalizão Negra por Direitos é uma articulação que reúne mais de 250 organizações, coletivos e entidades do movimento negro e antirracista que atuam coletivamente na promoção de ações de incidência política à população negra brasileira.

Na inicial. a Coalizão Negra por Direitos diz: “Lamentavelmente, falaremos de um projeto do Estado brasileiro que opera para nos matar, um a um, uma a uma. Nos matam à bala, de fome, por descaso, nos torturam, nos aprisionam, nos adoecem física e mentalmente. Arrancam de nós nossos pedaços, nossas alegrias, partes de nossas famílias. Ferem nossos ancestrais, nossa cultura. Destroem nossa terra, nossos quilombos, nosso passado. Invadem nossas casas, instalam o terror, nos tiram o sossego. Não reconhecem nossa existência. Negam a nós um futuro”.

Mais adianta assinala: “No racismo, tanto no Brasil como em outros países da América Latina, reside uma política estatal historicamente empreendida ao controle e extermínio das populações negras e indígenas. É componente ideológico da própria sociabilidade e cultura brasileira, o que torna profundamente complexo o seu enfrentamento. No Brasil, quando o escravismo não mais sustentava a base de formação da economia, políticas coloniais foram adotadas pelo Estado brasileiro republicano visando a manutenção e expansão do poder das “elites”, da classe branca dominante, mascaradas pela ideia de desenvolvimento do país. Uma delas foi a política eugenista, mobilizada pelos esforços da chamada elite nacional em busca do embranquecimento da população brasileira”.

Solicitações

Na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 973, foram feitas as seguintes solicitações: “1. Seja determinado à União Federal que, no âmbito de sua competência e com a participação de organizações da sociedade civil e do movimento negro, elabore e implemente um Plano Nacional de Enfrentamento ao Racismo Institucional e à Política de Morte à População Negra, em um prazo de um ano, devendo observar, no mínimo:”

a) A obrigatoriedade da União, Estados, Distrito Federal e Municípios reconhecerem e adotarem medidas para o enfrentamento ao racismo institucional nas instituições públicas e privadas; b) A determinação para que os planos nacional, estaduais e municipais de Segurança Pública e Defesa Social contenham obrigatoriamente políticas e ações voltadas para a redução da letalidade e violência policial e das guardas municipais, o enfrentamento ao racismo institucional nos órgãos de segurança pública e diretrizes para a implementação de protocolos relativos à abordagem policial e ao uso da força alinhados aos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal e nos tratados internacionais de direitos humanos, segurança e paz dos quais o Brasil é signatário;”

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c) A condicionalidade para a adesão ou permanência de Estados, Distrito Federal e Municípios ao Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir), a adoção, no âmbito das respectivas esferas de competência, de protocolos e políticas de combate ao racismo institucional; d) A determinação de políticas voltadas para a garantia do pleno exercício dos direitos políticos da população negra, considerando medidas que visem mitigar a violência política à candidatas e mandatários negros, criando mecanismos efetivos de monitoramento e investigação de casos de violência política, notadamente a de gênero (por motivo de sexo, identidade de gênero e orientação sexual), para resultar na devida responsabilização;”

e) O estabelecimento de que os cursos de formação para integrantes dos órgãos de segurança pública previstos no art. 144 da Constituição Federal incluirá obrigatoriamente conteúdos sobre relações raciais, o enfrentamento ao racismo institucional e os direitos e garantias fundamentais dispostos no art. 5º da Constituição Federal, especialmente aqueles relacionados ao combate à tortura e inerentes ao exercício de uma segurança cidadã; f) A determinação de formação para quaisquer servidores públicos sobre relações raciais e o enfrentamento ao racismo institucional no âmbito da administração pública; g) Estabelecimento de centros de referência multidisciplinares para o atendimento de pessoas vítimas do racismo institucional, com a priorização do atendimento de mães e órfãos vítimas da violência institucional, garantindo-se apoio jurídico, psicológico e social às vítimas”;

h) A necessidade de proteção dos espaços de exercício de fé das religiões de matriz africana, bem como de suas liturgias, para que tenham os mesmos direitos que o reservado para as religiões de representação majoritária, a fim de que seja resguardado o direito ao pleno exercício de liberdade religiosa, em conformidade com o art. 5º, inciso VI da CF; i) A determinação de disponibilização para a sociedade civil, nas plataformas de transparência dos governos, no âmbito das competências de cada ente federado, de informações e relatórios técnicos acerca do estado da arte das denúncias de racismo institucional por motivo de violência racial e religiosa em tramitação nas Ouvidorias dos estados e municípios, nos Ministérios Públicos estaduais e federais, nas corregedorias das forças armadas e nas corregedorias das polícias civil, militar e guardas municipais (ou Secretaria correspondente);”

j) A determinação de ampliação do Programa Restaurante Popular – malha de cobertura territorial e quantitativo de estabelecimentos – com oferta obrigatória de refeições matinais e noturnas (café da manhã e jantar) e gratuidade estendida em todas as unidades do país para pessoas em situação de rua, adicção e presumidamente em situação de miserabilidade, nos termos do § 3º do art. 20 da LOAS, devido a renda per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo; l) A determinação da ampliação das políticas públicas voltadas para a garantia do direito à alimentação, segurança alimentar e nutricional da população negra, povos e comunidades tradicionais por meio, também, do implemento, no Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, de diretrizes que considerem as realidades urbanas e do campo enfrentadas pela população negra e as contemplem nos instrumentos orientativos para a elaboração, monitoramento e avaliação das políticas públicas deste campo;”

m) Que determinem o implemento do regime de urgência na tramitação dos PLs que debatem a ampliação e o fortalecimento de políticas públicas que versem sobre o direito à alimentação, segurança alimentar e nutricional, o implemento da renda básica universal e programas de transferência de renda – em consonância com a previsão do regime de urgência previsto nos regimentos internos da Câmara e Senado e recentemente validado pelo STF”.

Pedidos definitivos

1. Sejam ouvidos o Advogado-Geral da União, nos termos do art. 103, § 3º, da Constituição Federal de 1988 e o Procurador-Geral da República, na forma do art. 103, § 1º, da Constituição federal de 1988, após a prestação de informações pela União Federal e pelos órgãos e entidades federais, responsáveis pelos atos e omissões violadores de preceitos fundamentais descritos nesta petição;

2. Seja reconhecido por esta Corte um estado de coisas inconstitucional fundado no racismo estrutural e racismo institucional que sustenta uma política de morte financiada e aplicada pelo Poder Público à população negra brasileira, sendo reconhecida também a necessidade de adoção de políticas e medidas de reparação voltadas para sanar o cenário de incompatibilidade da vivência da população negra brasileira com os preceitos constitucionais contidos na Constituição Federal de 1988.3. Seja conhecida e julgada integralmente procedente esta ADPF, para se confirmar, em caráter definitivo, todas as providências postuladas cautelarmente, de modo a determinar em definitivo à União Federal que, no âmbito de sua competência e com a participação de organizações da sociedade civil e do movimento negro, elabore e implemente um Plano Nacional de Enfrentamento ao Racismo Institucional e à Política de Morte à População Negra, sendo considerado os pontos centrais já estabelecidos no âmbito do pedido liminar.