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Prefeitura de Castelo está sendo acusada, pelo MPC, de ter feito contratação de advocacia sem licitação


“Cabe ressaltar, portanto, que, antes mesmo da abertura do procedimento administrativo de contratação, tudo já estava decidido; a instauração de um processo administrativo, a elaboração de um Termo de Referência, a indicação do supracitado escritório nesse documento (atos realizados pelo senhor Rodrigo Rodrigues do Egypto) teriam sido medidas empreendidas apenas por pura formalidade; apenas com a finalidade manter as aparências.”, afirma o MPC


A sede da Prefeitura lembra, em miniatura, o Castelo da Bela Adormecida, que fica na Disney da Califórnia, nos Estados Unidos | Foto: Divulgação

A administração da Prefeitura de Castelo (ES) está sendo questionada pelo Ministério Público de Contas do Espírito Santo (MPC-ES), por ter não ter respeitado os princípios da impessoalidade e da moralidade e ter feito contratações sem licitação e ter beneficiado o escritório Daher Forattini, Sant’Ana Pedra Advogados Associados (DFSP-AA), denominado de “Boutique”. A íntegra do parecer do MPC-ES  pode ser lido clicando neste link.

De acordo com o que consta na Representação do MPC, através do Processo TCE/ES 3563/2020 a primeira irregularidade com o uso do dinheiro público veio através do ex-procurador-geral de Castelo Rodrigo Rodrigues do Egypto, que decidiu ao bel prazer, escolher quem seria o prestador dos serviços advocatícios e escolheu o escritório Daher Forattini, Sant’Ana Pedra Advogados Associados (DFSP-AA), que fica no Bairro Santa Lúcia, em Vitória (ES) e é dirigido pelo advogado Anderson Sant’ana Pedra.

Em seguida, o MPC-ES narra que Egypto “buscou conferir ares de legalidade e aparência de satisfação ao interesse público” e assim fez a abertura de um procedimento formal de contratação direta e, obviamente, que sem licitação. A Prefeitura de Castelo tem como sede um prédio que lembra, em miniatura, o Castelo da Bela Adormecida, que fica na Disney da Califórnia, nos Estados Unidos.

Contratação surgiu de escolha pessoal, longe de uma licitação pública

O contrato foi celebrado – sem prévia licitação – entre a Prefeitura Municipal de Castelo e a Sociedade de Advogados Daher Forattini, Sant’Ana Pedra Advogados Associados (DFSP-AA), para representar e patrocinar o município de Castelo em 05 (cinco) processos judiciais movidos por diversas categorias de servidores públicos municipais em desfavor da Administração Pública.

Os processos que os escolhidos a dedo deveriam atuar:: 1) Requerentes: Procuradores Municipais – Processo TJ/ES 0000936-94.2017.8.08.0013; 2) Requerentes: Fiscais e Agentes Fiscais Municipais – Processo TJ/ES 0000995-82.2017.8.08.0013; 3) Requerentes: Cirurgiões Dentistas Municipais – Processo TJ/ES 0001062-47.2017.8.08.0013; 4) Requerentes: Arquiteto, Engenheiro Civil, Engenheiro Florestal e Geólogo – Processo TJ/ES 0001128-27.2017.8.08.0013 e 5) Requerentes: Contadores – Processo TJ/ES nº 0001175-98.2017.8.08.0013.   

“Intrigante”, alega o MPC

O MPC, em sua Representação, já havia classificado como “intrigante”, a definição do contratado – o escritório de advocacia Daher Forattini, Sant’Ana Pedra Advogados Associados (DFSP-AA) – logo no Termo de Referência, o qual constitui o primeiro documento da fase de planejamento do procedimento, preparatório à contratação, portanto, em que o servidor público requisitante esclarece aquilo que realmente necessita para seu setor e define o objeto, mas em hipótese alguma identifica o contratado.

No Parecer, por sua vez, além de reforçar que o direcionamento da contratação teria sido “indiscutivelmente inoportuno”, o MPC identifica outra incoerência na sequência dos fatos “que é plenamente capaz de obscurecer ainda mais a contratação em tela e pôr em xeque a cronologia exposta pelo então Procurador-Geral de Castelo.”.

Embora o início oficial do procedimento de contratação direta tenha acontecido em 23/05/2017 e o Termo de Referência produzido em 25/05/2017, ao revisitar o Processo Administrativo PMC-ES nº. 006155/2017, o Órgão Ministerial observou outra versão do Termo de Referência (a primeira), datada em 12/05/2017 e assinada pelo então procurador-geral de Castelo Rodrigo Rodrigues do Egypto, também com a indicação do escritório de advocacia (grifo do MPC) Daher Forattini, Sant’Ana Pedra Advogados Associados (futuro contratado).

“Ocorre que, de acordo com o senhor Rodrigo Rodrigues do Egypto, o primeiro contato com o advogado Anderson Sant’ana Pedra, representante do supracitado escritório, teria acontecido em 16/05/2017 e a sua concordância em assumir o patrocínio das causas, em 19/05/2017. Isso evidenciaria, para o MPC, que a decisão acerca de quem prestaria os serviços advocatícios se deu não só antes da abertura do Processo Administrativo PMC-ES nº. 006155/2017 (23/05/2017), mas também antes mesmo da data em que o próprio justificante relatara como “primeiro contato” com “o escritório do Dr. Anderson Sant’ana Pedra” (16/05/2017)”, afirma o órgão fiscalizador.

Não existe inexigibilidade para contratar escritório de advocacia, diz MPC

Na Representação TCE/MG nº. 1031715, o MPC assinala que “A confiança em relação ao contratado para realização de um serviço não é fator caracterizador da inexigibilidade, incumbindo ao administrador definir os aspectos da contratação, exclusivamente, à luz do interesse público e em observância aos princípios da impessoalidade, legalidade, moralidade e publicidade”. Além disso, “A decisão pela contratação direta, por inexigibilidade ou dispensa, é posterior à fase de planejamento. A impossibilidade ou a identificação da possibilidade da contratação direta, como a melhor opção para a administração, só surge após a etapa inicial de estudos, incluindo aí a cotação e orçamentos para verificação da compatibilidade dos valores a serem contratados, daí a indispensabilidade da cotação prévia.”.

O entendimento do Órgão Ministerial na Representação estaria de acordo com o primeiro posicionamento do Núcleo de Controle Externo de Outras Fiscalizações (NOF). À luz do afirmado no processo pelo senhor Luiz Carlos Piassi, então Prefeito Municipal de Castelo, o NOF ressaltou que “o gestor admite que a contratação do Sr. Anderson Sant’ana Pedra se deu por meio de indicação” e que “‘indicação’ não é um procedimento adequado para contratação pela Administração Pública, reforçando o entendimento do representante acerca da ilegalidade do ajuste em apreço”.

O Parecer também contrasta a justificativa do senhor Luiz Carlos Piassi acerca (i) da ausência de tempo hábil para a conclusão de um processo licitatório – embora a prefeitura tenha iniciado o procedimento de contratação sem licitação somente 46 (quarenta e seis) dias após citada na primeira ação judicial – e (ii) da pouca eficiência dos servidores do município de Castelo na condução dos certames, com, de outra banda, a “extraordinária celeridade” da conclusão da referida contratação direta, sem prévia licitação, efetuada em apenas 3 (três) dias: o procedimento fora instaurado no dia 23/05/2017, terça-feira, e plenamente finalizado, com a assinatura do Contrato nº. 01.06155/2017, no dia 26/05/2017, sexta-feira, na mesma semana.

Nem notória especialização o escritório contratado possui

No que se refere à exigência de notória especialização do contratado, o MPC demonstra “(…) que os responsáveis pela contratação não avaliaram se o escritório priorizado possuía corpo jurídico adequado ao trabalho. Com base no exposto no Termo de Referência (…), a escolha do prestador fora baseada exclusivamente no currículo do advogado Anderson Sant’Ana Pedra.”.

Além disso, segundo o Parecer, 3 (três) características do escritório de advocacia contratado, Daher Forattini, Sant`Ana Pedra Advogados Associados, colocam em xeque a razoabilidade da escolha efetuada pelo senhor Rodrigo Rodrigues do Egypto e ratificada pelo senhor Luiz Carlos Piassi: primeiro, a sua diminuta composição, haja vista que integrado por apenas 02 (dois) advogados – o senhor Anderson Sant’Ana Pedra e a senhora Talytta Daher R. Foranttini Pedra; segundo, o comprometimento do responsável técnico pelo serviço contratado, o senhor Anderson Sant’Ana Pedra, com as tarefas do cargo público de Procurador do Estado; terceiro, a sua localização, pois estava, à época, sediado na capital do Estado do Espírito Santo, Vitória, que fica a uma distância de aproximadamente 138 km do município de Castelo.

Subcontratação indevida dos serviços jurídicos

Conforme detalhado no Parecer, o escritório Daher Forattini, Sant`Ana Pedra Advogados Associados (DFSP-AA) estava obrigado, por força da lei e do próprio contrato, a garantir que seus integrantes realizassem pessoal e diretamente os serviços jurídico, vez que o “personalismo da prestação dos serviços ganha maior relevo ante situações em que a singularidade e a notória especialização parametrizaram a contratação, DETERMINANDO SUA LEGALIDADE, a ponto de, até mesmo, inviabilizar a subcontratação”. Todavia, em razão da sua reduzida composição (apenas dois advogados), precisou da ajuda de um terceiro advogado não integrante de sua estrutura, para cumprir o acordo.

Para o Órgão Ministerial, pouco importa o adjetivo que os responsáveis almejam oferecer às atividades desempenhadas por esse terceiro advogado sem qualquer vínculo com o escritório contratado (acessória ou principal, pequena ou grande, ordinária ou extraordinária), haja vista que a sua participação no cumprimento contratual foi numerosa e determinante. De acordo com o exposto, sem os serviços desse terceiro advogado o Contrato nº. 01.06155/2017 não teria sido cumprido.

A subcontratação também revelaria a incapacidade operacional e técnica do escritório contratado, na sua composição oficial, em executar a integralidade do serviço pactuado, isto é, cumprir prazos, protocolar peças, executar pesquisas, realizar diligências.

O grande número de peças assinadas por advogado estranho à formação do escritório contratado demonstraria não um fato isolado, mas conduta reiterada. Isso, segundo o Parecer, descaracterizaria a “essência da contratação direta” e revelaria a efetiva participação de terceiro na produção dos atos processuais.

Conforme explica o MPC, “a assinatura numa peça processual não é algo decorativo, supérfluo, irrelevante, porquanto representa, em verdade, quem foi o autor, quem participou na formulação daquele documento”, até mesmo porque “(…) CONSTITUI INFRAÇÃO DISCIPLINAR ‘assinar qualquer escrito destinado a processo judicial ou para fim extrajudicial que não tenha feito, ou em que não tenha colaborado’, nos termos do art. 34, V, da Lei nº. 8.906/94 (Estatuto da OAB) (…)”.

Escritório Boutique

Segundo relata o senhor Anderson Sant’Ana Pedra, o seu escritório se trata de um escritório boutique, com dois sócios. E assim, “por se tratar de um escritório boutique, com dois sócios, foi solicitado o auxílio de um terceiro advogado para ‘atividades acessórias’ (pesquisas, protocolização, requerer preferência de julgamento etc.)”.

Essa afirmação, realizada pelo defendente, se alinha com o denunciado na Representação, ainda que se tenha desconsiderado o trabalho executado pelo subcontratado e o qualificado como uma atividade acessória, secundária.

“Inadequado seria esquecer que “uma ‘boutique jurídica’ não se determina por uma autodeclaração” de seus donos. É o mercado que reconhece o escritório de advocacia como tal. Ademais, “os escritórios boutiques não se referem a escritórios que possuem poucos clientes ou que são pequenos – essas não são características determinantes para que um escritório de advocacia seja boutique”, mas sim àqueles que possuem estrutura e composição adequada à venda de serviços personalizados, com foco no relacionamento com sua carteira de clientes.”, demonstra o MPC.