No Espírito Santo não é diferente do restante do Brasil. No Tribunal de Justiça, a remuneração bruta mínima de um desembargador é acima de R$ 61 mil. No Tribunal de Contas, a Transparência informa que em outubro último houve conselheiros recebendo bruto R$ 187.353,20, R$ 206.948,05 e até R$ 217.063,75
A farra com dinheiro público, onde ocupantes de cargos públicos chegam a receber mais de R$ 200 mil por mês, com a adoção de penduricalhos que engordam o salário básico, pode estar com seus dias contatos. O deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) apresentou o projeto de lei (PL) Nº 4.413/ 2024, onde propõe impor uma moralização nos gastos com dinheiro público e acabar com os supersalários.
A disparidade nos vencimentos entre o ocupante de um cargo público e um trabalhador que efetivamente trabalha e no final do mês tem uma remuneração mensal de apenas R$ 1.412,00, segundo o parlamentar, ocorre principalmente com políticos, juízes, militares e outras autoridades públicas.
No ES, salário bruto mensal chega a R$ 217 mil no TCES
No Espírito Santo, a Transparência do Tribunal de Contas (TCES) informa que em outubro último foram pagas remunerações mensais totais aos conselheiros de R$ 217.063,75, R$ 206.948,05, R$ 187.353,20, valores esses que equivalem a 12 anos de um assalariado com apenas um mínimo.
Esses supersalários são pagos com dinheiro público, proveniente da arrecadação de impostos, que sobretaxam as famílias mais pobres. O teto é o salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), de R$ 44 mil, mas são feitos artifícios, os chamados “penduricalhos”, onde são elevados abusivamente os salários brutos totais.
Proposta visa eliminar brechas com os “penduricalhos”
De acordo com Boulos, a proposta busca eliminar brechas que atualmente existem para que autoridades recebam salários acima do teto constitucional e cria sanções administrativas e civis contra quem descumprir a regra. “Hoje, apesar da existência de um teto remuneratório equivalente aos rendimentos dos ministros do STF, na prática temos supersalários nas três esferas do setor público a partir das remunerações indenizatórias, que popularmente ficaram conhecidas como ‘penduricalhos’”, diz trecho da justificativa do projeto.
Estudo promovido pelo Centro de Liderança Pública (CLP) mostrou que a adequação efetiva destes salários ao teto de remuneração geraria uma economia de cerca de R$ 5 bilhões ao ano para os cofres públicos.
A PNAD Contínua de 2023 indicava que cerca de apenas 0,3% dos servidores públicos efetivos do país tinham rendimento superior ao teto constitucional. Ou seja, trata-se de enfrentar privilégios de uma pequena minoria, em altos escalões, que implicam um custo elevado aos cofres públicos.
Íntegra do Projeto de Lei Nº 4413 DE 2024
Identifica a fim de consolidar o cumprimento do teto remuneratório no setor público e dá outras providências.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º. Esta Lei estabelece normas para o cumprimento do teto remuneratório previsto no inciso XI do art. 37 da Constituição Federal, aplicável a todos os ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos, bem como aos proventos, pensões ou qualquer outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não.
Art. 2º. Para fins de cumprimento do teto remuneratório previsto no inciso XI do art. 37 da Constituição Federal, considera-se remuneração a soma de todas as parcelas percebidas pelo servidor, incluindo, mas não se limitando a: subsídios, salários, vantagens pessoais, adicionais, gratificações, indenizações e quaisquer outras formas de acréscimo remuneratório, de qualquer natureza.
Art. 3º. Qualquer parcela remuneratória que, isoladamente ou em conjunto com outras, resulte em valor superior ao teto remuneratório estabelecido no inciso XI do art. 37 da Constituição Federal, será considerada nula de pleno direito, sem prejuízo das sanções administrativas e civis cabíveis. A parcela excedente não será paga, e a diferença será descontada do(s) pagamento(s) futuro(s) do servidor, respeitadas as normas aplicáveis.
Art. 4º. São consideradas exceções ao teto remuneratório apenas as parcelas indenizatórias expressamente previstas em lei como reposição de despesas efetivamente realizadas pelo servidor e diretamente relacionadas ao exercício do cargo, e que não constituam acréscimo permanente à remuneração. Essas indenizações devem ser comprovadas documentalmente. Qualquer outra exceção deve ser previamente autorizada por lei específica, observadas as disposições constitucionais e legais pertinentes.
Art. 5º. É vedada a criação de e novas vantagens, adicionais, gratificações ou quaisquer outros mecanismos que visem à elisão ou supressão do teto remuneratório estabelecido na Constituição Federal. A criação de quaisquer novas verbas, adicional ou gratificação somente será possível mediante lei específica que comprove, inequivocamente, a não afronta ao teto constitucional, e que demonstre sua estrita necessidade e adequação às funções do cargo.
Art. 6º. A administração pública direta, autárquica e fundacional em todos os entes federativos deverá manter registros transparentes e atualizados de todas as formas de remuneração pagas aos seus servidores, disponibilizando tais informações ao público por meio eletrônico, observada a legislação pertinente sobre acesso à informação.
Art. 7º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Justificação
O presente Projeto de Lei pretende acabar com os “supersalários” no setor público, decorrente da interpretação e aplicação equivocada do art. 37, XI, da Constituição Federal. A redação proposta elimina quaisquer ambiguidades e brechas que permitam o pagamento de valores acima do teto constitucional, estabelecendo de forma clara e inequívoca a nulidade de qualquer acréscimo remuneratório que o exceda. A inclusão de sanções administrativas e civis visa coibir atos ilegais e garantir o cumprimento da lei.
“Supersalário” é uma remuneração mensal no setor público acima do limite da Constituição. Hoje, apesar da existência de um teto remuneratório equivalente aos rendimentos dos ministros do STF, na prática temos supersalários nas três esferas do setor público a partir das remunerações indenizatórias, que popularmente ficaram conhecidas como “penduricalhos”.
Estudos mostram que a adequação do teto remuneratório aos limites estabelecidos pela Constituição geraria uma economia de cerca de R$5 bilhões aos cofres públicos. A PNAD Contínua de 2023 indicava que cerca de 0,3% dos servidores efetivos do país tinham rendimento superior ao teto. Ou seja, trata-se de enfrentar privilégios de uma pequena minoria, em altos escalões, que implicam um custo elevado aos cofres públicos.
É inaceitável manter esses privilégios, que beneficiam poucas pessoas na elite do Judiciário, Ministério Público, Forças Armadas, Legislativo e Executivo, em detrimento, inclusive, da maioria dos servidores públicos. O próprio Conselho Nacional de Justiça cobrou explicações dos Tribunais de Justiça Estaduais pelo fato de 70% dos juízes e desembargadores terem recebido supersalários entre R$100 mil e R$499.000 ao mês em 2023. Entre os militares foram divulgados casos de oficiais superiores que chegaram a receber R$1 milhão num único mês.
Há no Senado Federal o PL 6726, de 2016, que, ainda que tenha representado um avanço ao caracterizar o que são os “penduricalhos” e regulamentar limites, mantém elevada margem de manobra para que sigam existindo, por exemplo, com a permissão de auxílio-moradia que possa alcançar até R$26.400 por mês (2% do teto por dia).
É fundamental que, no momento em que o governo está debatendo possíveis cortes de gastos, o Congresso Nacional tome a iniciativa de apresentar um caminho que enfrente privilégios gritantes, evitando cortes em áreas sociais. Por todo o exposto, contamos com o apoio dos nobres colegas para a aprovação deste projeto.
Sala das Sessões, em de novembro de 2024.
Guilherme Boulos
Deputado Federal (PSOL-SP)