Em nota a imprensa, diversas organizações não-governamentais alertaram para mais um ataque do governo Bolsonaro contra o meio-ambiente. “O Brasil não precisa de outra Política Nacional sobre Mudança do Clima”. Esta é a conclusão de várias organizações da sociedade civil, que se manifestaram sobre a minuta de um projeto de lei do governo federal relativo à Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC). O PL está sob consulta pública desde 5 de novembro e desvirtua completamente a estrutura original da legislação da política, composta de metas expressas e responsabilidades definidas, além de explicitar quais planos devem ser elaborados para se alcançar objetivos, alegam as ONGs.
“Muito mais importante do que debater outra lei para a PNMC, deve-se assegurar recursos humanos e financeiros, além de prioridade política, para que o país operacionalize os instrumentos da atual PNMC, neles incluídos todos os planos de mitigação e adaptação previstos na legislação em vigor”, diz o texto. Ele traz vários outros argumentos contra a revogação da legislação atual (Lei nº 12.187/2009).
Em contrapartida, as organizações apoiam a atualização da lei da PNMC, nos termos da redação aprovada pelo Senado Federal para o Projeto de Lei nº 6.539/2019 — sobretudo em relação ao compromisso brasileiro de “neutralizar 100% de suas emissões de GEE até 2050. As entidades também destacam a necessidade de inclusão da segurança climática na Constituição Federal, nos termos da Proposta de Emenda à Constituição nº 37/2021. Leia a íntegra da nota aqui.
Declarações
“A Conaq não concorda com a minuta que está em consulta. Aliás, nós criticamos a forma como o governo vem tratando a PNMC. O atual governo mente sobre dados de forma escandalosa, inclusive fez isso na Conferência do Clima. Quando a Amazônia, o Cerrado ou a Caatinga queimam, nosso povo queima junto, porque estamos em todos os biomas, e com muita relevância para a proteção da biodiversidade do país. Os povos que cuidam da floresta precisam ser consultados sobre qualquer mudança que se queira fazer nas políticas que envolvam o clima.” Biko Rodrigues, coordenador nacional de quilombo da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos)
“A proposta do governo federal é para desconstruir a política pública voltada à mudança do clima: na ausência de resultados positivos no controle do desmatamento, propõe eliminar a meta inscrita na lei original para o ano de 2020. Isso pode limpar a barra do governo na Justiça, já que há ações cobrando respostas nesse sentido. E, na toada do fechamento do espaço cívico, o governo também propõe destituir todos os instrumentos institucionais de participação da sociedade e dos entes subnacionais. É uma proposta indecente.” Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa
“A proposta apresentada para consulta pública afasta o Brasil dos compromissos climáticos, é centralizadora e desconsidera o PL 6.539/2019, de iniciativa da Comissão de Meio Ambiente aprovado no Senado Federal. Temos o desafio de alcançar o desmatamento zero para Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica e promover a restauração de 15 milhões de hectares no bioma. Para que isso ocorra, não podemos aceitar o desmantelamento da PNMC — é mais um retrocesso.” Malu Ribeiro, diretora de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica
“Era só o que faltava neste governo: revogar a lei de Política Nacional sobre Mudança do Clima em menos de um mês após a COP do Clima. Nem quem acredita em Papai Noel confia que esse governo quer, de verdade, fazer algo de bom para o clima e o meio ambiente no Brasil e no planeta. O que ele quer é mais boiada. Infelizmente. Alguém aí discorda?” André Lima, consultor sênior de política e direito socioambiental do IDS (Instituto Democracia e Sustentabilidade)
“A proposta do governo esvazia a política de combate às mudanças climáticas, revoga os principais instrumentos para a sua efetividade e representa grave retrocesso que inviabilizará o cumprimento do Acordo de Paris pelo Brasil. As consequências são nefastas não apenas ao meio ambiente, como ao bem-estar da população e à própria economia brasileira. Em especial, perante o mercado internacional, que atualmente exige compromissos e resultados concretos sobre a política climática nacional. Seu destino deve ser a lata do lixo.” Maurício Guetta, consultor jurídico do ISA (Instituto Socioambiental)
“O Brasil voltou às taxas de desmatamento de uma década atrás. E, agora, o governo abre consulta para revogar e rediscutir uma lei de 12 anos. Lei que deveria estar sendo implementada, ainda que com espaço para melhorias em prol do combate à crise climática. Não resta dúvida de que este é um governo do atraso.” Mariana Mota, Coordenadora de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil
“O governo quer trocar a Lei da PNMC por um texto claramente mais frágil, que enfraquece a operacionalização da política nacional. Quer também direcionar a pressão para o debate de uma nova lei, de forma a se livrar da demanda pela implementação, ao desviar o foco para o Legislativo. É o governo Bolsonaro de sempre, com seu projeto de paralisar as ações afetas à política ambiental; de não fazer nada além de destruir. A única solução para acabar com esse quadro de desmonte é trocar o presidente da República.” Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima
“Há um imenso descompasso no governo federal: ele fala em antecipação de metas para zerar o desmatamento ilegal, enquanto propõe a revogação da Política Nacional sobre Mudança do Clima e não coloca em prática ações claras e objetivas para a descarbonização da economia. Tal qual é um contrassenso insistir em votar o fim do licenciamento ambiental e favorecer a grilagem de terras públicas. Conservar florestas em pé é a medida mais eficaz para o combate às mudanças climáticas. Quem faz isso com eficiência são as populações tradicionais, que estão sofrendo nas mãos desse governo, com os maiores retrocessos nas políticas socioambientais já vistos no país.” Guilherme Eidt, assessor em políticas públicas do ISPN (Instituto Sociedade, População e Natureza).
“A atual proposta de revogar a Política Nacional sobre Mudança do Clima vai na contramão de uma abordagem de direitos humanos. Precisamos fortalecer a legislação que já existe e não retrocedermos com uma nova lei, que é menos protetiva em termos climáticos e socioambientais.” Julia Mello Neiva, coordenadora do programa de Defesa dos Direitos Socioambientais da Conectas Direitos Humanos.