Em Vitória (ES), os supermercados estão cobrando por um pacote com meio quilo de café torrado e moído entre R$ 25,00 e R$ 33,00. No Espírito Santo, segundo a Conab, a produção atingiu 9,8 milhões de sacas de conilon, com redução de 3,1% em relação ao volume obtido em 2023
De acordo com a Companhia Nacional do Abastecimento (Conab), as condições climáticas se mostraram desafiadoras para o setor cafeeiro nos últimos quatro anos – geadas, restrição hídrica e altas temperaturas, ocasionadas pelos fenômenos climáticos. O clima adverso registrado no ano passado e no final de 2023 trouxe impacto para importantes regiões produtoras de café, influenciando negativamente na produtividade média das lavouras.
Com isso, assinala a Conab em nota à imprensa, a safra do grão se encerra estimada em 54,2 milhões de sacas de 60kg, como mostra o 4º e último levantamento da cultura para o ciclo de 2024 divulgado Companhia. O resultado é 1,6% abaixo do volume produzido na safra de 2023. Quando comparado com 2022, último ano de alta de bienalidade, observa-se um crescimento de 3,3 milhões de sacas.
A área total destinada à cafeicultura no país, em 2024, totalizou 2,23 milhões de hectares, sendo 1,88 milhão de hectares com lavouras em produção e 353,6 mil hectares em formação. A produtividade média nacional de café, finalizada em 28,8 scs/ha, é 1,9% abaixo da obtida na safra de 2023.
Maior estado produtor de café no país, responsável por 52% da produção, Minas Gerais registrou uma colheita de 28,1 milhões de sacas, queda de 3,1% em comparação ao total colhido na safra anterior. Essa redução se deve às estiagens acompanhadas por altas temperaturas durante o ciclo das lavouras e, agravadas, a partir de abril, quando as chuvas praticamente cessaram em todo o estado, com registros de precipitações pontuais e de baixos volumes.
Arábica e conilon
Entre as espécies, apesar deste ano de ciclo de bienalidade positiva, o desempenho médio do arábica apresenta pequeno incremento de 0,2% devido às adversidades climáticas durante o desenvolvimento das lavouras observadas, principalmente, em Minas Gerais. Com isso, a produção de arábica totalizou 39,6 milhões de sacas de café beneficiado, aumento de 1,8% em relação à safra passada.
Já para o conilon, a Conab verificou redução de 5,9% na produtividade média, chegando a 39,2 sacas/ha, o que resulta em uma safra de 14,6 milhões de sacas. Apenas no Espírito Santo, a produção atingiu 9,8 milhões de sacas, redução de 3,1% em relação ao volume obtido em 2023. Apesar do ciclo no estado capixaba ter apresentado um potencial produtivo muito bom no seu início, as condições climáticas entre outubro e dezembro de 2023, com episódios de ondas de calor intensas, proporcionaram uma quebra deste potencial na safra de 2024. O levantamento da safra cafeeira no Espírito Santo é realizado em conjunto com o Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural – Incaper. As possíveis diferenças com outras instituições são sempre motivo de análise pela Conab.
Outro importante produtor de conilon, Rondônia registra uma safra de pouco mais de 2 milhões de sacas de café, 31,2% abaixo do resultado obtido na safra anterior. Assim como no Espírito Santo, o clima adverso registrado no final de 2023 também impactou no volume colhido no ano passado, além do ajuste de área devido ao mapeamento.
Mercado
O Brasil exportou 50,5 milhões de sacas de 60 quilos de café em 2024, número que representa um novo recorde e alta de 28,8% na comparação com o ano anterior, segundo dados consolidados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Essa exportação gerou uma receita de US$ 12,3 bilhões em 2024, o maior valor já registrado no Brasil, representando uma alta de 52,6% na comparação com 2023.
A quantidade exportada pode ser composta de estoques de produção de diferentes anos-safra. Nesse sentido, entende-se que o quadro de suprimento não pode levar em consideração apenas o volume produzido na última safra.
Entre os motivos que contribuíram para o crescimento nas exportações de café do país em 2024 estão a valorização do produto no mercado internacional e a valorização do dólar. O cenário de oferta e demanda global ajustado influenciou a alta dos preços do produto no ano passado, mesmo com a recuperação da produção em alguns países. Outro fator altista para os preços foi a ocorrência de novas adversidades climáticas em importantes países produtores, que limita a recuperação da oferta futura.
Incaper sugere produzir café em área sombreada
Cultivar café conilon em sistema agroflorestal pode favorecer a produção de cafés especiais, além de tornar a cultura mais resiliente às mudanças climáticas. Essa é uma das conclusões de um estudo que o Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) realizou, por 25 anos, para avaliar a influência do sombreamento por seringueiras na produtividade e na qualidade sensorial de 31 clones da espécie Coffea canephora.
Conduzido na Fazenda Experimental do Incaper em Sooretama, município do norte do Espírito Santo, o experimento avaliou os clones sob três condições de sombreamento: pleno sol, sombra pela manhã e sombra à tarde. Os resultados mostraram que os clones cultivados com sombra à tarde apresentaram uma menor produtividade por planta, mas produziram grãos mais pesados e de melhor qualidade de bebida. As plantas mais produtivas, por sua vez, prosperaram nas demais condições.
Por isso, em artigo publicado recentemente na revista Coffee Science, um dos periódicos científicos sobre cafeicultura mais importantes do País, os pesquisadores responsáveis pelo estudo destacam que o sombreamento é uma estratégia viável para melhorar o desempenho de clones específicos de C. canephora direcionados ao mercado de cafés especiais.
Um dos trechos do texto aponta que “o sombreamento ajuda a minimizar os efeitos negativos da radiação solar excessiva e do calor no desenvolvimento do café, ao mesmo tempo em que melhora a qualidade da bebida”. Em análises sensoriais feitas com base no protocolo do Coffee Quality Institute (CQI), alguns dos genótipos avaliados atingiram notas acima de 80 pontos, apresentando maior doçura, acidez equilibrada e menor adstringência, atributos desejados no mercado de cafés especiais.
Clones
Os clones foram avaliados em condições de sequeiro, ou seja, sem a utilização de um sistema artificial de irrigação. “Isso nos forneceu muitas informações relevantes com relação à sensibilidade e à tolerância dos materiais testados ao déficit hídrico”, pontua o pesquisador do Incaper José Altino Machado Filho.
Os resultados reforçam o entendimento de que os sistemas agroflorestais são uma alternativa promissora para o cultivo do cafeeiro Coffea canephora (conilon e robusta), frente aos desafios impostos pelas mudanças climáticas. No Brasil, a espécie é predominantemente cultivada em monocultura, especialmente em áreas com plena exposição ao sol. No entanto, condições climáticas adversas, como secas prolongadas e aumento das temperaturas, estão afetando cada vez mais as principais regiões produtoras de café.
“Mesmo com interferências no aspecto de produtividade, foi observada a maior resiliência do cultivo em sistema agroflorestal frente às intempéries climáticas que ocorreram ao longo desses 25 anos de avaliações”, salienta José Altino Machado Filho. Ainda segundo segundo o pesquisador, outra conclusão importante dos estudos é a necessidade de estratégias específicas para cada clone e ambiente de cultivo.
Pesquisa
“A pesquisa apresentou, de forma inegável, a variabilidade de comportamento entre materiais e a riqueza de possibilidades de adaptabilidade em diferentes condições. Alguns materiais foram superiores em condições de sombreamento, uns foram indiferentes e outros prejudicados em produtividade. Isso demonstra a responsabilidade e o cuidado que se deve ter na transmissão de conhecimentos e informações sobre a cultura do conilon. Todo olhar deve ser profundo. Generalizações devem ser evitadas”, ressalta Machado Filho.
Os parâmetros analisados na pesquisa incluíram peso de mil sementes, quantidade de grãos verdes beneficiados, produtividade, número de frutos maduros necessários para produzir uma saca de 60 quilos de grãos verdes e análise sensorial. Os estudos foram financiados com o apoio do Consórcio Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento do Café.
O texto também é assinado por Poliana Rangel Costa (Incaper), Lúcio de Oliveira Arantes (Incaper), Weverton Pereira Rodrigues (Universidade Estadual da Região Tocantins do Maranhão), Jeane Crasque (Universidade Federal do Espírito Santo) e Sara Dousseau-Arantes (Incaper/Ufes).
Serviço:
O artigo completo citado pelo Incaper pode ser baixado gratuitamente no site da revista Coffee Science (clique aqui para acessar).