A prática do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) de entregar as riquezas minerais sob os territórios dos índios teve a suspensão de dois atos administrativos da Fundação Nacional do Índio (Funai), controlada pelo atual governo, suspensos por decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF). Os atos do governo Bolsonaro desautorizam qualquer proteção territorial nas terras indígenas não homologadas, para favorecer à exploração do garimpo ilegal e das madeireiras que estão destruindo a Amazônia.
Segundo o ministro, a suspensão da proteção territorial abre caminho para que terceiros passem a transitar nas terras indígenas, oferecendo risco à saúde dessas comunidades, pelo contágio pela Covid-19 ou por outras enfermidades, sobretudo doenças infectocontagiosas – que tornam a saúde desses povos mais vulnerável. De acordo com a decisão, a Funai deve implementar ações de proteção independentemente de as áreas indígenas estarem homologadas.
Barroso destacou que a insistência no descumprimento da decisão implicará o encaminhamento das peças ao Ministério Público para a apuração de crime de desobediência (artigo 330 do Código Penal). O pedido em questão foi formulado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), incidentalmente, nos autos na Arguição de Descumprimento de Preceito Funamental (ADPF 709), em que o STF determinou a formulação de plano de enfrentamento à covid-19, com prestação de serviços de saúde e criação de barreiras sanitárias. Leia a íntegra da decisão do ministro Barroso, em arquivo PDF:
ADPF7091586decisao_monocraticaGoverno Bolsonaro contraria normas constitucionais
De acordo com a Apib, os atos administrativos (um parecer e um ofício circular) contrariam normas constitucionais e infraconstitucionais de proteção aos direitos dos indígenas e a jurisprudência do STF. Para Barroso, os atos da Funai representam uma tentativa reiterada de esvaziamento de medidas de proteção determinadas pelo Supremo. “Ao afastar a proteção territorial em terras não homologadas, a Funai sinaliza a invasores que a União se absterá de combater atuações irregulares em tais áreas, o que pode constituir um convite à invasão de áreas que são sabidamente cobiçadas por grileiros e madeireiros, bem como à prática de ilícitos de toda ordem”, afirmou.
O relator observou que, nos atos questionados pela Apib, é possível verificar nova tentativa da Funai de se omitir na prestação de serviços aos povos indígenas de terras não homologadas, utilizando a não conclusão da homologação para evitar o controle territorial que deve ser exercido sobre essas áreas. A presença de terceiros e de invasores e a desproteção territorial das terras pode, ainda, comprometer a implementação do Plano Geral de Enfrentamento à Covid-19 para Povos Indígenas, aprovado pelo STF, e outros instrumentos que envolvem a contenção e retirada de pessoas como medida de proteção sanitária.
Outro ponto considerado pelo ministro é que, além do impacto sobre povos situados em terras não homologadas, os atos podem afetar indígenas isolados e de recente contato, ainda mais vulneráveis epidemiologicamente. Ele lembrou que, em relação aos povos em isolamento e de contato recente, a cautelar homologada pelo Plenário na ADPF 709 determinou, inclusive, a criação de barreiras sanitárias que impeçam a entrada e a saída de terceiros do território.