O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a remessa, para a Justiça Federal no Pará, de notícia-crime apresentada pelo grupo Prerrogativas contra a ex-ministra Damares Alves, por possível prática de prevaricação e crime eleitoral
Após analisar a Petição (PET) 10628, apresentada pelos coordenadores do grupo Prerrogativas, que denunciou a ex-ministra de Bolsonaro para a pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Regina Alves, por graves denúncias sem provas, em seu relato o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, remeteu o processo para a Justiça Federal do Pará promover uma investigação criminal contra a agora senadora eleita pelo Republicanos do Distrito Federal (DF). No último domingo (9), diante de crianças, ela falou, sem provas, dentro de uma igreja evangélica de que “soube” de que crianças na Ilha de Marajó (PA) estavam sendo sequestradas, torturadas e sendo alvo de abusos sexuais.
Segundo a ex-ministra, o atual presidente Jair Bolsonaro (PL) teria tomado conhecimento do assunto e dito que “combateria essa prática”. As denúncias de Damares, que logo no início do atual governo chegou a declarar, também dentro de uma igreja evangélica, que havia conversado com Jesus Cristo trepado em um pé de goiabeira, foram consideradas como sendo mentirosas e irreais. A afirmação foi de várias autoridades no assunto e entre essas está a Irmã Marie Henriqueta Ferreira Cavalcante, uma referência no combate à violência sexual contra crianças e adolescentes na Ilha do Marajó. Leia a íntegra da decisão do ministro Lewandowski, em PDF, clicando neste link.
As denúncias sem provas causaram indignação em Marajó
“A fala dela causou grande indignação em todos nós que lutamos contra a violência sexual, sobretudo na população marajoara, que está se manifestando de maneira muito forte e revoltada. É uma fala totalmente desconectada com a da defesa dos direitos humanos. Ela mais uma vez se equivoca de maneira irresponsável. Isso causa pra nós… não é nem surpresa, porque ela sempre se reporta dessa forma sobre nossas crianças e adolescentes do Marajó, com esse estereótipo. Você lembra muito bem da última vez que ela disse que as meninas do Marajó são estupradas porque não usam calcinha”, disse a Irmã Marie Henriqueta em entrevista a Agencia Pública.
E complementou: ”Aí ela apresenta como solução instalar uma fábrica de calcinhas! O que ela nunca cumpriu, diga-se, porque viu a rejeição, porque a imprensa séria teve coragem de denunciar – e você (Agência Pública) fez uma matéria importantíssima daquela vez sobre isso e viu que deu repercussão. O que ela fez foi distribuir parcas cestas básicas. Então essa fala de agora não é de se espantar quando vem de uma representante do atual governo, que trata pautas tão complexas com uma profunda demagogia, sem levar em consideração dados e sem disponibilizar serviços públicos essenciais”.
E finalizou: “Se ela teoricamente sabia desses crimes, por que não fez a denúncia às esferas competentes? A solução pra esse grave problema da violência sexual exige um esforço conjunto de políticas públicas e o respeito intransigente aos direitos das nossas meninas e meninos que são afetados por essa violência. Que os ponha a salvo de qualquer comportamento cruel e degradante”.
Prevaricação
Segundo informou o STF, a notícia-crime diz que o vídeo desse discurso sem provas de Damares Alves tem sido divulgado como material de campanha eleitoral nas redes sociais do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), atribuindo à história uma relação com “resquícios de PT pelo Brasil”. Os advogados argumentam que, se Damares e o presidente da República tiveram conhecimento desse fato e só agora o trouxeram a público, sem terem tomado qualquer providência, é necessário apurar a prática do crime de prevaricação.
O grupo Prerrogativas pediu que Damares e Bolsonaro expliquem as providências tomadas e, caso as histórias sejam “mentiras destinadas a alimentar a rede bolsonarista de fake news”, que sejam tomadas medidas urgentes para evitar a propagação do vídeo “com o reprovável propósito de tumultuar o processo eleitoral”.
Foro
Ao analisar o pedido, Lewandowski observou que a ex-ministra não tem, no momento, prerrogativa de foro por função, o que torna inviável a instauração de investigação no âmbito do Supremo. Ele destacou que a competência do STF ocorre apenas nos crimes cometidos durante o exercício do cargo ou relacionados às funções desempenhadas. No caso, o fato de Damares ter sido eleita senadora pelo Distrito Federal não altera a situação, pois a prerrogativa de foro só começará após a expedição do diploma (artigo 53, parágrafo 1º, da Constituição Federal).
Em relação ao presidente, Lewandowski afirmou que a simples menção a seu nome no discurso, sem outro elemento concreto da prática dos crimes apontados na petição, não é suficiente para que se instaure procedimento investigativo.
Ao remeter o processo para a primeira instância, o ministro frisou que caberá ao juiz federal competente ouvir os órgãos de investigação, examinar os supostos eventos noticiados e os pedidos formulados na representação.