A área marinha e os ecossistemas de manguezal da Área de Proteção Ambiental Costa das Algas e do Refúgio de Vida Silvestre de Santa Cruz, localizados no município de Aracruz-ES, estão ameaçados pelas mudanças climáticas. É o que constata a equipe de pesquisadores do Programa de Pesquisa Ecológica de Longa Duração (PELD) Habitats Costeiros do Espírito Santo, coordenado pelo professor do Departamento de Oceanografia da Ufes Ângelo Bernardino. Os pesquisadores identificaram um aumento médio de um grau celsius nas temperaturas do mar da região nas últimas décadas. Esse aquecimento diminui a abundância de populações de espécies marinhas costeiras, além de diminuir o alimento disponível para essas comunidades.
O monitoramento identificou uma redução de aproximadamente 40% na extensão de espécies recifais entre 2018 e 2020. Tendo em vista que esses recifes fornecem abrigo e alimento para animais marinhos, o estudo sugere que a diminuição dos recifes pode afetar diretamente os estoques pesqueiros na zona costeira da Costa das Algas.
O PELD Espírito Santo existe desde 2016, mas as pesquisas na região, que abrange 25 quilômetros de litoral e 115 mil hectares de áreas marinhas, começaram em 2014. “A gente tem trabalhado para investigar efeitos de mudanças do clima ou eventos que se correlacionam com o clima, como mudanças de temperatura, de padrões de vento, de correntes oceânicas, e como esses efeitos têm influência sobre a biodiversidade marinha na Costa das Algas. É um dos poucos sítios costeiros do PELD no Brasil, e temos cinco anos de coleta de dados quase contínua. Isso torna o sítio PELD Espírito Santo um dos programas que detém uma das maiores séries de dados oceanográficos e biológicos no Brasil para sistemas costeiros, sendo que muitos desses dados já se encontram disponíveis abertamente em plataformas internacionais”, explica Bernardino.
Impacto nas comunidades
Segundo o professor, além do estudo científico, os pesquisadores têm um olhar voltado para as comunidades que habitam a região e utilizam os recursos naturais para sua sobrevivência. “Muitos pescadores, vilas indígenas e grupos tradicionais usam esses recursos constantemente. A adaptação climática das comunidades costeiras a um oceano mais quente, e com um nível do mar mais alto é uma grande preocupação na zona costeira. Esse tema é ainda mais relevante para o Estado, e o poder público precisa agir e se adaptar a esses efeitos. A ideia do projeto é tentar entender como um oceano e um clima mais quentes impactam a biodiversidade daquela área e como a relação do homem com a natureza vai mudar ao longo do tempo”, explica.
As mudanças climáticas também provocam eventos meteorológicos extremos. De acordo com dados do PELD/ES, em 2016, cerca de 500 hectares (equivalentes a 500 campos de futebol) de manguezais morreram em decorrência de anos extremamente secos, com forte influência de um El Niño, e de forte chuva de granizo ocorrida na região. Esse foi um dos únicos eventos dessa magnitude registrados no Brasil, que detém a segunda maior cobertura de florestas de manguezais do mundo.
Mortandade dos mangues
“A extensa mortandade de mangues nos preocupa, pois sabemos que essas florestas têm importante papel na regulação do clima e na provisão de alimento e outros serviços ecossistêmicos para populações costeiras. Se o Espírito Santo experimentar com maior frequência anos quentes e secos, como os vividos entre 2014 e 2015, é possível que tenhamos grande perda de ecossistemas importantes, como mangues e recifes costeiros, e, consequentemente, haverá perda de benefícios naturais que esses ecossistemas nos trazem”, diz Bernardino.
Para enfrentar essas questões, os pesquisadores do PELD Espírito Santo defendem a ordenação dos usos de áreas de proteção e de ecossistemas costeiros, permitindo, assim, a conservação da biodiversidade marinha a partir de um manejo sustentável dos recursos naturais.