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Cariacica cobra hospital geral e, em troca, prefeito dá praia artificial em água contaminada

Cariacica, município que de acordo com o IBGE tem um terço de sua população abaixo da linha da miséria, com renda familiar mensal de meio salário mínimo e com 83,9% da população desempregada ou subempregada, quer um hospital geral, que já foi prometido por políticos em campanha e não cumprido. A praia não poderá ser usada porque a Baía de Vitória está contaminada de coliformes fecais, vindos do interior pelo Rio Santa Maria da Vitória, além de estar poluida com agrotóxicos usados nas lavouras do interior

A praia artificial será construída à esquerda da Baía de Vitória, mas ninguém pode entrar na água poluída | Foto: Google

A contaminação da água da Baía de Vitória por esgoto e por efluentes de agricultura e pecuária é um a fato incontestável, tanto que a Prefeitura de Cariacica, para justificar a destinação de R$ 33,88 milhões para a construção de uma praia artificial, na contaminada Baia de Vitória, já avisou que ninguém poderá entrar no mar. Uma praia de miragem, só para olhar. O gasto inútil de R$ 33,88 ocorre em um dos mais miseráveis municípios, segundo o IBGE. Nos dados mais recentes, consta que 33% da população de Cariacica está abaixo da linha da miséria e com rendimento familiar mensal de até meio salário mínimo (R$ 606,00).

O gasto inexplicável de R$ 33,88 milhões em uma praia onde dificilmente a Prefeitura de Cariacica (PMC) vai controlar quem vai entrar na água contaminada por coliformes fecais e resíduos de agrotóxicos que descem da área rural e de fezes de galinhas, que descem pelo Rio Santa Maria da Vitória e desemboca pouco acima da região de Porto de Santana. Os estudos nesse sentido existem e estão logo abaixo em uma dissertação apresentada pela especialista Susanne Mariani Loss, para Pós-Graduação em Engenharia Ambiental da Ufes, apresentada em 2012.

O gasto, considerado pela população como desnecessário, poderia ter sido usado na construção do hospital. que Cariacica não tem

Gasto de R$ 33,88 milhões

Há estudos de melhoria da água da Baía de Vitória, previstos para 2030, mas que vai depender da boa vontade dos futuros governadores, que ainda serão eleitos. Em futuras eleições O atual governador, Renato Casagrande (PSB) participou de uma solenidade para a criação da praia artificial na poluída Baia de Vitória, ao lado do prefeito daquela cidade, Euclério de Azevedo Sampaio Junior (DEM). Os dois, Casagrande e Sampaio assinaram a ordem de serviço para o início das obras de construção da Nova Orla de Cariacica, em Porto de Santana, com custo de exatos R$ 33.884.487,00.

A obra será executada pelo Consorcio Porto de Santana, com CNPJ 44.823.035/0001-04, sediada na RuaJuvenal Caetano, 115, Bairro: Consolação, em Vitória (ES). O consórcio é uma associação entre Cbs – Construtora Bahiana de Saneamento Ltda- Sociedade Consorciada; Tubonews Construção e Montagem LTDA – Sociedade Consorciada e Cinco Estrelas Construtora e Incorporadora Eireli – Sociedade Consorciada.O administrador é Nilton Amorim Damasceno.

Segundo os dados mais atuais do IBGE, um terço da população de Cariacica está abaixo da linha de miséria | Fonte: IBGE

População reclama de falta de hospital público

Enquanto moradores de Cariacica pedem para a concretização de promessas eleitoreiras, não cumpridas, de construção de um Hospital Geral de Cariacica, durante a solenidade da ordem de serviço da praia que ninguém poderá entrar na água, o governador disse: “Essa obra é a realização de um desejo da população cariaciquense. Esse investimento vai mudar a história de Cariacica. A parceria do governo do Estado com a Prefeitura de Cariacica eleva a autoestima da população”, disse o governador do PSB, que está de olho nas eleições deste ano, onde pretende renovar o mandato por mais quatro anos. Na solenidade haviam pastores evangélicos que já se lançaram pré-candidatos a deputado federal, por partidos da base de apoio do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Segundo a Prefeitura, a curiosa praia onde não é recomendado que se entre na água, vai ter quiosques/restaurantes e banheiros modernos e amplos, ambientalmente sustentáveis, com “alimentação por energia solar” (sic), Iluminação pública com lâmpadas de LED com placas solares e estacionamentos, ciclovia, calçadão, deques, espaços para a prática de exercícios físicos e o cumprimento da exigência de normas federais para a litoral que faz divisa com água do mar, como preservação da riqueza vegetal do manguezal, com construção conectada com a paisagem. Os deques contornarão a vegetação.

Estudo que comprova alta indidência de coliformes fecais na água da Baía de Vitória, onde ficará a praia artificial de Cariacica

Coliformes fecais e resíduos de agrotóxicos

A Prefeitura de Cariacica já avisou, para se evitar futuras querelas judiciais, que os usuários da praia artificial não entrem na água. Assim, a praia fica na imaginação de cada um. Cada usuário põe na cabeça que está numa praia de verdade. Não é recomendado porque há inúmeros estudos científicos que analisaram a água e comprovaram que é altamente poluído e o cidadão não deve nem se aproximar de um local contaminado como esse.

É o caso da dissertação da então especialista Susanne Mariani Loss, que fez o estudo para a Ilha das Caieiras, que fica exatamente no lado oposto da mesma água da Baía de Vitória. No Resumo, na página IX, ela diz: “Os resultados das análises microbiológicas da água nos pontos estudados (P1, P2, P3 e P4) demonstraram a presença de coliformes termotolerantes (coliformes fecais), com médias geométricas de 1,66×102,1,31×102, 2,29×103 e 3,13×102 UFC / 100 mL de água, respectivamente. Para enterococos, as médias encontradas foram 6,30×101 UFC / 100 mL em P1, 5,56×101 UFC / 100 mL em P2, 1,89×103 UFC / 100 mL em P3 e 1,62×103 UFC / 100 mL em P4”.

“Os vírus entéricos foram detectados nos quatro pontos de monitoramento pelas duas técnicas moleculares utilizadas, com valores máximos de 2,00×103, 5,24×104 e 1,50×104 CG / 100 mL para AdV, RV e NoV, respectivamente, quantificados por qPCR. A frequências de detecção de vírus nas amostras de água do estuário variou de 21 – 27% para AdV, 42 – 53% para RV e 10 – 42% para NoV GII. Neste estudo foi possível verificar que o estuário da Ilha das Caieiras apresenta-se contaminado devido, possivelmente, aos lançamentos de esgoto in natura e/ou de lixiviados de áreas rurais. A ação antropogênica sobre este manguezal é evidente e preocupante, pois se reflete na qualidade ambiental deste meio, na saúde da população e na economia da região”, prossegue.

“Este sistema estuarino é formado pelo deságue de vários rios, sendo o rio Santa Maria da Vitória (Rio Santa Maria) de médio porte, e os rios Formate-Marinho, Bubu, Aribiri, Córrego Piranema e o Canal da Costa de pequeno porte. A vazão média anual do rio Santa Maria, principal contribuinte de água doce para a Baía de Vitória, é de 15,7 m3/s, com médias mensais variando entre 8,1 e 25,6 m3/s (SANTOS, 1994). Contudo, o rio Santa Maria está em situação de degradação, recebendo grande aporte de nutrientes de esgotos domésticos e industriais e efluentes das atividades agropecuária do seu entorno.

A especialista disse que as análises físico-químicas e microbiológicas da água foram realizadas no LABSAN, da UFES, com exceção da quantificação do material viral nas amostras, que foi realizada na Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), localizada no Rio de Janeiro/RJ. As amostras foram transportadas em gelo seco, dentro de caixa térmica, para que permanecessem resfriadas e conservadas até a realização das análises em laboratório. Leia a seguir a íntegra da tese de Pós-Graduação de Susanne Mariani Loss, em arquivo PDF:

Susanne-Mariani-Loss

Presença de coliformes termotolerantes (fecais)

As variações de densidade de Coliformes Termotolerantes na água, ao longo dos 19 meses de monitoramento, podem ser observadas na figura 15. Os quatro pontos analisados apresentaram contaminação por resíduo fecal, possivelmente devido ao lançamento de esgoto in natura nos corpos hídricos da região. Como esperado, P3 apresentou maior densidade de bactérias coliformes termotolerantes, visto que este ponto está mais próximo à zona antrópica e o bairro Ilha das Caieiras ainda não possui completa cobertura de coleta e tratamento de esgoto, sendo lançado na região, então, o esgoto de residências e restaurantes sem tratamento prévio (CESAN.

Na maior parte do ano, P3 apresentou mais de 1.000 UFC por 100 mL de água (74% das amostras), ultrapassando o limite de balneabilidade preconizado pela Resolução CONAM  274/2000. Neste ponto foi observada a presença de óleos e graxas na água, devido às embarcações presentes no cais, e de despejos de esgoto sem prévio tratamento. Na última amostra de água do Ponto 3 analisada neste estudo foram detectados 2,4 x 104 UFC de Coliformes Termotolerantes (que são os coliformes fecais) e Escherichia coli.

Os coliformes termotolerantes pertencem a um subgrupo de microrganismos e são exclusivamente do trato intestinal. A presença de coliformes termotolerantes determina a origem fecal da contaminação, indicando risco da presença de outros microrganismos patogênicos. A contagem dos coliformes termotolerantes indica a quantidade dos microrganismos oriundos de excretas humanos. A intermitência na distribuição de água torna os reservatórios de armazenamento ambientes propícios a contaminação microbiológica, além da formação de biofilmes, promove pressão negativa colaborando para proliferação de microrganismos e manutenção da suciedade.

A presença contínua de uma população microbiana na água potável que passa pelo sistema de distribuição pode acabar resultando no surgimento de camadas de biofilme. Outras formas freqüentes de contaminação da água dos reservatórios podem estar relacionadas com infiltração, vazamentos na rede de água, bem como por microrganismos suspensos na atmosfera, que afetam diretamente a água destinada ao consumo humano.

Os guias da Organização Mundial da Saúde apontam para a importância do monitoramento e controle da qualidade da água. A poluição das águas pode indicar a sua contaminação, ocasionando doenças chamadas de veiculação hídrica, sendo as mais comuns, a febre tifóide, disenterias, cólera, hepatites infecciosas, leptospirose, entre outras e, ou doenças de origem hídrica como a escabiose, e outros (VON SPERLING, 1996, p: 243). A previsão é da praia artificial está preparada para ser inaugurada antes das próximas eleições municipais, em 2024. No contrato prevê a entrega em 540 dias ou um ano e seis meses.